26.5.09

Darwin contra o darwnismo


A 12 de Fevereiro de 2009, o mundo comemorou os 200 anos de Charles Darwin. Se a importância de Darwin é universalmente reconhecida pelos biólogos, em economia o seu nome está associado à visão de uma concorrência feroz, impiedosa e omnipresente. Mas Darwin, ele próprio, não teria necessariamente aderido a este "darwinismo" económico e social.

Em A Origem das Espécies, Darwin quase nada escreveu sobre o homem. Mas, noutra obra, The Descent of Man, a sua visão das sociedades humanas dá um lugar importante à cooperação. Não apenas, pensava ele, esta cooperação era necessária e sã, mas além disso ela foi favorecida pelo processo ... de selecção natural. "Quando duas tribos estavam em concorrência," escreveu ele, "se uma delas tivesse uma elevada proporção de pessoas corajosas, altruístas e leais, sempre prontas a avisar os seus companheiros da presença de perigo, e para se defenderem mutuamente, esta tribo teria mais sucesso. "

Num livro publicado em Janeiro de 2009 em Londres (Darwin's Sacred Cause, ed. Houghton Mifflin Harcourt), os seus biógrafos, Adrian Desmond e James Moore, mostram que a paixão que levou Darwin a desenvolver a teoria da selecção natural devia menos a um compromisso estritamente científico do que à sua participação nos grandes debates da época sobre a escravatura. Os seus dois avôs, Erasmus Darwin e Josiah Wedgwood, eram militantes anti-esclavagistas. O próprio Darwin viu o comércio de escravos durante a sua viagem à volta do mundo a bordo do Beagle. Ele queria provar que todas as raças vieram de um antepassado comum, membro da espécie Homo sapiens. A selecção natural era um argumento na sua defesa da cooperação humana.

Com efeito, enquanto a concorrência está presente em todos os discursos económicos, cada um de nós cruza-se todos os dias com muito mais pessoas das quais depende e a quem pode dar o seu apoio, do que com verdadeiros concorrentes. Desde o padeiro, que nos vende o seu pão, até à equipa que nos rodeia no escritório, passando pelo motorista do autocarro, ficamos satisfeitos quando cada um faz o seu trabalho bem feito, e decepcionados quando o fazem mal. Seria exactamente o oposto se eles fossem nossos concorrentes!

Mas Darwin também admitia que os grupos solidários estão muitas vezes em concorrência com outros grupos igualmente solidários. Esta concorrência era, para ele, o berço do altruísmo e do apoio recíproco, que são centrais para a nossa sociedade moderna. Que a solidariedade humana seja forte nas situações difíceis, não é uma imagem poética, mas um facto científico. Na crise económica que toma conta do nosso planeta, estamos mais do que nunca precisados das lições de Darwin.


Paul Seabright
Escola de Economia de Toulouse
Le Monde Économie, 17 de Fevereiro de 2009
(versão portuguesa de Porfírio Silva)