O Eduardo Graça, do blogue Absorto, desafia assim: manter uma corrente de confissões acerca de leituras em curso. Cinco livros que andem a ser lidos. Essa corrente já vem de longe e, garanto-vos, é muito instrutivo segui-la às arrecuas, recuando, puxando os elos anteriores, conhecendo blogues novos de gente que lê. Então, vamos pois a isso. No fim faço os meus desafios para quem gostaria que desse continuidade.
Perfect Order. Recognizing Complexity in Bali, de J. Stephen Lansing, editado pela Princeton University Press, 2006. Este livro é o mais recente deste antropólogo, estudioso da forma particular como o sistema religioso e o sistema económico se entrelaçam na ilha de Bali, onde em certas regiões o cultivo do arroz e o culto da Deusa do Lago estão historicamente ligadas na mesma base institucional (a complexa rede de “templos da água”, geridos de forma mais ou menos cooperativa, aos quais cabe regular quer o culto religioso, quer a distribuição da água pela montanha abaixo e entre os cultivadores de arroz, quer a “democracia” das aldeias). Esta leitura faz parte dos meus estudos sobre as instituições, mas também irá contribuir para uma reflexão em curso acerca das relações entre ciência, sociedade e religião. Um livro que acompanha este, e que ajuda se for sendo lido ao mesmo tempo, é, do mesmo autor, “Priests and Programmers. Technologies of Power in the Engineered Landscape of Bali” (já de 1991).
A Grande Transformação. As origens da nossa época, de Karl Polanyi. Trata-se de uma tradução brasileira do grande clássico, escrito durante a Segunda Guerra Mundial, cruzando História, Antropologia, Economia Política. Este livro “explica” a formação da “sociedade capitalista”, uma sociedade onde a instituição “mercado” se separou das outras instituições sociais e onde se alimenta a ficção (ou a ideologia) de que o mercado é autónomo do resto da sociedade e é o padrão de referência que deve marcar o funcionamento de tudo o resto na vida das gentes. Este livro insere-se nas minhas leituras tendentes a enquadrar (histórica e filosoficamente) as origens da ortodoxia dominante em teoria económica. A seguir, se tiver coragem, seguirei com “Adam Smith – O conceito mecanicista de liberdade”, de Fernando Araújo, editado pela Almedina em 2001 (são 1493 páginas, oriundas de uma dissertação de doutoramento em Ciências Jurídico-Económicas na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa – isto é para calar aqueles que dizem que a minha é demasiado longa).
How the body shapes the way we think. A new view of intelligence, de Rolf Pfeifer e Josh Bongard, editado pela The MIT Press, 2007. Esta é uma leitura de actualização das minhas investigações sobre ciências do artificial. É mais uma das obras a explicar como a Inteligência Artificial cometeu o grande erro de pensar que a inteligência está “dentro da cabeça” - quando na verdade a inteligência é algo muito mais “corporal” e menos “lógico” do que a maioria pensava há alguns anos. O livro não é muito profundo para quem conheça bem o domínio, mas é um bom ponto de partida para quem queira saber as “maldades” que se andam por aí a fazer com robots a imitar os humanos (ou a tentar fintá-los).
D. Manuel I, de João Paulo Oliveira e Costa, edição do Círculo de Leitores, 2005. Esta biografia insere-se genericamente na minha tentativa de perceber melhor o século XVI português, e inscreve-se mais especificamente num projecto em que ando a ruminar há algum tempo... mas sobre isso não posso de momento dizer mais.
Merci Patroné um álbum de Banda Desenhada, do português que usa o pseudónimo Rui Lacas. Está publicado num editor francófono, Éditions Paquet, desde 2006, mas vai sair proximamente em português (e em Portugal). Estou a reler este magnífico livro. O excelente blogue Ler BD publicou um texto muito bom sobre esta obra. O próprio Lacas também tem um blogue, mas pobrezinho: vão ver, porque é capaz de estar para ser ressuscitado.
Gostaria que os autores dos seguintes blogues dessem continuidade a esta corrente de leituras: No Mundo, Arquelogia do Corpo, Cogir , Ciência ao Natural, Cyber Sapiens.