Cavaco Silva: "Acabaram os tempos de ilusões".
Cavaco teria sido mais honesto se tivesse reconhecido que ele foi o pai e a mãe do modelo de integração europeia que nos trouxe aqui. Depois de ter colocado em risco a assinatura do tratado de adesão, talvez querendo ser ele a assinar aquilo que Mário Soares tinha sonhado e concretizado, tornou-se o principal obreiro da estratégia de gastar as ajudas comunitárias a encanar a perna à rã. Enquanto os espanhóis reestruturavam profundamente a economia, com custos sociais (por exemplo, elevadíssimo desemprego, embora muito bem protegido) mas com ganhos enormes de efectiva modernização, nós ajudávamos os maus patrões a fazerem de conta que eram empresários, mantendo-os como um peso que nos puxa para baixo. Embora haja uma larga distribuição de responsabilidades a fazer, entre políticos de todos os quadrantes, empresas, bancos, famílias, cidadãos, o verdadeiro pai do monstro foi Cavaco, como algum seu correlegionário oportunamente lembrou. Por isso, melhor seria não ditar sermões aos outros sem assumir a sua parte da empresa. Ganharia mais autoridade - uma autoridade que, assim, não tem; uma autoridade que não ganhará a dizer umas coisas de vez em quando, e outras coisas diferentes de quando em vez. Ou já ninguém se lembra de Cavaco avisar que estávamos a atingir o limiar dos sacrifícios aceitáveis? Cabe perguntar: quantos Cavacos há? Que Cavaco foi este que discursou hoje?