Em democracia representativa, os partidos políticos servem para gerar respostas aos desafios que a comunidade enfrenta, para apresentar alternativas na base das quais o eleitorado pode escolher de um leque suficiente de opções diferentes. Todos os partidos têm de pensar a sua actuação à luz dessa sua responsabilidade e missão.
Vem isto a propósito de um congresso do PS que está aí à porta. Até há pouco tempo, um espectador desprevenido, como eu, pensaria que tal congresso não passaria de mais uma cerimónia para marcar calendário. Vistas as evoluções recentes, e as previsões meteorológicas, não pode ser assim. A presente situação nacional coloca a esse partido – e ao seu congresso – acrescidas responsabilidade. O congresso do PS tem de poder debater e escolher entre as principais opções que se abrem a esse partido quanto ao papel que pode jogar no actual momento e no futuro próximo.
Quem defende que o PS deve coligar-se com o PSD para salvar o país, deve apresentar-se ao congresso a defender isso. Os que acham que é tempo de o PS se entender com a esquerda da esquerda para mudar o rumo à governação, noutra atitude face "aos mercados" e face "a Bruxelas", devem apresentar-se ao congresso a explicar bem o que isso quer dizer. Os que entendem que o PS deve continuar contra tudo e contra todos, continuando a bater na tecla de um governo minoritário (o "PS sozinho"), têm de ir ao congresso levar a votos essa opção. Além disso, no caso de Sócrates chegar a demitir-se de PM, chegou o tempo de o PS discutir se quer continuar a tê-lo como líder ou não.
Em suma: o congresso do PS tem de decidir se quer beber o cálice deste ciclo até ao fim, com este rumo e este SG - ou se quer mudar de vida e entrar numa nova fase. Qualquer uma dessas opções é respeitável. O que não é respeitável é que um partido democrático não arranje maneira de discutir o seu futuro, em toda a liberdade.
Um grande partido nacional como o PS não pode, chegado a este ponto, gastar um congresso a discutir questões interessantes mas irrelevantes para o fulcro do que aí vem. Nem pode fazer uma eleição para secretário-geral em que os oponentes a Sócrates sejam apenas uns ilustres militantes que se apresentaram como candidatos a líderes apenas por truque regulamentar destinado a permitir-lhes apresentar uma moção de orientação política global (circunstância que já aqui critiquei anteriormente)... enquanto os "verdadeiros candidatos" se arrastam pelos corredores a conspirar baixinho. Isso seria, face ao país, pouco sério. E poderia ser, para o próprio PS, uma espécie de suicídio ritual (embora, em política, quase todos os suicídios sejam temporários).
Se é preciso mudar à última hora os regulamentos, mudem-nos. Não caiam é na loucura de apresentar ao país um congresso que pareça um jogo de sombras.