Um dos aspectos notáveis do interesse blogosférico pelo momento que a Grécia atravessa tem a ver com as previsões acerca dos resultados das próximas eleições. Já aqui veio alguém, em caixa de comentários, comprazer-se porque os partidos anti-troika devem vir a representar uma fatia importante do próximo parlamento grego. Outros estão excitados porque os socialistas, que pegaram numa crise extraordinária e irresponsavelmente agravada pela direita, sairão provavelmente em frangalhos das próximas legislativas. Há, portanto, muita gente a esfregar as mãos de contentamento com os resultados esperados das próximas eleições.
Será que ninguém pensa quão pornográfica é essa excitação? Qualquer que seja o resultado das próximas eleições gregas, ele será o resultado de um país despedaçado pela acção dos seus "amigos" e "aliados". Qualquer que seja o resultado das próximas eleições gregas, tal como a Grécia de hoje, trata-se de um produto de uma guerra conduzida por meios não tradicionais. Uma guerra de egoísmos e esquecimentos, alguns dos quais já foram lembrados pelo presidente da república helénica. As eleições serão um artefacto da estupidez da Europa, principalmente da Europa rica que gosta de quem lhes compre os seus produtos, mas não se importa de esmagar uma democracia.
(Esquecida, essa Europa rica, do mal que a História testemunha que já nos causou a nós todos. Esquecida, essa Europa rica, alemã neste caso, de como outros europeus foram pacientes e simpáticos durante décadas com as dívidas que eles tinham para pagar na sequência da guerra. Aliás, parece que à Grécia a Alemanha nunca pagou, mesmo).
O regozijo de alguns com o previsível resultado de umas eleições que serão produto de uma agressão externa, de uma verdadeira guerra civil europeia, é pornográfico. É que essas eleições serão tudo menos livres. Essas eleições, provavelmente, vão ensinar-nos muito mais do que estamos à espera - mas que se tenha chegado a elas, nestas condições, é, em si mesmo, um facto preocupante. Que se regozijem os que esperam que essas eleições de guerra confortem os seus aliados espirituais, diz muito do estado a que chegou a política neste continente.
Eu, por mim, numa coisa estou com os mais conservadores entre nós: não desejo que queimemos as nossas cidades para que alguém ganhe eleições com isso. Mas há muito por aí quem afague as suas impotências revolucionárias com o calor das fogueiras gregas - cujos frutos esperam se colham maduros nas urnas. Em cinzas, como convém às urnas.