16.2.23

Como perder uma eleição?

11:24


Li o livro de Luís Paixão Martins, "Como perder uma eleição ". Gostei de ler: tenho uma certa tendência para gostar de livros que me recordam de coisas que pertencem à história que vivi e que, no entanto, se foram apagando nas brumas do tempo.
 
O livro de LPM começa com a pretensão de ser obra de um prático, mas, na verdade, é um livro de teoria da comunicação na política - com casos práticos. Ainda bem. Mas há um episódio em que eu teria apreciado muito que LPM fizesse mais teoria (uma teoria adequada deve, no mínimo, explicar os dados empíricos, embora deva fazer mais: fazer predições acertadas), em vez de se ficar por uma breve descrição.
 
É o episódio de o conselheiro ter levado o líder do PS a verbalizar a hipótese de uma maioria incompleta ser completada com os deputados do PAN. O que eu gostaria de ver teorizado seriam as respostas a perguntas como estas: como é que alguém, que quer evitar qualquer tipo de discussão propriamente dita numa campanha, pode aconselhar o PS sem conhecer a relação complexa que a base eleitoral do PS tem com as propostas do PAN? Como é que se pode levar o líder do PS, que conhece tão bem o seu partido, a fazer um movimento contra tudo aquilo que sabe tão bem?
 
É um livro interessante, porque resume uma cultura política. Provavelmente, a cultura política dominante nos nossos dias. Mas, convenhamos, algo que não é uma inevitabilidade. Apenas uma escolha condicionada. Valeria a pena pensar sobre as razões pelas quais esta cultura política é hoje dominante; e pensar porque é que ela é apresentada como uma inevitabilidade. E pensar se o trabalho dos políticos é "seguir o povo" ou, antes, "abrir outras possibilidades" à cidadania.
 
Porfírio Silva, 16 de Fevereiro de 2023
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16.1.23

Obrigado, escola pública

12:25
 
Alunos
Para registo, deixo aqui o artigo publicado ontem no Público.

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Para os profissionais dos serviços públicos, especialmente os intensos em contacto humano, os últimos anos têm sido muito duros, também por causa da pandemia. Com a agravante de que as sequelas das crises anteriores, financeiras, não tinham sarado completamente. É o caso dos profissionais da educação. Essa é uma realidade em muitos outros países. Ainda recentemente, o Le Monde trazia em manchete o “mal-estar docente” e lembrava que há vários anos que desce e é insuficiente para as necessidades a adesão aos concursos para a carreira docente.

 

Conformamo-nos? Não! Por isso há sete anos mudámos de ciclo político, também na educação. Em vez de dispensar dezenas de milhares de professores, de desinvestir da sua formação, de apressadas reformas curriculares retrógradas e sem diálogo, de tentar fazer da escola mais um crivo de seleção e discriminação social; em vez de desinvestir no público para gastar no privado, virámos o rumo para uma escola mais inclusiva e com mais meios para atender à diversidade de interesses dos alunos (das artes às profissões até à educação de adultos), com mais professores, mais professores vinculados e menos precários, mais assistentes, mais técnicos especializados, começando a devolver a escola à escola e à comunidade, com mais autonomia e mais flexibilidade que abre novos horizontes de desenvolvimento da profissionalidade docente e melhor resposta ao contexto, descongelando a carreira docente, investindo na formação relevante, …

 

Está tudo feito? Não está. Para continuamos, o ministro da Educação escolheu rever o regime de recrutamento docente, para começar a acabar com a “casa às costas” dos professores. O objetivo é combater a instabilidade e a precariedade. Definir com rigor as necessidades permanentes, escola a escola, para permitir acelerar as vinculações estáveis a quadros de escola. Diminuir a extensão das zonas pedagógicas, para diminuir as distâncias potenciais casa-escola. Sem entregar nenhuma competência nesta matéria às autoridades municipais ou intermunicipais, e sem perda de vínculos adquiridos.

 

Está em curso um processo de revalorização da Administração Pública que, de facto, se tornou necessária para corrigir longos anos de perda no mercado global do emprego público e privado, perda acentuada pelas respostas austeritárias às crises financeiras internacionais. Naturalmente, os professores olham para esse processo não querendo ser mais nem menos do que os outros servidores públicos. É justo. Mas não podemos perder esta oportunidade: o ministro da Educação é um praticante coerente do diálogo com a classe, com as suas associações e sindicatos. Não podemos perder a oportunidade de fazer, agora, um acordo para uma boa revisão do regime de recrutamento. Até para podermos abrir caminho para outros acordos noutras matérias.

 

Todas as profissões mais qualificadas se desvalorizaram relativamente, devido à forte expansão das qualificações. Há situações onde os servidores públicos são expostos a situações inaceitáveis de desrespeito pelas suas pessoas e funções, por parte deste ou aquele utente. Uma coisa é certa: ninguém mais do que este Ministério da Educação é aliado empenhado dos profissionais da educação em sua defesa e valorização. Faltar ao respeito aos professores é tentar a sua infantilização, supor que pedem vénias, quando o que querem é soluções compatíveis para a sua carreira e para a escola pública. Faltar ao respeito aos professores é dizer-lhes, contra toda a evidência que eles conhecem, que nada se fez nos últimos sete anos pela escola pública e pela valorização dos seus profissionais.

 
Porfírio Silva, 16 de Janeiro de 2023
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