Os nomes são centrais para as nossas identidades. Mesmo assim, que confusão...
Falsehoods Programmers Believe About Names.
«O tempo é um dispositivo que impede que tudo aconteça de uma vez.» (Bergson)
Ver arte é ver pelos olhos dos outros.
Fazer arte é antecipar que outros possam querer ver pelos teus olhos e, então, descobrires em ti outros olhos teus que se deixem ser olhos d'outros.
(Se todos víssemos o mesmo quando olhamos para uma cena; se fossemos como máquinas fotográficas; se fossem os nossos globos oculares a ver - não haveria arte. Poderia haver reportagem, mas não arte.)
No mesmo dia em que emprestava mais de 500 biliões de euros aos bancos europeus a 1%, Draghi garantia que o Estado Social estava morto. Isto mostra que o Estado não está a ser desmantelado nem a reduzir a sua presença na economia. A única coisa que está a acontecer é uma reconfiguração do modo como esse Estado intervém na economia, não do seu poder: em vez de um Estado que redistribui recursos e investe no futuro da sua economia, temos uma instiuição estatal europeia, o BCE, que obriga os governos a recuar nas suas funções tradicionais e a reduzir o volume de bens e serviços que disponibilizam aos seus cidadãos, ao mesmo tempo que mantém vivos os bancos que não emprestam dinheiro à economia.
Em vez de se seguirem caminhos sinuosos, vai-se diretamente ao âmago da questão: quando é que um labirinto é também uma casa? Ou talvez se deva inverter a pergunta: quando não é uma casa? Este é um dos conjuntos de ideias que a Casa dos Segredos de Ana Vidigal explora e nos leva a explorar de uma forma provocatória. Simultaneamente uma obra arquitetónica e escultural, ready made monumental e instalação, contentor e conteúdo, este trabalho foi concebido para o enorme átrio do Pavilhão Central do Instituto Superior Técnico (IST) em Lisboa. Escrevo «foi» como uma ficção criada pelos calendários da produção de catálogos: na altura em que estou a escrever este texto, a peça está ainda a ser feita e existe somente como uma série de investigações cada vez mais refinadas, propostas, fotografias e maquetas. Pergunto-me até que ponto este texto consegue acompanhar o ritmo da obra que aborda e que, por sua vez se dirige ao texto.
Do que fica dito, respigando alguns momentos da história recente do Artificial, bem como algumas das interrogações que suscita, parece ser possível que as sociedades humanas venham a convergir para sociedades artificiais. Estão em marcha as experiências e as ideias que podem fazer isso. Podemos olhar para as máquinas como agentes. Podemos atribuir às máquinas os significados que são nossos – e deixar às máquinas a sua digestão. Podemos tornar-nos peças de máquinas computadoras. A questão que falta responder é: precisamos disso? É daí que virá a nossa realização como pessoas, em sociedades mais equitativas e mais livres? O sonho de que a sociedade se organize como uma grande máquina, a ideia de que somos todos um molho de máquinas mais ou menos bem reguladas e controladas, é um sonho velho. Nestes tempos de crise, onde parece que não somos capazes de nos organizar numa comunidade política, de fazer face ao mundo como grupo civilizado, aumentam as escapatórias. Uma das recorrentes vias de escape é a ilusão de que isso se fará tecnicamente, é o velho sonho da cibernética: a sociedade é uma máquina, tratemos de organizar o respetivo controlo, deixemo-nos tratar como peças dessa grande máquina, num esquema determinista que substitui a política e a democracia pela tecnicidade.
(…)
Saber se aceitamos esse horizonte é uma escolha de navegação. Aquilo que nos interessa quando falamos de sociedades artificiais está nos humanos: que o sentido do mundo não seja completamente soprado para longe das pessoas concretas, do que elas concretamente pensam e fazem umas com as outras. As sociedades artificiais não são uma fatalidade, são uma escolha. Viver ou não viver é sobre o nosso ser biológico. Navegar, navegar para onde, é acerca de como nos projetamos no que está para lá da nossa pele, no mundo. Querer ou não querer navegar rumo a sociedades artificiais é uma das escolhas em cima da mesa hoje.
"E estas associações não se confinam ao homem; sabe-se que nos animais são também fortíssimas. Se acaso um cavalo, por exemplo, seguiu muitas vezes por um certo trâmite, ele opõe resistência a que o levem por outro. Os animais domésticos esperam comida quando vêem a pessoa que costuma dar-lha. Estas toscas expectativas de uniformidade, sabemo-lo bem, encontram-se sujeiras a decepção. O homem que regularmente alimenta o frango acaba um dia por lhe torcer o pescoço, mostrando quão útil seria ao frango o alçar-se a teorias de maior subtileza acerca das uniformidades do Universo. (...) Releva distinguir, por consequência, entre o facto de que as uniformidades passadas nos causam expectativas quanto ao futuro – e o problema de saber se há motivo razoável para atribuirmos valor às expectativas, desde o momento que se levantou a dúvida acerca da respectiva validade."
Bertrand Russel, in Os Problemas da Filosofia (1912), capítulo VI, sobre a indução
Com a criação deste portal [“Conhecer a Crise”, um portal de dados estatísticos que pretende fornecer um retrato actual e pormenorizado da realidade sócio-económica de Portugal], a fundação [Francisco Manuel dos Santos] pretende «contribuir para lutar contra alguns inimigos nossos. Um deles é o exagero, porque impede a razão. Gostaríamos de combater esta ideia de que há uma espécie de alarme público», reitera António Barreto.
«Noutros tempos já se teriam levantado súplicas ao céu a implorar a graça da chuva», mas agora, a população e os produtores agrícolas parecem acreditar mais «na previdência de Bruxelas» do que na «providência divina». «Algumas pessoas ainda falam da ajuda de São Pedro, mas parece que com pouca convicção», lamentou o prelado à agência Ecclesia. «Afinal as recomendações de Jesus no evangelho e de Nossa Senhora aos pastorinhos de Fátima, pedindo oração e sacrifícios pela conversão dos pecadores e pela paz no mundo não encontram eco nos nossos ouvidos», adianta António Vitalino, ao constatar a pouca importância dada pelos católicos à Bíblia e à Virgem Maria.
Faz hoje também um ano que Passos foi a S. Bento pela calada da noite falar com Sócrates a respeito do PEC IV. Saiu de lá com a decisão de viabilizar as medidas na defesa do interesse nacional, mas foi obrigado a mudar de opinião logo de seguida com a ameaça de ser a sua cabeça a rolar. O cocktail de “política de verdade” com “transparência com sabor a laranja” meteu Relvas a espalhar que Sócrates tinha apenas feito um lacónico telefonema para Passos e que nada tinha sido apresentado ao PSD e muito menos discutido previamente ao anúncio das medidas que se iam levar a Bruxelas para recolher aprovação europeia. Só em meados de Abril, depois do Governo ter caído e a maior operação de engano do eleitorado em Portugal estar em curso, é que Passos admitiu que o encontro aconteceu. De Sócrates, nunca se ouviu uma palavra sobre o episódio até hoje.
A escota range no moitão e a grande vela triangular sobe, debate-se, enche-se de vento. A catraia mete a borda. Uma hesitação na marcha e logo nos entranhamos na agitação infinita, na noite infinita. À luz da lanterna remexem sombras indecisas. São os homens que se deitam nos bancos ou no fundo do cavername entre os baldes, os batedores, e o grande cabo do mar de oitenta braças, que serve para largar o ancorote quando a barra se fecha à entrada. Só o arrais continua agarrado ao leme, de olhos fixos na agulha de marear. Chego-me mais para ele... Água negra, respiração negra. Um frémito de vida, uma humidade que se cola à boca e às mãos, e a escuridão, mas a escuridão como um ser imenso que não distingo e de que sinto o contacto – um fôlego cego e vivo que remexe lá ao longe, cheio de mistério, de u – u – u desordenado e que desaba em montanhas e salpicos amargos. Vem até mim. Rodeia-me. Quase lhe vejo as mãos enormes. Escuto o negrume cheio de rumores, de vozes, de sombras movediças, que se debruçam para nós como um che... che... mais alto, mais baixo, que não cessa. Um grito parece vir de muito longe, da vida monstruosa e profunda em que me entranho. Mas já me não mete medo o mar. O lampião ilumina a cara do arrais, rude e grave, serena. E a meu lado a água escorrega no costado, chape-que-chape, sempre com o mesmo ruído monótono que adormece e embala.
Raul Brandão, Os Pescadores (1923)
En aquel Imperio, el Arte de la Cartografía logró tal Perfección que el Mapa de una sola Provincia ocupaba toda una Ciudad, y el Mapa del Imperio, toda una Provincia. Con el tiempo, estos Mapas Desmesurados no satisficieron y los Colegios de Cartógrafos levantaron un Mapa del Imperio, que tenía el Tamaño del Imperio y coincidía puntualmente con él. Menos Adictas al Estudio de la Cartografía, las Generaciones Siguientes entendieron que ese dilatado Mapa era Inútil y no sin Impiedad lo entregaron a las Inclemencias del Sol y los Inviernos. En los Desiertos del Oeste perduran despedazadas Ruinas del Mapa, habitadas por Animales y por Mendigos; en todo el País no hay otra reliquia de las Disciplinas Geográficas.
Suárez Miranda: Viajes de varones prudentes,libro cuarto, cap. XLV, Lérida, 1658.