22.1.10

Haiti e Lisboa, perguntas diferentes


O terremoto, seguido de maremoto, de Lisboa, em 1755, desencadeou uma crise tremenda no pensamento teológico e filosófico da época. A questão estava na dificuldade de compreender como pode acontecer o mal num mundo bem ordenado criado por Deus. Como pode Deus deixar que aconteçam coisas más? Como pode Deus, ainda por cima, deixar que sejam vítimas dessas coisas más aqueles que são bons, tais como as criancinhas e demais inocentes? Se Deus é benevolente, se Deus é todo-poderoso, como poder haver todo este mal no mundo?

Não foi fácil, nesse tempo, identificar onde estava o defeito do raciocínio. Ou pelo menos admitir onde tinha obrigatoriamente de levar a resposta: ou Deus não existia, ou não era todo-poderoso, ou não era benevolente. Resolver o problema passava por considerar outros factores que não o "culpado óbvio" com os poderes "óbvios" e a psicologia "óbvia".

Para lá do sofrimento humano que o Haiti representa e lembra, podemos ajuizar quanto o mundo mudou, pelo menos intelectualmente, por não nos ocorrerem já, a propósito do tremer da Terra no Haiti, as mesmas perguntas que atormentaram o mundo culto europeu sobre o terremoto e maremoto de Lisboa. As perguntas, hoje, haveriam de ser talvez mais acerca da prudência humana e da sabedoria colectiva. Ou da sua falta.