O Avante! on-line, num texto intitulado "20 anos de retrocesso", refere-se às "comemorações" (as aspas são do original) do 20.º aniversário da queda do muro de Berlim como "pretexto para mais uma campanha anticomunista". Acrescenta, reafirmando as posições mais reaccionárias do movimento comunista internacional, que cabem sempre ao PCP, o seguinte:
Toda a imprensa ocidental dominante faz coro em qualificar a queda do muro, e portanto a derrota do socialismo, como a «libertação» do povo da RDA e sinónimo de avanço civilizacional.Porém, a realidade das últimas duas décadas, não só na Alemanha de Leste, mas também na generalidade dos antigos países socialista do Centro e Leste Europeu, já para não falar da URSS, não testemunha qualquer progresso, por mínimo que seja, para o povo, mas antes um tremendo retrocesso económico e social que reduziu à miséria amplas camadas da população, condenou a juventude ao desemprego, privando a grande maioria de uma perspectiva optimista de futuro.
Este texto ilustra mais uma vez, se ainda faltassem disso mostras, o desprezo oficial do comunismo português pela democracia política e pela liberdade, que foram ganhos inequívocos dessas transformações a Leste. Hoje, em crónica no jornal i, Pedro Adão e Silva comenta este tipo de posicionamento do PCP escrevendo que ele denota "por trás das falas mansas do comunismo de sociedade recreativa", um partido "envolvido num crescendo de ortodoxia sem paralelo no mundo ocidental" - e lembra o enlevo de Bernardino Soares com a Coreia do Norte ou a deputada Rita Rato a tentar passar uma esponja pelo Gulag.
Tem toda a razão Pedro Adão e Silva. Mas deve acrescentar-se mais alguma coisa. Sem qualquer compromisso quanto à liberdade, cujo valor nunca é demais salientar - e por isso comemoramos mesmo a queda do Muro de Berlim - há que reconhecer que, à luz do princípio segundo o qual todos os direitos humanos merecem promoção, a democracia nem sempre tem sido lesta a garantir os direitos sociais e económicos que não deviam ser menos valorizados que os direitos políticos. E é por isso que, como nota o mesmo texto do Avante! , muitos alemães de Leste continuam a achar que havia mais coisas boas do que más na antiga República Democrática Alemã. Isto deve questionar-nos, principalmente a quem se assuma como socialista (ou social-democrata, ou trabalhista, consoante as tradições). E não será a cegueira histórica do PCP que nos impedirá de ver quando o erro que ele comete aponta para uma questão genuína e a que não devemos fugir. A democracia não tem medo da comparação com o comunismo, contrariamente ao que defende o PCP. Mas também não deve ter medo de fazer face às suas fraquezas.