30.12.10

debates presidenciais 2011, "depois do adeus"


Ontem, Cavaco e Alegre fecharam o ciclo dos debates para as presidenciais. CS, numa agressividade que não lhe é usual, deu uma pequena amostra do que vai ser o seu próximo mandato: manter a arrogância (as discordâncias são ataques) e esquecer a hipocrisia (passar a dizer o que realmente pensa e quer). A melhor amostra da inanidade política do seu discurso foi falar do Estado Social como se o Estado Social fossem as Misericórdias e as iniciativas de (às vezes duvidosa) benemerência de empresas "de bom coração". Cavaco ainda pensa que o Estado Social é a caridade, não percebendo que o Estado Social é necessário para não termos de estender a mão à caridade. Infelizmente, Alegre, aparentemente aturdido pela estratégia de "a melhor defesa é o ataque" seguida por Cavaco, não foi capaz de esclarecer esse ponto. Aliás, não foi capaz de esclarecer praticamente nada. Se calhar pensava que podia manter a amena cavaqueira do debate correspondente nas últimas presidenciais, quando quis deixar a Mário Soares o "odioso" do confronto com Cavaco, reservando para si próprio o papel de "esquerda simpática" face ao candidato de todas as direitas. Saiu-lhe furada a aposta e ficou evidente que não se preparou para a seriedade desta eleição presidencial.
O drama de tudo isto não é este debate em particular. O drama de tudo isto é que, contrariamente ao PCP, que, com o seu comportamento cauteloso, nunca fez a esquerda perder nenhuma eleição presidencial, há outro partido da esquerda que, na primeira oportunidade que teve, colocou os seus interesses particulares à frente do interesse de tirar Cavaco de Belém. A direcção louçanista do BE não descansou enquanto não fez seus reféns nesta corrida o PS e o PCP, apoderando-se de uma candidatura que, tinha obrigação de saber, nunca seria vencedora se fosse a candidatura desse grupo. Teria sido menos prejudicial para as ambições presidenciais da esquerda que tivesse feito vencimento a minoria "radical" do Bloco que queria um candidato mais "revolucionário" do que Alegre. Louçã, que, como qualquer trotskista clássico, sonha em vencer nas urnas os sociais-democratas (PS) e os estalinistas (PCP), deixou-se dominar pelos seus demónios e inventou esta jogada suicida de que agora há-de querer alijar responsabilidades.
Alegre, ele próprio, não parece ter gasto um único minuto a pensar seriamente no magno problema da esquerda portuguesa: o que é preciso mudar para que "a esquerda" não seja um animal esquartejado em três partidos incapazes de perceber que, sociológica e politicamente, podiam oferecer ao país uma alternativa à "gestão leal do capitalismo". Coisa que, nos tempos que correm, seria muito útil, até para salvar a democracia, o que não se pode fazer sem oferecer verdadeiras opções ao povo soberano. Alegre não tomou consciência da dificuldade da tarefa, não se preparou, não deu nenhum sinal de renovação do discurso, não transmitiu qualquer frémito de tempo novo ao seu campo. Confirmou os piores prognósticos dos que deixaram de acreditar em proclamações ideológicas puramente retóricas. Não é que ele, por si mesmo, me faça pena. Pena é que nos arraste a todos para a apagada e vil tristeza de reeleger o pior presidente da república desta democracia constitucional.