Escreveu-se aqui, na quinta-feira passada, que na sexta-feira estaríamos na "noite dos investigadores". E prometemos contar depois o que lá andaríamos a fazer. Cumprimos aqui e agora essa promessa.
Fomos fazer uma demonstração de uma experiência no âmbito de um projecto. O projecto chama-se "Robótica Institucionalista", está a decorrer no Instituto de Sistemas e Robótica (Instituto Superior Técnico) e teve a sua origem "remota" na minha tese de doutoramento em Filosofia da Ciência. Trata-se de procurar uma nova abordagem à Robótica Colectiva. A experiência consiste em tentar que um grupo de robots "compreenda" o enquadramento social ligado a um cenário de tráfego urbano e seja capaz de se comportar razoavelmente nele.
Usamos um cenário com um mini-segmento de um sistema de tráfego urbano (o cenário da demonstração é muito, muito minimalista).
Usamos uns pequenos robots designados por e-pucks.
Para demonstração só mostramos os robots a executarem autonomamente dois comportamentos básicos (evitamento de obstáculos e seguimento de paredes) e a usarem apenas uma gama dos sensores de que dispõem (só usam infravermelhos).
Para que saibam que não é fácil a vida dos robots, convidamos os circunstantes a "conduzir" um robot (controlando-o com o computador, via bluetooth) tentando dar uma volta a uma das rotundas do cenário, mas usando apenas a informação captada pela câmara frontal do robot para saberem o que se está a passar (evitando, portanto, olhar directamente para o cenário).
O Zé Nuno é que fez toda a despesa de explicar a experiência aos visitantes, no que foi muito eficaz e simpático.
O evento começou pelas 14 horas, suavemente... mas durou até depois da meia-noite, com muitos visitantes: um fluxo contínuo bastante forte a partir das 18.30.
Prova-se assim que, com uma "instalação" sem nenhuma sofisticação exagerada (só os robots e a ideia são sofisticados!!!) consegue-se transmitir um pouco do que fazemos em robótica colectiva.
Para não assustarmos (nem desiludirmos) os visitantes, não esclarecemos que quem estava ali a apresentar aquela experiência não eram engenheiros. Tratava-se de um matemático e um filósofo...
Alguns dos visitantes não terão percebido nada da explicação, mas mesmo assim tiveram direito à sua quota parte de fascínio!
Reproduzimos de seguida o texto de apresentação da experiência que foi distribuído no decurso da "Noite dos Investigadores".
Podemos partilhar as ruas com robots?
Será que podemos andar nas ruas das nossas cidades, a pé ou conduzindo algum tipo de veiculo, partilhando esse espaço com robots autónomos móveis? Poderão humanos e robots partilhar os mesmos espaços, interagindo de forma sofisticada no respeito por normas sociais que nós humanos consideramos razoáveis?
Robótica Institucionalista: Inteligência Social para Máquinas
O Deep Blue fez história ao tornar-se (em 1997) o primeiro computador a vencer no xadrez um campeão mundial da modalidade num encontro organizado de acordo com as condições tradicionais de torneio. A robótica colectiva tem levado os desafios mais longe ao colocar múltiplos robots em interacção entre si e com o mundo físico.
Algumas linhas da robótica colectiva procuram inspiração biológica, por exemplo recorrendo a inteligência de enxame, modelada a partir da robustez e flexibilidade com que colónias de insectos sociais, como certas formigas, certas abelhas ou certas vespas, realizam certas actividades complexas apenas com base em interacções simples entre comportamentos individuais geneticamente instalados. Mas a robótica colectiva tem mais recentemente procurado inspiração também nas ciências da sociedade. O projecto "Robótica Institucionalista" é um desenvolvimento recente do trabalho que o Instituto de Sistemas e Robótica (Instituto Superior Técnico) tem vindo a realizar há vários anos em torno das "sociedades artificiais", procurando agora mais explicitamente integrar conceitos das ciências sociais. A Robótica Institucionalista concebe as instituições como centrais em qualquer sociedade sofisticada - mesmo que também haja robots nessa sociedade!
O objectivo desta experiência é compreender como é que robots e humanos podem desenvolver actividades num ambiente partilhado. Como é que os robots saberão como comportar-se? Como é que os humanos saberão como lidar com os robots? Teremos nós de aprender novas regras para convivermos em "sociedades artificiais"? Procuramos fazer com que os robots usem as mesmas normas, as mesmas rotinas, as mesmas indicações que os próprios humanos estabelecem para seu próprio uso nos seus ambientes. Desse modo, os humanos poderão interagir com eles sem uma aprendizagem especifica, de forma "natural".
O cenário social em que estamos a trabalhar é, para já, muito limitado. O objectivo é termos robots capazes de comportar-se como condutores de automóveis num cenário urbano. Para isso terão de conhecer, nomeadamente, as normas constantes do código da estrada, os sinais que regulam o trânsito, os agentes com autoridade nesse contexto (polícias de trânsito) - mas também certas normas mais gerais (respeitar a integridade dos outros, por exemplo). Os pequenos robots que utilizamos (os e-pucks) deverão ser capazes de respeitar - mas também de não respeitar! - esse ambiente institucional. Sabendo, por exemplo, que penalizações podem resultar de obedecer ou desobedecer a certas prescrições.
Esta experiência está numa fase inicial. O que se mostra aqui é ainda apenas o problema: como podemos tornar estes robots capazes de se comportarem de forma civilizada ao volante ¬sabendo que mesmo levar os humanos a fazer isso não é fácil?