30.5.08

tapar o sol com dinheiro


[Cavaco Silva contraria Jaime Silva e defende mais apoios aos pescadores.]

Já quando era Primeiro-Ministro Cavaco Silva preferia o método de deitar dinheiro para cima dos problemas. Em vez de os resolver. Assim gastou milhões da Europa sem mudar nada de essencial no perfil de especialização da economia portuguesa. A adiar.
Agora, como Presidente da República, parece estar na mesma. E, ao mesmo tempo, continua a apreciar a demagogia (definição: dizer o que o "povo" quer ouvir, mesmo que não corresponda ao que é necessário fazer). Cavaco continua a preferir alimentar ilusões. Coloca-se, assim, objectivamente, ao lado dos que, ao mesmo tempo que em sede político-partidária bramam por mais liberalismo, em sede empresarial clamam por mais ajudas do Estado. Ambos os clamores saindo pelas mesmas bocas. São essas bocas que Cavaco alimenta.
Isso evitar-lhe ter de pensar que o mundo é mais complicado do que isso. E que o que há a mudar é muito mais fundo do que ele estaria disposto a concordar.

29.5.08

O carro a água ou as várias faces do capital


(Foto do sítio do Teatro Nacional D. Maria II)



Ontem a ida foi ao teatro. David Mamet no Teatro Nacional D. Maria II, "The Water Engine" traduzido infelizmente por "Um Conto Americano" (porque não havia de ser "o carro a água" ou "o motor a água"?), a contar como o capitalismo é mauzinho para as pessoas espertas mas isoladas: o homem, que se faz passar por engenheiro sem o ser (será por isto que escolheram a peça?!?!) inventa um motor que funciona a água que o poderia tornar rico - mas acaba desgraçado pelos maus que lhe querem roubar a ideia em vez de o ajudarem honestamente a introduzir a patente. À mistura havia de vir a crise americana dos anos 1930. E tudo junto é apresentado como um grande produção.
Desilusão. A "grande produção" equivale a muitos meios não se sabe bem (a maior parte das vezes) para quê, muitos faits divers perdidos no meio daquilo tudo - e, a maior parte do tempo, representação insuficiente para o que está em causa. Sensação geral mais próxima do espectáculo de variedades do que do teatro. Enfim, não me deu o sono, o que já não é mau.

Entretanto, se o ponto a ilustrar era (também) como o sistema capitalista afinal não é tão fair como o pintam - e não é -, posso sugerir outra coisa mais fácil de consumir, mais realista e mais verdadeira a ilustrar o ponto.

O filme TUCKER, The Man and his Dream, de Francis Ford Coppola, 1988, conta a história verdadeira de Preston Tucker, um americano que acreditava na livre iniciativa e que tentou colocar no mercado um automóvel inovador logo a seguir à Segunda Guerra Mundial. E o filme também conta como uma aliança entre os grandes fabricantes de automóveis e certos departamentos governamentais conseguiu impedir Tucker de colocar o seu automóvel maravilha à venda. Para aqueles que pensam que o mercado nasceu livre e se mantém naturalmente livre, para aqueles que gostam de ser distraídos de todo o envolvimento institucional que é necessário ao funcionamento do mercado, vale a pena ver este filme. Há um sítio dedicado a esta história: The Tucker Automobile Club of America.

política espectáculo


[Procura de diálogo à esquerda junta socialista Manuel Alegre e Bloco.]

Afirmou Alegre: "É um acto novo que pode trazer confiança e é um sinal de que há outras coisas, outros mundos, que há esquerda".
Não, Manuel Alegre. Um sinal de que há coisas novas seria que essa esquerda apresentasse propostas realistas (realizáveis) que encarassem os problemas com outros olhos. Mas isso é mais difícil do que dar espectáculo. E nisso a "esquerda" está como a "direita": é só fumaça, nada de novo. Infelizmente.
Em termos de "ser de esquerda", Sócrates não será ave de grande porte, é certo. Mas pelo menos não sabe de ideologia o suficiente para estar sempre a ler-nos os velhos manuais como se fosse o último grito da inovação. E, em tempos de tanta poeira ideológica, uma certa ignorância filosófica de Sócrates até sabe bem.

27.5.08

pensar desde já na próxima legislatura

11:57

[Mário Soares avisa o PS contra a pobreza e as desigualdades ].

O trabalho do actual governo não se esgotou. Longe disso: está muito por fazer em termos de levar o país a compreender quanto rigor e esforço nos falta fazer para merecermos um futuro melhor. Mas parece claro que urge a construção de um novo horizonte: dar um sentido novo, um suplemento de alma, a esta fase de insistência no sacrifício. O PS, mas também os demais, devem começar a pensar que prioridades devem ser apontadas ao país na próxima legislatura. A actual disputa interna no PSD, saudável, deve ajudar a criar a consciência de que chegou o momento de tratar disso.
O artigo de Mário Soares é apenas mais um dos sinais de duplo aspecto que por aí têm aparecido: primeiro, alguns pensam que o mais difícil já passou e está na hora de recomeçar a redistribuir; segundo, alguns pensam que o PS promoveu uma "legislatura de direita" (a actual) e agora pode lançar-se a uma "legislatura de esquerda" (a próxima). Mas ambas as percepções estão erradas. Primeiro: nada de seguro está ainda ganho quanto à passagem do nosso país de um estado de ilusão permanente acerca das fontes da riqueza para uma compreensão de que sem esforço, mais e melhor trabalho, e mesmo algum sacrifício, nada nos cai no colo. Segundo: esta legislatura, com o seu discurso rigorista, não foi de direita; a próxima legislatura não pode ser "de esquerda" no velho sentido de replicar as soluções redistributivas distraídas da respectiva sustentabilidade.
Assim, o PS tem de facto a responsabilidade de começar a delinear uma próxima legislatura que seja realmente de esquerda mas sem as velhas ilusões: ligar, ligar sempre, nunca separar, duas faces da mesma moeda: um país a trabalhar mais e melhor, um país onde se recompense mais e melhor o trabalho e não a especulação ou a ocupação dos lugares de privilégio.
Provavelmente o artigo de Mário Soares alerta para duas coisas: é preciso pensar nas desigualdades; não é razoável voltar a tentar atacá-las com abordagens assistencialistas.

26.5.08

"Como as células constroem um corpo sem terem um plano"


A quarta conferência do Ciclo "Das Sociedades Humanas às Sociedades Artificiais" terá lugar nesta quarta-feira, 28 de Maio, pelas 17:30. Intitulada "Como as células constroem um corpo sem terem um plano", será proferida pelo Professor Jorge Carneiro, do Instituto Gulbenkian de Ciência / Laboratório Associado de Oeiras.

A conferência terá lugar no Anfiteatro do Complexo Interdisciplinar, Instituto Superior Técnico (campus da Alameda). Mais informação sobre localização aqui.

Mais informações sobre esta conferência, incluindo um resumo alargado da mesma, aqui .


Enquadramento desta conferência na temática do Ciclo



O ciclo de conferências “Das Sociedades Humanas às Sociedades Artificiais” foi concebido como iniciativa de apoio aos projectos de Robótica Colectiva em desenvolvimento no Instituto de Sistemas e Robótica (pólo do Instituto Superior Técnico). A robótica colectiva investiga as formas de estruturar múltiplos robots num mesmo cenário e de os controlar em vista à concretização de uma dada tarefa. Desse modo, além de participar num tipo de investigação que aceita o lugar do corpo na inteligência, contribui para ultrapassar o paradigma da inteligência como fenómeno puramente individual e para começar a pensar a inteligência como inteligência da relação em colectivos de alguma complexidade.

Dois tipos de inspiração têm concorrido para iluminar os modelos de fenómenos colectivos empregues pela robótica: a inspiração biológica e a inspiração nas ciências da sociedade. Contributos anteriores neste Ciclo de Conferências ajudaram a colocar em perspectiva certas transferências conceptuais que vão das ciências da sociedade dos humanos para a investigação com “sociedades artificiais”. A presente conferência ilustrará uma das linhas de inspiração que mais força têm tido na robótica colectiva: como é que fenómenos biológicos podem ser encarados como exemplos bem sucedidos de um grande número de entidades cuja acção coordenada resulta na consecução de alguma tarefa complexa que não estaria ao alcance dessas mesmas entidades se elas agissem isoladamente ou de forma não conjugada. Para aí aponta o título da quarta conferência do Ciclo: “como as células constroem um corpo sem terem um plano”. Este ponto de vista, pela sua riqueza, abre para várias outras linhas de interrogação, nomeadamente: até que ponto serão os “colectivos biológicos” comparáveis a sociedades de indivíduos “sofisticados” como os humanos? O que os torna comparáveis e o que os torna distinguíveis quando se trata de os explicar ou quando de trata de os considerar como modelos para colectivos artificiais?

[Clicar aqui para aceder a um resumo alargado da conferência preparado pelo Professor Jorge Carneiro.]

[Clicar aqui para aceder a nota biográfica do conferencista.]

[Clicar aqui para aceder a nota biográfica do comentador.]

24.5.08

é urgente qualificar os partidos

12:09

A propósito do Debate com os quatro candidatos à liderança social-democrata, ontem na TVI, e da pobreza de ideias que por lá campeou, repito o que escrevi antes: é urgente qualificar os partidos.


James Christensen, The Listener


A vida política portuguesa, como a de muitas outras democracias representativas, funciona mas tem debilidades estruturais sérias. Em minha opinião, essas debilidades estruturais explicam-se por um traço comum a muitos outros domínios da vida pública naciona: as instituições são fracas.


O que quero dizer com isto é que há, por todo o lado na nossa vida pública, instituições que deveriam cumprir certos e determinados papéis mas não têm os meios necessários, ou estão mal organizadas para o que deveriam, ou passam o tempo a cumprir tarefas menores em lugar de se concentrarem na sua missão central.

Um exemplo: quando um professor universitário passa grande parte dos seus dias em tarefas burocrático-organizativas, porque elas são necessárias às suas iniciativas fora-da-rotina e não há ninguém que as possa executar com fiabilidade, está a gastar tempo pago a "x à peça" numa tarefa que devia ser executada por alguém pago a "x/3 à peça". Esse é um sinal, mesquinho mas muito concreto, de fraqueza das instituições. Como demasiados polícias a preencher papéis. Ou autoridades inspectivas a fazer cumprir regulamentações obsoletas ou descabelhadas, que deveriam ser poupadas a montante por boa legislação em vez de legislação "por atacado".


Ora, a debilidade das instituições, sinal de um sociedade mal organizada, neste caso acompanhada por um Estado fraco que parece que ninguém quer que funcione, essa debilidade das instituições é muito visível também nos partidos políticos.


Só isto: para um partido fazer boa oposição, responsável e sã para o país, precisa de boa informação. Para poder concentrar-se nos assuntos importantes, em vez de se entreter com tolices baratas que chamam a atenção da comunicação social mas nada interessam ao futuro. Para um partido fazer boas propostas, tem de ter quem estude alternativas, quem alimente o debate, quem analise. Para um partido poder fazer promessas realistas em campanha eleitoral, e poder depois cumprir essas promessas sem prejudicar o país, precisa de meios para se preparar, para consultar os melhores, para estar informado do que se passa cá e do que se passa no mundo. E os partidos não devem estar dependentes dos seus amigos espalhados na administração para aceder a essa informação e a esses estudos. Mas, em Portugal, esse exercício é muito débil, inexistente quase.


Assim, se é preciso investir na qualidade da democracia portuguesa, é preciso investir na qualidade dos partidos como instituições capazes de criar alternativas de governação. A minha proposta é simples - e nem sequer é original (imita o modelo alemão). O Estado deve financiar, fortemente e sem dependência de calendários eleitorais, a criação e manutenção de um conjunto de fundações. Essas fundações teriam obrigatoriamente como objecto o estudo dos temas de política geral e das principais políticas públicas pertinentes para a governação. Seria apoiada uma fundação ligada a cada uma das principais correntes de opinião partidária representativas em Portugal (PS, PSD, PCP, CDS, BE). O partido do governo (no momento) teria também a sua, para não depender da espreitadela aos dossiers governamentais para se ilustrar. E todos os partidos da oposição teriam os meios para falar melhor, com mais credibilidade, dos verdadeiros problemas. Quanto mais não seja para não terem de "inventar" temas de oposição.


Aos muitos que clamariam contra "mais dinheiro para os partidos", nem chego a tentar responder. Não percebem o preço da barbárie.


23.5.08

somos todos prisioneiros


PS desdramatiza divulgação de voos que passaram por Portugal de e para Guantánamo .

Sempre pensei que uma das coisas que distinguia (na prática, não necessariamente em teoria) a direita da esquerda era a "razão de Estado": a direita mais disposta a opô-la aos direitos individuais, a esquerda mais "idealista" e menos atreita a fechar os olhos. Se, como parece, este governo e o PS se tornaram demasiado crédulos na "razão de Estado", e se isso ainda por cima implicar conivências com ilegalidades, temos um problema. Apesar de "o povo" não comer desses assuntos (fui hoje ao cabeleireiro à hora dos telejornais e ouvi os comentários), isso afecta - ou deveria afectar - este governo e o PS. Ou não?

21.5.08

os excessos do fisco e a alma nacional


[Fisco coloca à venda prédios por dívida de 236 euros.]

Como é que se passa de uma cultura dominante de laxismo para uma cultura de rigor?
Não duvido de que o nosso país reage mal à mínima ideia de ordem como respeito pelas regras estabelecidas. O país prefere ter leis e ignorar que elas existem e ignorar o desrespeito por elas. E isso tem de ser mudado e em alguns aspectos está a ser mudado. Mas será necessário passar às acções ridículas, como a descrita na notícia, para fazer isso? É que eu até concordo que, como não vamos lá por respeito intrínseco pelos outros, temos de ir lá constrangidos. Provocar o receio das consequências de prevaricar é uma das ferramentas da criação de uma ordem comum benéfica para todos. A impunidade tem de desaparecer. Mas, pergunto-me, tomar acções ridículas nesse percurso não prejudicará o próprio objectivo?

estado actual da corrida da senhora Clinton

20.5.08

The Trap: What Happened to Our Dream of Freedom, Episódio 1



The Trap: What Happened to Our Dream of Freedom é um documentário de Adam Curtis que passou pela primeira vez na BBC em Março de 2007. O documentário faz uma viagem por algumas ideias "bizarras" (embora muito "científicas") que estão presentes em ferramentas muito aceites como úteis para pensar a sociedade dos humanos. Trata-se, por exemplo, de reflectir sobre a "teoria dos jogos" como modelo da natureza humana em sociedade.
O documentário passou em três sessões de cerca de 60 minutos cada. Vamos aqui colocar, um de cada vez, esses três episódios (cada um dividido em 6 peças de cerca de 10 minutos cada). A publicação de cada episódio incluirá uma "introdução" ao mesmo, editada a partir daqui.

Vamos fazer isto espaçadamente, porque sabemos que os nossos leitores têm mais que fazer do que passar horas frente a este blogue - mas vale a pena, com calma, ir vendo este programa.


Primeiro episódio: "Fuck You Buddy"



Neste episódio é analisado o aparecimento da Teoria dos Jogos durante a Guerra Fria e a maneira como os seus modelos matemáticos do comportamento humano se infiltraram no pensamento económico. O programa traça a evolução da Teoria dos Jogos, com especial referência para o trabalho de John Nash, que acreditava que todos os seres humanos são criaturas egoístas e desconfiadas que se comportam constantemente de forma estratégica em relação aos outros. Nash, Nobel da Economia, inventou “jogos” baseados nas suas crenças sobre o comportamento humano, incluindo um chamado "So Long Sucker – Fuck You Buddy”, em que a única maneira de ganhar era traindo o seu parceiro de jogo (sendo daí que vem o título do episódio.

O que não era conhecida à época era que Nash sofria de esquizofrenia paranóide, sendo profundamente desconfiado de todos os que o rodeavam e estando convencido de que muitos estavam envolvidos em conspirações contra ele. Foi essa crença errada acerca das pessoas em geral que forneceu a base para as suas teorias.

O episódio analisa o modo como a Teoria dos Jogos foi utilizada para conceber a estratégia nuclear americana durante a Guerra Fria. É examinada a ideia de que o holocausto nuclear foi evitado pela existência do enorme arsenal nuclear americano (dissuasão).

Outra vertente deste episódio assenta numa entrevista com R.D. Laing, psiquiatra que modelou interacções familiares utilizando a Teoria dos Jogos. A sua conclusão foi que os seres humanos são intrinsecamente egoístas e astutos e estão sempre espontaneamente a gerar estratagemas nas interacções diárias. As teorias de Laing evoluíram para a ideia de que algumas formas de doença mental são meramente artificiais, etiquetas utilizadas pelo Estado para reprimir o sofrimento individual. Esta convicção tornou-se um item da contracultura durante a década de 1960. É feita referência à experiência Rosenhan, na qual falsos doentes se apresentavam numa série de instituições psiquiátricas americanas, tendo-lhes sido erroneamente diagnosticados transtornos mentais - enquanto instituições informadas que estavam a receber falsos doentes "identificaram" inúmeros supostos impostores que eram realmente verdadeiros doentes. Os resultados da experiência foram um desastre para a psiquiatria americana, porque destruíram a ideia dos psiquiatras como uma elite capaz de diagnosticar e tratar doenças mentais.

Todas estas teorias foram vistas como apoiando a crença de economistas, como Friedrich von Hayek, cujos modelos económicos não deixam nenhuma margem para o altruísmo e assentam exclusivamente no interesse próprio, um movimento que levou à formação da teoria da escolha pública. Numa entrevista, o economista James M. Buchanan procura desacreditar a noção de "interesse público", considerando que o “interesse público” não passa de um disfarce para o mero interesse próprio dos burocratas. Buchanan propõe também que as organizações devem empregar gestores que estejam motivados apenas por dinheiro. Ele descreve aqueles que são motivadas por outros factores, tais como a satisfação profissional ou um sentido do dever público, como "zelotes".

Da década de 1960 para a de 1970, as teorias da Laing e os modelos de Nash começam a convergir, produzindo teorias de que o Estado é simplesmente um mecanismo de controlo social que mantido de forma calculista fora do alcance das mãos do povo. O episódio mostra como estas teorias abriram caminho a teorias de desmantelamento do Estado como as seguidas por Margaret Thatcher.

O episódio sugerindo que esta sociedade, concebida segundo modelos matemáticos e de acordo com a crença no egoísmo humano, criou uma "jaula" para os seres humanos ocidentais. A natureza dessa "jaula" fica para o próximo episódio.





The Trap #1 - F&#k You Buddy (part 1 of 6)





The Trap #1 - F&#k You Buddy (part 2 of 6)





The Trap #1 - F&#k You Buddy (part 3 of 6)





The Trap #1 - F&#k You Buddy (part 4 of 6)





The Trap #1 - F&#k You Buddy (part 5 of 6)





The Trap #1 - F&#k You Buddy (part 6 of 6)




15.5.08

o Pulo do Lobo aeronáutico


Cavaco Silva diz que não fuma e que nunca viu fumar nos seus voos.

Já uma vez Cavaco Silva explicou, com um sorrisinho maroto, a sua hipocrisia do Pulo do Lobo. A reportagem dessa explicação às televisões devia passar mais vezes para os portugueses se lembrarem quem é o seu Presidente que gosta de fazer de conta que não é político. Agora, Cavaco não viu fumar. Os aviões em que viaja devem ter uma delegação especial do Pulo do Lobo.
É, aliás, uma continuação digna da telenovela do fumo de Sócrates no avião. Para os meus amigos que me lêem, e que têm uma concepção de "ética republicana" que a mim me dá vontade de rir, sempre direi para não me acusarem de me calar: um país que se dedica a isso, com "jornais de referência" a fazerem com isso manchetes, é um país de tolos. E confundir isso com a putativa "sanha da ASAE" é puro delírio. E Sócrates responder dizendo que vai deixar de fumar é ainda mais tolo. Se o apanharem a "coisar" em algum lado, o que irá ele prometer?

(O que me vale é que, andando por aqui esta semana, não tenho tindo disponibilidade para pensar nestas delícias da nossa terra.)

12.5.08

Mundos paralelos


Mão amiga fez-me chegar a seguinte crónica de Manuel António Pina no "Jornal de Notícias":

«Oiço na SIC a notícia de que Margarida Vila Nova está grávida e pergunto a mim mesmo "Quem é Margarida Vila Nova?". Depois, aparece no ecrã a capa da revista "Caras" com uma foto de página inteira da tal Margarida e a informação que ela e mais não sei quem pensam casar-se em Setembro e a minha inquietação redobra: nunca vi aquela cabeça naquele ou noutro corpo. Por sua vez, no "Correio da Manhã" leio que Sílvia Rizzo (quem será Sílvia Rizzo?) entrou na Redacção de "uma publicação" acompanhada de Rita Salema (e Rita Salema, quem será?), atirou com o telemóvel a um jornalista e empurrou uma mesa da sala de reuniões por causa de uma notícia qualquer sobre a custódia dos filhos, e começo a suspeitar que não tenho andado por aqui e que existe algures, no meu tempo e no meu espaço, um universo paralelo não comunicante, do tipo dos teorizados por Everett e por DeWitt, que me escapa absolutamente. A hipótese de um mundo ou de um estado quântico alienígena à minha volta, povoado de fantasmas caóticos e de existências em holomovimento, é assustadora. O problema não é esse mundo outro ser ou não real, porque, pelos vistos, é (basta ler alguns jornais e ver televisão), o problema é que pode muito bem acontecer (já admito tudo) que eu é que não seja real.»

A essa mão amiga respondo:

"Mundos paralelos" sempre houve, aqui e em qualquer lugar, em todo o tempo.
Quando eu era criança, de certeza que havia coisas em tua casa que eu nem sequer sabia que existiam. Há milhões de crianças no mundo que não sabem o que é ver e ouvir uma sinfonia do Mahler dirigida pelo Bernstein. E outras não sabem o que é um gelado Hagan Daz, de que eu tanto gosto. E muitos nunca lerem, e se lessem não gostariam, O Jogo das Contas de Vidro. E, felizmente, eu nunca passei e espero nunca passar por coisas que passam pessoas aqui perto de nós (por exemplo, as putas da esquina de minha casa). Há, e sempre houve, muitos mundos paralelos. E depois? A melancolia metafísica de Manuel António Pina, com a qual simpatizo, não devia espantá-lo: esses mundos paralelos que tanto o assombram são o que está ao alcance de quem não tem os olhos, os ouvidos e a educação dele. Só isso.

11.5.08

Palavras



34 segundos de uma vídeo projecção criada por computador, da autoria de Charles Sandison, na exposição A Consistência dos Sonhos, sobre José Saramago, no Palácio da Ajuda.

9.5.08

2008, Ano Europeu do Diálogo Intercultural

09:06



O Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia, por proposta da Comissão Europeia, estabeleceram 2008 como o Ano Europeu do Diálogo Intercultural (AEDI).

Um lema representa bem, quer a própria UE, quer o AEDI: "Juntos na Diversidade" ou "Unidos na Diversidade". É que a própria UE é um mosaico de diferentes culturas, línguas, tradições, sistemas jurídicos - mas continua a tentar construir uma forma relativamente original de convivência num espaço onde coexistem uns 500 milhões de cidadãos. E, por isso, não nos é estranho que a UE seja, além disso, um espaço de cruzamentos de pessoas que vêm de outras partes do mundo. Uma parte das ferramentas que precisamos para lidar com a diversidade cultural que nos vem de fora é constituída por ferramentas que também precisamos para lidar com a diversidade que temos cá dentro.

O caso é que a forma de lidar com esta diversidade não é principalmente uma questão teórica no panteão dos temas esotéricos que tantas vezes povoam o "discurso europeu". Ela tem implicações práticas para milhões de pessoas. Basta pensarmos na concretude da vida de muitos milhões de migrantes. E, por esse lado, alguns dos tópicos que estão em consideração neste Ano são de relevância concreta: minorias, multilinguismo, religião, educação, trabalho.

Mas convém que, quanto ao diálogo intercultural, não renunciemos a enunciar claramente alguns princípios inalienáveis. Por exemplo, que a diversidade não pode ser justificação para o relativismo. A UE assenta em "valores comuns" e não no relativismo. E essa ideia de uma comunidade de valores até deu origem a um conceito vagamente jurídico, ou político-jurídico, muitas vezes invocado quando as negociações legislativas a nível comunitário chegam às grandes encruzilhadas: o das "tradições constitucionais comuns" dos Estados Membros. Nem sempre se consegue apurar de forma simples e directa quais são as fronteiras dessas "tradições constitucionais comuns", mas o princípio importa à ideia de que os valores comuns não estão à venda a troca de qualquer facilitismo relativista.

Contudo, e por outro lado, se os valores comuns fundam uma certa identidade a que não podemos renunciar, não podemos fazer da identidade uma arma de guerra. Apesar de o passado nos constituir sempre, até certo ponto, no que somos e não sabemos deixar de ser, acredito menos na identidade virada para o passado do que na identidade virada para o futuro, construída no desejo de construir um destino comum. Mas, mesmo assim, e isso define um princípio de abertura, porque nós também somos capazes de mudar e de acolher no outro valores que não eram nossos no passado, o que nos deve guiar é a vontade de um destino comum com os outros humanos que vivem no mesmo espaço que nós.

É preciso, mesmo assim, não nos deixarmos enredar nas armadilhas dos falsos profetas da tolerância. Devemos ser tolerantes com certas opções diferentes das nossas, mas devemos ser firmementes intolerantes com outras opções que são radicalmente estranhas a valores constitutivos da nossa forma de estar no mundo. Algumas pessoas vêm das suas terras distantes até à Europa também para poderem usufruir dos nossos valores e se protegerem dos valores das suas comunidades de origem. E não podemos defraudar essas pessoas com uma "tolerância" deslocada. A Europa dos Direitos Humanos não pode renunciar a eles em nome de qualquer tolerância relativista.

A Europa não é vítima do mundo. Alguns por vezes falam como se o diálogo intercultural fosse uma resposta a um problema importado. E esses apontam o dedo, por exemplo, aos imigrantes. Mas estão errados. A Europa tem uma história carregada de intolerância. Por exemplo, cristãos contra judeus. Ou, entre cristãos, católicos e protestante opondo-se uns aos outros. Por isso, não é "por causa dos outros" que este assunto é importante para os europeus. Ele é importante para nós por causa dos nossos próprios fantasmas - e das realidades presentes que podem ressuscitar tais fantasmas.

(Este apontamento serve de comemoração do Dia da Europa, neste 9 de Maio. E vem a propósito da minha participação, ao lado da Alta Comissária para a Imigração e o Diálogo Intercultural, Dra. Rosário Farmhouse, e do Embaixador de Cabo Verde, Dr. Arnaldo Andrade Ramos, num colóquio organizado pela Câmara Municipal da Amadora no âmbito de uma série de iniciativas da Semana da Europa nesse Município.)


[Promulgação do Tratado de Lisboa por Cavaco Silva marca Dia da Europa]

8.5.08

eu estou n' A Missão


Estas coisas acontecem. Entrei numa "espécie de concurso de fotografia" promovido pela Canon.
Participo com uma foto, na categoria Macro, intitulada "estavas despindo o vestido que levaste à festa".
A dita cuja pode ser visualizada aqui .

Se, além de verem a foto, gostarem dela o suficiente para lhe darem um voto, sintam-se à vontade para o efeito. Para isso, terão de registar-se: mas não dói nada e é rápido. E permite votar na minha foto ou em qualquer outra que vos agrade mais !

Se acharem francamente má a foto, não digam nada a ninguém... Mas, se entenderem que vale a pena vê-la, sempre podem fazer saber tal coisa.

7.5.08

por Don Carlos, Infante de Espanha, voltar à Cornucópia




Entre dois espectáculos de Pina Bausch, entre Nefés e Masurca Fogo, saltando Café Müller, voltamos ao terreno em que verdadeiramente nos sentimos. Ao teatro. Especificamente, ao Teatro da Cornucópia. Como todos os meus amigos sabem (quem não sabe isso de mim, não me conhece realmente), a companhia em que pontifica Luis Miguel Cintra preenche, sem os perigos das revoluções que também dela se alimentam, a minha fome de metafísica.

Desta vez é Don Carlos, Infante de Espanha, de Friedrich Schiller (1759-1805), tra(du)zido directamente do alemão e poeticamente recriado por Frederico Lourenço, que nos é dado ver. A história (pouco preocupada com a exactidão histórica) de um rei que é o imperador do mundo (dos juntos impérios de Portugal e de Espanha), mas que é servo do seu séquito: do seu séquito de ministros e outros ajudantes de governar, e do seu séquito de inclinações pessoais.
Não costumo aqui fazer grandes apreciações aos espectáculos da Cornucópia, até porque fico sempre um pouco cego e embotado no espírito crítico quando lá vou, tamanho é o gozo que lá me permito. Mas sempre direi que, desta feita, até actores ou actrizes que às vezes me parecem menos densos(as) a interpretar, me surgem capazes de um sopro que nos faz crer que são verdadeiramente as suas personagens. Por outro lado, apreciando habitualmente as encenações que lá nos propõem, noto desta vez um uso mais refinado, e mais poderoso, do silêncio em cena. Há um ou dois momentos em que se prepara, e depois se serve fervente, um silêncio de cortar a noite naquela sala despida e tão cheia.

Escreve Cintra na introdução ao programa, comparando outros tempos (os da peça) com os nossos tempos: "Este teatro tem outra grandeza e inventa almas. Sem mesquinhez. Almas grandes como nunca vimos mas queríamos ser. Fala-se do bem e do mal. Nós já só conhecemos a indiferença mascarada de tolerância." (ênfase nosso.)

Indispensável.


4.5.08

"Ontologia e Epistemologia. Pensar o Realismo"


A terceira conferência do Ciclo "Das Sociedades Humanas às Sociedades Artificiais" terá lugar amanhã, segunda-feira, 5 de Maio, pelas 17:30. Intitulada "Ontologia e Epistemologia. Pensar o Realismo", será proferida por João Paulo Monteiro, Professor Catedrático Aposentado da Universidade de S. Paulo. Actualmente investigador do Instituto de Filosofia da Linguagem (Universidade Nova de Lisboa), foi Professor Catedrático Convidado da Universidade de Lisboa.

A conferência terá lugar no Anfiteatro do Complexo Interdisciplinar, Instituto Superior Técnico (campus da Alameda). Mais informação sobre localização aqui.

Mais informações sobre esta conferência, incluindo uma antevisão do conteúdo, aqui .


Enquadramento da conferência
"Ontologia e Epistemologia. Pensar o Realismo"



Porque é que a reflexão filosófica em questões de ontologia e de epistemologia pode interessar às ciências da computação e, também, aos engenheiros que trabalham com robots e "sociedades artificiais"? Porque é que esta conferência pode ser um exercício de diálogo entre filosofia e engenharia?

O projecto de sistemas computacionais envolve um domínio de problemas designado por “ontologia”, respeitante à estrutura representacional do sistema, incluindo questões como: que entidades são representadas, que relações existem entre elas, como é que elas apontam para o mundo dos utilizadores. Por exemplo, na fase de projecto de um software de gestão do sistema de reservas de um hotel, os informáticos e a direcção do hotel poderão discutir as consequências de fazer com que uma reserva seja considerada uma característica de um quarto, de um dia ou de uma pessoa. Esta actividade de “projectar uma ontologia” para um sistema computacional traduz certos “compromissos ontológicos” por parte do projectista – os quais, mais tarde, podem revelar-se diferentes ou mesmo conflituais com as expectativas do utilizador.

A questão da ontologia – “o que existe” – pode ser relacionada com a questão da epistemologia: “o que sabemos” ou “o que podemos saber”. E, aí, mais uma vez, a questão pode interessar ao projectista de sistemas computacionais. Por exemplo, nesta forma: o que supomos que o utilizador sabe “do que existe” para o sistema quando interage com ele? Se uma loja de livros on-line assumir que um cliente “sabe o que quer” quando vai fazer compras, não se esforçará por promover títulos específicos a clientes específicos. Contudo, sabemos que há sofisticados sistemas de “recomendação” que, com base no histórico de interesses de um indivíduo e na sua relação com certos perfis, dirigem a atenção do cliente para títulos que, de outro modo, lhe passariam despercebidos. Quer dizer, o “conhecimento do utilizador” não se pressupõe completo: procura-se orientar a sua construção.

As questões da ontologia e da epistemologia são também questões clássicas da filosofia. Esta conferência – filosófica – entra neste Ciclo como elemento de um diálogo acerca destas questões. Quando andamos a tentar implementar colectivos robóticos – e por vezes até nos permitimos pensar neles como formas de “sociedades artificiais” - será que podemos colocar-nos na “perspectiva do olho de Deus”, assumindo que conhecemos completamente o que existe no “mundo” desses colectivos robóticos? E, do mesmo passo, podemos assumir que compreendemos o que cada robot “pode saber” acerca do seu “mundo”? Ou teremos, em alternativa, de nos conformar com uma perspectiva relativista acerca do “mundo” e do “conhecimento” dos robots? Poderá ser o caso que existam coisas no mundo dos robots que não existem no nosso?

Esta conferência, sem pretender resolver estes problemas, constituirá uma oportunidade para introduzir elementos de reflexão vindos da filosofia num leque de questões que interessam aos que participam no design ou na reflexão acerca de “mundos”, “agentes” e “sociedades” artificiais.