A dirigente do PS, Edite Estrela, escreveu uma carta aos militantes do seu partido, na qual dava razões para o empenhamento desse colectivo nas eleições presidenciais, argumentando com a forma - talvez subtil mas efectiva - como Cavaco Silva tem exercido o seu mandato em contravapor ao governo do PS (e com a esperança de que Alegre será melhor).
Cavaco Silva, o candidato instalado no palácio, levou desta vez longe demais a sua táctica de se fazer de morto: sugeriu que os ataques eram má educação e que ele, do alto da sua sabedoria, não respondia a tais vozes. Que CS insista na sua táctica de sempre, que é fazer política a fazer de conta que não é político - e acusando os outros de fazerem política - não espanta: a democracia como lugar de escolha entre visões diferentes do interesse nacional não lhe cabe na cabeça. Continua a sonhar com o consenso nacional, desde e sempre que esse consenso se faça em torno de si e dos seus.
Já que tantas outras vozes tenham caído na velha armadilha cavaquista, não percebo. Anda por aí quem aceite que o candidato CS se esconda no palácio para melhor fazer a sua campanha e que se furte ao debate, dizendo generalidades moralistas que aplica a toda a gente menos a si próprio. Quem faça por se esquecer que CS deu acampamento a verdadeiras inventonas anti-democráticas, com fontes de Belém escondidas com o rabo de fora para prejudicar o governo. E essas vozes escandalizam-se com o facto de um partido criticar o PR - embora, obviamente, não se escandalizem nada com o facto de partidos e mais meio mundo estarem na crítica permanente ao PM, que também exerce um alto cargo do Estado e nem sequer está em campanha (nem pré-campanha) eleitoral.
Isto já parece, para voltarmos à expressão, o clima de "A Bem da Nação": há uns senhores que querem ser tomados por deuses do universo nacional, querem ser dispensados do escrutínio democrático - que é muito mais do que votar -, e andam a tentar instalar (e instilar) a ideia de que haver projectos diferentes e debate é coisa má e que deve ser evitada para preservar o clima de chá das cinco que vai bem com a hipocrisia mansa e de falinhas arredondadas do actual primeiro magistrado. Que, aliás, é um homem que discursa muito bem sobre ordenhas, como se prova por aquele vídeo ali na barra lateral.