20.2.12

as vaias.


Não tenho simpatia por este governo. Cada vez tenho menos. Pelo conteúdo das políticas, mas também pela arrogância ideológica, tanto como pelo troca-tintismo (ora "a herança" do Memorando é tramada, ora o Memorando é a solução programaticamente coincidente com o programa do PSD).
Isso não me impede, contudo, de discordar que se normalize um dispositivo de cerco aos membros do governo, bem representado pela técnica de "apertar" e vaiar o PM para onde quer que ele vá.
Acho que todos sabemos distinguir uns apupos espontâneos contra um dirigente qualquer, provocados pelo natural descontentamento com a sua acção ou por alguns disparates recentes saídos de sua boca, de outra coisa bem diferente: "esperas" organizadas e destinadas a rodear de máxima tensão qualquer tentativa do PM para mostrar o nariz fora de portas. O PM deve ser confrontado, no sentido de as pessoas falarem com ele, o criticarem directamente, lhe darem exemplos concretos e vividos das consequências da sua política. Só que esse confronto directo, popular e genuíno, deixa de ser possível se for montado um dispositivo de acosso sistemático às suas deslocações.
Lembro que esta técnica de bloqueio cívico ao PM já foi seguida contra Sócrates. Está agora a ser ensaiada contra PPC. Fui contra, antes; sou contra, agora. Melhorar a qualidade da democracia e alargar o debate não podem tornar-se incompatíveis com a contestação. A anulação de uma das partes nunca é o caminho para a resolução dos problemas. A tentação de fazer com que a rua cale os governantes é uma tentação totalitária: como totalitária é a tentação de calar pelo ruído quem quer que seja. A rua também tem o seu papel numa democracia representativa, mas o seu papel tem de ser o de lugar onde as palavras se trocam com sentido. A rua, em democracia, não pode ser o lugar para tentar anular o outro. As vaias, se forem instaladas como método de perseguição, são um procedimento, no mínimo inútil; são, mais provavelmente, contraproducentes.