26.6.12

o roubo dos gravadores.


O Público noticia que o deputado socialista Ricardo Rodrigues foi condenado a 110 dias de multa de 45 euros por dia, por ter sido "considerado culpado no caso do roubo dos gravadores aos jornalistas da revista Sábado".
Acontece que Ricardo Rodrigues não foi julgado em nenhum "caso do roubo dos gravadores", apesar de os habituais contadores de estórias insistirem nessa versão. Para qualquer pessoa que tenha investido dois segundos a pensar na questão, é claro que nunca esteve em causa o roubo dos gravadores. E o deputado não foi sequer julgado por tal suposto crime. Apresentar o caso como "o roubo dos gravadores" faz parte de uma estratégia dupla: vender mais (falsa) informação e fazer mais mossa política no partido de Ricardo Rodrigues (na altura dos factos, fazer mossa ao governo Sócrates).
Ricardo Rodrigues foi julgado por atentado à liberdade de imprensa: por causa dos efeitos que, supostamente, obteve por ter levado consigo os dois gravadores. Porque com essa sua acção teria tentado impedir a publicação de declarações suas. E o deputado reagiu assim, na altura, por ter sido obrigado a voltar ao tema da acusação de pedofilia que lhe tinha sido dirigida, apesar de nada justificar o regresso a esse tema depois de ter sido ilibado. De boa-fé, a questão está em saber se um político injustamente enxovalhado - de novo - numa entrevista, tinha ou não o direito de reagir atacando os meios de trabalho dos trabalhadores da informação. O tribunal considerou agora que não.
Pode julgar-se que Ricardo Rodrigues foi tolo em ter agido daquele modo. É a minha opinião. Mas tem de compreender-se que reagiu assim por estar a ser assediado com uma velha história, uma invocação a despropósito que só podia visar sujá-lo sem justificação, diminui-lo moralmente e impedi-lo politicamente. Voltar a afirmar, num "jornal de referência", que ele foi condenado no "caso do roubo dos gravadores", quando nem sequer foi julgado por qualquer roubo de gravadores, só pode ser má-fé. E, quando está realmente em jogo uma questão relativa ao equilíbrio da liberdade de informar com outros direitos das pessoas, um jornal decente deveria ter mais cuidado na forma como apresenta o caso - até por ser, indirectamente, parte interessada.
Bem sei que vir aqui emitir opinião sobre este caso, sem aproveitar para morder as canelas de Ricardo Rodrigues, só vai atrair a raiva ou o desprezo de muitos leitores. Desde logo, os que estão sintonizados com os que bradaram, na altura, contra o "roubo". Tal como então, não me guio pela (im)popularidade esperada da minha posição. Guio-me pelo que julgo ser o meu dever de não embarcar nas evidências enganadoras das certezas propagandistas.