25.6.07

Notas soltas sobre a reforma do Estado social (1/3)


1. SUBSTITUIR A ESTRATÉGIA DOS “DIREITOS ADQUIRIDOS” PELA VELHA UTOPIA “A CADA UM SEGUNDO AS SUAS NECESSIDADES, DE CADA UM SEGUNDO AS SUAS POSSIBILIDADES”



A estratégia central da oposição às reformas encetadas pelo actual governo assenta na noção de “direitos adquiridos”. Trata-se de uma estratégia típica da esquerda conservadora, mas é uma estratégia puramente defensiva (destina-se apenas a evitar a perda de regalias já conquistadas), insensível à mudança de contexto (uma nova situação pode tornar preferível novos direitos, mas essa lógica cai fora da estratégia dos direitos adquiridos). Assim sendo, é uma estratégia que se torna necessariamente obsoleta.

O que precisamos é de um regresso à velha utopia “a cada um segundo as suas necessidades, de cada um segundo as suas possibilidades”. Isso significa que precisamos de uma dinâmica evolutiva da equação direitos/deveres, atenta aos novos privilégios e às novas exclusões.

Exemplo: porque é que um rico e um pobre hão-de pagar o mesmo (ou praticamente o mesmo) para aceder a cuidados de saúde? O princípio da gratuitidade tendencial da saúde pertence a uma estratégia fixista, de “preservação de direitos”, mas é um princípio injusto. A certo momento, o principal argumento para manter essa situação era a ineficácia do controlo do rendimento, mas essa situação evoluiu bastante e pode evoluir mais. A lógica dos direitos adquiridos, ou qualquer lógica defensiva e igualitarista, é injusta e ineficaz. É preciso substituí-la por uma lógica de adequação às necessidades e possibilidades de cada um: cuidados de saúde de qualidade elevada para todos, gratuitos para quem precisa e não pode pagar, bem pagos por quem pode pagar. É preciso levar mais longe a estratégia de diferenciação das prestações sociais.

Quer isto dizer que a a estratégia dos direitos adquiridos é inútil? Não, ela serve para evitar o retrocesso social generalizado imposto por um sector da sociedade contra outros sectores. Para conciliar as duas coisas (progresso social e adequação aos novos contextos), o que é necessário é que as novas soluções sejam obtidas por um diálogo social aprofundado. Aí temos outro problema de fundo.