Acabei (só) agora de ler, de seguida, dois livros de dissidentes do PCP: de Raimundo Narciso, “Álvaro Cunhal e a dissidência da Terceira Via” (Âmbar); de Zita Seabra, “Foi assim” (Aletheia).
Anda por aí muita escrita sobre estes livros, especialmente sobre o segundo. Não me vou alongar sobre eles (livros), não porque não mereçam, mas porque nesta altura tenho a impressão de que quase tudo o que se diz sobre esses livros não é sobre esses livros: é sobre a simpatia ou antipatia que temos pelos seus autores, é sobre o que achamos do comunismo em geral e do PCP em particular, é sobre as nossas próprias atitudes face aos aspectos mais trágicos do século XX, é sobre as nossas próprias preferências políticas, afinal. E isso também se aplica a mim, pois claro.
Queria, contudo, mesmo assim, dizer o seguinte sobre ambos os livros: parecem-me basicamente sinceros e honestos. E parecem-me testemunhos importantes. Não são, necessariamente, testemunhos infalíveis, nenhum deles estará isento de algum perspectivismo – mas são material que, de futuro, será utilizado para escrever uma história necessária.
Reflectem a personalidade de cada um dos autores? Claro que sim: como podia deixar de ser assim? De qualquer modo, no essencial o que neles se escreve é escrutinável: mesmo que alguns relatos só possam ser reconstituídos perguntando a sua versão a quem já morreu, a esmagadora maioria do que é contado é confrontável com outros testemunhos e permite traçar o quadro do que realmente se passou.
É curioso ver como alguns ex-comunistas, conhecedores dos agora autores de relatos de dissidentes, reagem a estas publicações. Alguns não estão muito excitados com as peripécias políticas, tendo sido mais marcados pelo “carácter” dos protagonistas (“puritanismo socialista”, por exemplo) aplicado a situações concretas. Outros incomodam-se com estes exercícios memoriais, achando que se trata de ajustes de contas consigo mesmos. Talvez. Mas, por que não? Ficamos todos a ganhar. Os que sabemos que algumas daquelas coisas também existem noutros partidos; os que sabemos que a maior parte daquelas coisas eram realmente exclusivo de uma paranóia unicamente comunista; os que achamos importante que se continue a reflectir sobre “como foi possível”.
Por exemplo, como foi possível que os mais nobres ideias de esquerda tenham cegado tanta gente. Continua a ser um bom tema de reflexão. A par com outros temas de reflexão que também mereciam cuidado. Por exemplo, como foi possível que líderes de Estados da Europa ocidental tenham apoiado os crimes de Pinochet no Chile?
O importante é não fechar os olhos. Estes dois livros ajudam, independentemente das nossas simpatias e das nossas embirrações idiossincráticas. E nada voará mais alto do que esse facto: nem mesmo aqueles que continuam hoje a tentar sujar estas obras testemunhais com a mesma técnica de “assassinato de carácter” que aprenderam nas fileiras do Camarada Álvaro.
Anda por aí muita escrita sobre estes livros, especialmente sobre o segundo. Não me vou alongar sobre eles (livros), não porque não mereçam, mas porque nesta altura tenho a impressão de que quase tudo o que se diz sobre esses livros não é sobre esses livros: é sobre a simpatia ou antipatia que temos pelos seus autores, é sobre o que achamos do comunismo em geral e do PCP em particular, é sobre as nossas próprias atitudes face aos aspectos mais trágicos do século XX, é sobre as nossas próprias preferências políticas, afinal. E isso também se aplica a mim, pois claro.
Queria, contudo, mesmo assim, dizer o seguinte sobre ambos os livros: parecem-me basicamente sinceros e honestos. E parecem-me testemunhos importantes. Não são, necessariamente, testemunhos infalíveis, nenhum deles estará isento de algum perspectivismo – mas são material que, de futuro, será utilizado para escrever uma história necessária.
Reflectem a personalidade de cada um dos autores? Claro que sim: como podia deixar de ser assim? De qualquer modo, no essencial o que neles se escreve é escrutinável: mesmo que alguns relatos só possam ser reconstituídos perguntando a sua versão a quem já morreu, a esmagadora maioria do que é contado é confrontável com outros testemunhos e permite traçar o quadro do que realmente se passou.
É curioso ver como alguns ex-comunistas, conhecedores dos agora autores de relatos de dissidentes, reagem a estas publicações. Alguns não estão muito excitados com as peripécias políticas, tendo sido mais marcados pelo “carácter” dos protagonistas (“puritanismo socialista”, por exemplo) aplicado a situações concretas. Outros incomodam-se com estes exercícios memoriais, achando que se trata de ajustes de contas consigo mesmos. Talvez. Mas, por que não? Ficamos todos a ganhar. Os que sabemos que algumas daquelas coisas também existem noutros partidos; os que sabemos que a maior parte daquelas coisas eram realmente exclusivo de uma paranóia unicamente comunista; os que achamos importante que se continue a reflectir sobre “como foi possível”.
Por exemplo, como foi possível que os mais nobres ideias de esquerda tenham cegado tanta gente. Continua a ser um bom tema de reflexão. A par com outros temas de reflexão que também mereciam cuidado. Por exemplo, como foi possível que líderes de Estados da Europa ocidental tenham apoiado os crimes de Pinochet no Chile?
O importante é não fechar os olhos. Estes dois livros ajudam, independentemente das nossas simpatias e das nossas embirrações idiossincráticas. E nada voará mais alto do que esse facto: nem mesmo aqueles que continuam hoje a tentar sujar estas obras testemunhais com a mesma técnica de “assassinato de carácter” que aprenderam nas fileiras do Camarada Álvaro.