[Mário Soares avisa o PS contra a pobreza e as desigualdades ].
O trabalho do actual governo não se esgotou. Longe disso: está muito por fazer em termos de levar o país a compreender quanto rigor e esforço nos falta fazer para merecermos um futuro melhor. Mas parece claro que urge a construção de um novo horizonte: dar um sentido novo, um suplemento de alma, a esta fase de insistência no sacrifício. O PS, mas também os demais, devem começar a pensar que prioridades devem ser apontadas ao país na próxima legislatura. A actual disputa interna no PSD, saudável, deve ajudar a criar a consciência de que chegou o momento de tratar disso.
O artigo de Mário Soares é apenas mais um dos sinais de duplo aspecto que por aí têm aparecido: primeiro, alguns pensam que o mais difícil já passou e está na hora de recomeçar a redistribuir; segundo, alguns pensam que o PS promoveu uma "legislatura de direita" (a actual) e agora pode lançar-se a uma "legislatura de esquerda" (a próxima). Mas ambas as percepções estão erradas. Primeiro: nada de seguro está ainda ganho quanto à passagem do nosso país de um estado de ilusão permanente acerca das fontes da riqueza para uma compreensão de que sem esforço, mais e melhor trabalho, e mesmo algum sacrifício, nada nos cai no colo. Segundo: esta legislatura, com o seu discurso rigorista, não foi de direita; a próxima legislatura não pode ser "de esquerda" no velho sentido de replicar as soluções redistributivas distraídas da respectiva sustentabilidade.
Assim, o PS tem de facto a responsabilidade de começar a delinear uma próxima legislatura que seja realmente de esquerda mas sem as velhas ilusões: ligar, ligar sempre, nunca separar, duas faces da mesma moeda: um país a trabalhar mais e melhor, um país onde se recompense mais e melhor o trabalho e não a especulação ou a ocupação dos lugares de privilégio.
Provavelmente o artigo de Mário Soares alerta para duas coisas: é preciso pensar nas desigualdades; não é razoável voltar a tentar atacá-las com abordagens assistencialistas.