Os responsáveis pelo Teatro da Cornucópia, Luis Miguel Cintra e Cristina Reis, divulgaram há pouco um esclarecimento sobre o que se tem estado a passar em torno da companhia. Constatando o nível de especulação que o assunto tem suscitado, com alguns a colocar na boca de Cintra palavras que ele não proferiu - e intenções cuja atribuição é puramente difamatória -, senti dever colocar aqui o texto desse esclarecimento. É como segue.
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Perante a lamentável confusão gerada nos órgãos de comunicação social pela inesperada visita do Senhor Presidente da República ao Teatro da Cornucópia, vemo-nos forçados a esclarecer a presente situação.
Ao longo dos muitos anos de dependência financeira do Estado, reivindicada como indispensável, várias vezes afirmámos, em pedidos de subsídio e relatórios, que as verbas concedidas eram insuficientes para o projecto de, ao nosso modo, fazer teatro.
Quando essas mesmas verbas atribuídas para financiamento das estruturas sofreram sucessivos cortes e tendo elas há três anos chegado a um valor visivelmente insuficiente, vimo-nos obrigados a rever escolhas de programação e respectivas formas de produção, de modo a sempre viabilizar os nossos projectos. As co-produções, bem como alguns apoios pontuais como os da CML e dos Amigos da Cornucópia, contribuíram para a sustentabilidade do funcionamento do Teatro da Cornucópia.
Antes do cumprimento do último ano do quadriénio a que estávamos vinculados, considerámos já a possibilidade de o não praticar, por considerar que era já difícil o seu pleno cumprimento. Mas insistimos em continuar. A evidência, porém, da situação limite das nossas possibilidades de assegurar, neste quadro de financiamento, o cumprimento de novos projectos, e tal como dissemos na divulgação do espectáculo apresentado neste último sábado, considerámos como incontornável o fecho da empresa Teatro da Cornucópia.
Tinha já sido esta a decisão, anteriormente, comunicada informalmente ao Secretário de Estado da Cultura e que mais tarde foi a razão da reunião havida no fim de Outubro no Palácio da Ajuda, com a presença de uma representante da CML. Foi então por nós levantada a questão que se prende com a CASA, edifício excepcional que ocupamos e onde sempre trabalhámos. Com tudo que ele contém. Exprimindo um desejo de que pudesse ser aproveitado para fins culturais, não deixando que esse património viesse a constituir somente um valor capaz de colmatar indemnizações aos trabalhadores, a única dívida que a empresa que se extingue não tem porventura capacidade de resolver. Entendemos que de momento a intenção do Ministério é a de assegurar um ano de renda no sentido de se proceder a um inventário rigoroso do património.
Na véspera do passado Sábado, (Recital Apollinaire e lançamento do segundo Livro do Teatro da Cornucópia/Espectáculos 2002-2016 e de um DVD), foi-nos comunicada a visita do Senhor Presidente da República, que, antes do espectáculo, queria inteirar-se da situação.
Desse momento surgiu um tema que se prende com a questão de um estatuto de excepção para o Teatro da Cornucópia, capaz talvez, de viabilizar a sua continuidade. Surgiu o equívoco de que poderíamos mudar de opinião. O que levou o Senhor Ministro da Cultura, também presente, a admitir que o tivéssemos feito. E parece não se ter restabelecido a única versão correcta que existe, porque infelizmente a dúvida já não se põe: o Teatro da Cornucópia acaba no princípio do ano, na realidade já acabou. Com a mudança do Governo, a situação não se alterou. Disse o Senhor Ministro que o assunto estava a ser acompanhado, estudado. Haverá por isso um próximo encontro com os representantes do Ministério da Cultura.
Não se tratará, portanto, agora de um estatuto de excepção, porque somos provavelmente excepção. A empresa dissolve-se nos próximos dias, dependendo apenas de procedimentos legais que terá de cumprir.
Às pessoas que elegemos para nos governarem e que se dispõem a ouvir-nos, não nos passa pela cabeça mentir. Para com eles, para com todos, mantivemos sempre as mais leais relações. Assim foi, assim será.
Pelo Teatro da Cornucópia,
Luis Miguel Cintra e Cristina Reis
19 de Dezembro de 2016