Não alinhei nas hostes dos que ficaram muito excitados com a crítica que o PR fez ao governo, em matéria decisiva neste momento: corte dos subsídios é a “violação de um princípio de equidade fiscal”; corte salarial para grupos específicos é “um imposto”. Aliás, está por ver que água traz essa declaração no bico.
Essa mensagem de Cavaco Silva, continha, contudo, outro elemento que me chamou a atenção. É que o PR, que podia ser interpretado como protagonizando assim uma quebra de solidariedade institucional, ou uma ingerência em matéria governativa, justificou a tomada de posição declarando: “Mudou o Governo, mas eu não mudei de opinião”. Haveria muito que escrutinar quanto à prática desse princípio por este presidente, mas deixemos isso e fiquemos pelo valor facial da declaração: “Mudou o Governo, mas eu não mudei de opinião”.
É que o barruço podia perfeitamente enfiar em muitas cabeças que por aí andam. Governantes que governam ao contrário do que diziam quando eram oposição. Oposições tentadas a fazer oposição com o mesmo estilo que criticaram em outros tempos. Comentadores que comentam tudo ao contrário do que comentavam há uns meses, tendo passado milagrosamente a ver regiões do ser que não suspeitavam sequer que pudessem existir. Blogues que praticam agora a má-língua e a trica que no passado detestavam. Tudo por quê? Por ter mudado o governo. O que deu azo a mudanças, não apenas de opinião, mas também de tom, de estilo, de código de conduta. O que era abjecto passou a ser virtuoso, o que era louvável passou a ser abominação.
Será que Cavaco se meteu ao caminho com aquelas declarações (“Mudou o Governo, mas eu não mudei de opinião”), não para falar de economia e finanças, que era o que parecia ser o seu assunto naquele momento, mas para lembrar que é demasiado indecente tantos intervenientes na coisa pública fazerem tanta pirueta com tanta celeridade?
(Senhor Presidente, se isto é demasiado confuso para si, peço respeitosamente desculpa.)