Temos direito ao protesto. Direito à indignação. A manifestar-nos.
Muitos estão desesperados. Vivem mal. Estão sem meios para dar aos seus filhos a educação que acham que eles precisam e merecem. Estão a comer mal. Estão com medo. Estão na corda bamba. Muitos mesmo.
E não podemos calar essa realidade. Não podemos, nem queremos calar.
Quererá isso dizer que qualquer pessoa desempregada, desesperada, desorientada, pode irromper por qualquer acto público oficial e interrompê-lo aos gritos? Respeitar o sofrimento das pessoas e lutar contra esta situação quererá dizer que qualquer pessoa em sofrimento tem de ser autorizada a invectivar o PR, o PM, qualquer figura do Estado, em toda e qualquer circunstância?
Não é politicamente correcto publicar esta interrogação, mas tem de ser feito.
Posso compreender o desespero de uma pessoa que não aguenta mais e tem um impulso irreprimível para dar largas à sua revolta perante um alinhamento de figuras do Estado. Não caio na insensibilidade de condenar essa pessoa, porque não acredito que se possa sempre acomodar racionalmente, ou estrategicamente, a dor funda de nos terem atirado para a valeta da vida. Compreendo essa pessoa, essas pessoas. Mas não compreendo, de modo nenhum, que se defenda que temos o direito de fazer isso, que esses actos são normais, que se critique a segurança que impede a consumação dessas abordagens. A demagogia feita à custa dos que sofrem é a demagogia mais abjecta que posso conceber.
Se misturarmos tudo, no mesmo espaço e no mesmo tempo, dizendo que o direito ao protesto significa que se pode protestar de todas as maneiras em todos os sítios e a todas as horas, as instituições deixam de funcionar. Isso será talvez uma boa notícia para aqueles que não percebem que sem instituições voltamos à selva. Para quem percebe que o que precisamos é de instituições melhores, mais capazes, mais entrosadas com a participação cidadã, mais focadas na realidade, não será difícil perceber que o cerco das instituições não vai resolver problema nenhum, só estragar o que já está mau. Espero que o país não caia na armadilha de estimular o cerco das instituições. Pagaríamos isso muito caro.