No já distante dia 16 de Novembro de 2006, o Arqueologia do Corpo, um "blogue filosófico" (ponho entre aspas, porque para mim é elogio mas para outros pode parecer crítica) publicou a ilustração abaixo (que nos é dito ter vindo do livro de David Mills, Atheist Universe, Xlibris Corporation, 2004).
O método científico: - Aqui estão os factos. Que conclusões podemos tirar deles?
O método criacionista: - Aqui está a conclusão. Que factos podemos encontrar para a apoiar?
O método criacionista: - Aqui está a conclusão. Que factos podemos encontrar para a apoiar?
Tem alguma piada. Mas também contém um grave problema. Ilustra a razão pela qual uma tese completamente tonta (a ideia de que a criação do mundo por um deus pessoal pode ser científica, isto é, pode ser escrutinada cientificamente) consegue baralhar o debate com teses claramente científicas (como a teoria da evolução).
Qual é o problema? O problema é o discurso neo-positivista acerca da diferença entre factos e teorias, e a ideia também neo-positivista de que as teorias são apenas resumos apropriados de factos que se impuseram por si mesmos. Essas teses, populares mas cujas enormes debilidades já foram escrutinadas, tornaram aceitável para a "opinião pública" que a teoria da evolução, sendo "uma teoria" e não "um facto", é uma coisa comparável ao criacionismo. É claro (pelo menos a meu ver) que essa pretensão é uma tolice. Mas a possibilidade dessa tolice foi aberta por aquela ideia, ilustrada no cartoon acima, de que "factos são factos".
A questão é que, embora por vezes certos factos "saltem para cima da mesa" e se imponham, na maior dos casos o que orienta a procura dos factos é uma hipótese. E, aí, o processo é mesmo: temos aqui uma conclusão (uma possível conclusão mais ousada do que actualmente sabemos, dado aquilo que já julgamos saber e alguns buracos nas teorias actuais) e vamos à procura de factos que possam suportar essa conclusão (essa hipótese).
Pois, cuidado com as certezas científicas - e políticas, e religiosas... porque outras certezas mais complicadas podem sair-nos ao caminho!