Manuel Alegre declarou estar no comício para "quebrar o tabu e o preconceito segundo o qual as esquerdas não se podem unir".
Manuel Alegre foi à "coisa". Uns diziam que era um comício, outros que era uma festa. Não importa muito. Uns diziam que era do Bloco, outros que era de Alegre. Devia ser de Alegre, porque há muito tempo que Alegre só vai a missas em que ele seja o oficiante: essa é a sua noção de "colectivo". Alguns tinham a esperança de que fosse para avançar ideias acerca de como remar contra os males do mundo. Outros achavam, com esperança ou com estratégia, que a coisa fosse para tentar travar o PS, o seu governo e a sua política. Destes, certamente estavam errados os que esperavam que dali saísse alguma ideia nova acerca de como melhorar o mundo.
Terá Alegre proposto que a União Europeia, num momento em que a ameaça de fome aumenta por todo o mundo, deixe de pagar aos seus agricultores para NÃO produzirem?
Terá Alegre proposto que a pesca deixe de ser asfixiada pelos pequenos monopólios efectivos que controlam as lotas, em prejuízo dos pescadores e dos consumidores, sob a protecção de regulamentos estalinistas que abençoam a especulação?
Terá Alegre explicado como as famílias condenam os seus filhos à mediocridade quando os protegem no desprezo pela educação e pela escola?
Terá Alegre feito sentir que os funcionários públicos que dormem à sombra da bananeira, porque não querem ou não sabem fazer a sua parte, estão a matar o "Estado social"?
Terá Alegre alertado para a necessidade de a legislação laboral contribuir equilibradamente para o progresso das empresas e para a melhor fortuna dos trabalhadores, abandonando o actual estado de modorra indiferente aos desafios comuns?
Isso é que seriam assuntos para mostrar que a esquerda existe. E, se Alegre dissesse isso, e muito mais, eu apoiaria - fosse a favor ou contra o governo. O meu ponto não é a lealdade a um governo ou a um partido. O meu ponto é a exploração populista da pobreza (dos outros), pelos políticos que repetem a mesma receita anos atrás de anos - mas sem nunca provarem do caldo que resulta da sua própria receita.
Nada há ao cimo da terra que faça tanto mal à esquerda como os auto-proclamados profetas da esquerda que permanecem indiferentes à realidade.
Entretanto, os meus parabéns a Louçã, o trotskista que, passados todos estes anos, reinventa as velhas tácticas trotskistas para parasitar os grandes partidos de esquerda enquanto os acusa de desvios de direita. Ao menos esse, com a velha superioridade moral dos revolucionários, sabe ao que anda.