29.11.07

Testar a hipótese da ordem social espontânea (3/5)

Apresentamos agora as primeiras experiências, e as mais simples, realizadas por Castro Caldas (2001) no âmbito do que vimos chamando um teste (com ferramentas de Inteligência Artificial) à “hipótese da ordem social espontânea”.


Problema de Coordenação (versão 1)


Consideremos a seguinte situação: existe um grupo de indivíduos, os quais não podem comunicar entre si; a cada um é pedido que escolha uma de dezasseis cores, acção pela qual cada um receberá um pagamento; cada participante é informado de que o pagamento respectivo será calculado multiplicando um determinado montante fixo pelo número de indivíduos que tenham escolhido a mesma cor que o participante em questão; a situação será repetida um certo número de vezes e, de cada vez, os participantes podem mudar de escolha; entre repetições, os indivíduos são informados acerca de quantos participantes escolheram cada cor e dos pagamentos originados. Normalmente, nesta situação, todos os participantes convergirão para aquela cor que, acidentalmente, mostrou de início maior frequência – e nessa escolha se manterão. Esta situação foi simulada com o AG-aprendizagem-social e deu o resultado referido: a regra “escolher a cor x” emerge e impõe-se como uma regra partilhada (convenção). A hipótese da ordem espontânea parece funcionar.



Problema de Coordenação (versão 2)


Uma nova situação experimental corresponde à situação anterior, salvo num pormenor: o pagamento a cada indivíduo deixa de depender apenas da frequência com que foi escolhida no conjunto dos participantes a cor sobre a qual recaiu a sua própria escolha – passa a ser afectado também por um índice próprio de cada cor (do género: as cores são ordenadas de 1 a 16 e, todos os outros factores permanecendo iguais, uma escolha da cor número 16 é remunerada dezasseis vezes mais do que uma escolha da cor número 1). Os participantes não conhecem os índices atribuídos às cores, nem a forma exacta como eles contribuem para o cálculo do pagamento. A convergência da totalidade das escolhas para a cor número 16 é a mais favorável a todos os participantes – mas é de esperar que isso possa não acontecer. De facto, uma certa convergência inicial, acidental, para uma qualquer cor – mesmo que seja uma das menos remuneradas – cria um atractor que vai reforçar-se com o tempo: o peso de uma escolha muito frequente aumenta a sua atractividade e desincentiva qualquer participante a mudar de opção (mesmo que conheça a função exacta que determina o pagamento, a opção isolada pela melhor opção teórica é penalizada). Este resultado é confirmado por uma nova simulação com o AG-aprendizagem-social. Este resultado mostra que a solução “espontânea” encontrada pela mera prossecução dos interesses individuais pode ser, pela própria lógica da situação, uma solução ineficiente – e, talvez pior, mesmo os indivíduos que ganhem consciência da situação nada podem fazer para a modificar, uma vez que só lhes está disponível a acção individual (caso designado por “lock in” institucional). Isto, note-se, apesar de o melhor (respectivamente, o pior) para o indivíduo, ser também o melhor (respectivamente, o pior) para o grupo.



REFERÊNCIA
(Castro Caldas 2001) CASTRO CALDAS, José Maria, Escolha e Instituições – Análise Económica e Simulação Multiagentes, Celta Editora, Oeiras, 2001





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