3.12.10

alguém tem de advogar os interesses dos privados quando eles se opõem ao interesse do Estado, dos nossos impostos e do bem comum


Marques Mendes considera nova empresa pública para gerir as Parcerias Público-Privadas “uma provocação” e um “escândalo”. «“Mais uma EP o que é? São mais lugares de administradores; são mais lugares de directores, assessores e secretárias; são mais automóveis topo de gama. Tudo à custa do zé-povinho, o que aperta o cinto”, afirmou o ex-líder do PSD, no seu comentário habitual na Edição da Dez da TVI24.»

Fez-se um grande burburinho em torno do livro de Carlos Moreno, "Como o Estado gasta o nosso dinheiro". O livro merece uma leitura que escape às boutades de ocasião, já que a mensagem que ele contém não é tão simplista como parece. Voltaremos a isso.
Entretanto, há certamente um aspecto central em qualquer leitura do "relatório" de Carlos Moreno: o Estado não está suficientemente habilitado para as duras negociações com os privados precisamente por não ter organizado, concentrado, acumulado e rentabilizado o conhecimento de que devia dispor por ter estado envolvido em tantas negociações de PPP. Recorrendo muitas vezes a sociedades de advogados para lidar com as negociações, paga o trabalho e depois deixa ir o conhecimento e experiência que assim se ganhou; se recorresse a meios próprios, acumulava esse conhecimento e essa experiência, podendo mobilizá-la em ocasiões sucessivas. E, provavelmente, com menos riscos de contaminação de interesses. Outras vezes o problema é a dispersão: equipas espalhadas por diferentes serviços ou empresas públicas lidam cada uma com um caso particular, em vez de se concentrar e cruzar o conhecimento dos escolhos e soluções que a defesa do interesse comum enfrenta nesse tipo de negociações - negociações difíceis para as quais as partes privadas se preparam olimpicamente, como lhes cabe. Esse mau uso do investimento em conhecimento, por parte do Estado enquanto parte das PPP, parece, segundo Carlos Moreno, ser uma das explicações mais pesadas para a forma como o interesse público foi maltratado em muitas das tais parcerias.
O que o governo agora diz que vai fazer é, em princípio, um bom passo no sentido de melhorar a defesa do interesse público nas PPP. Organizar as tropas para ganhar mais batalhas, com menos baixas e com menos custos.
Marques Mendes, se declarou aquilo que o Público diz que ele declarou, das duas uma: ou não percebeu aquela explicação simples de Carlos Moreno; ou está aborrecido por o Estado estar a fazer alguma coisa para que o interesse público seja defendido como deve ser nas Parcerias Público-Privadas. Assim se vê como o "discurso da tanga", inventado por Durão Barroso mas que está sempre a voltar ao PSD (e à sociedade portuguesa, como caldo de cultura), não é um discurso inocente. Serve interesses objectivos. Serve para meter tudo no mesmo saco, embrulhado em fumaça, e proteger enviesadamente aquilo que não se tem coragem para defender claramente, à luz do dia.