1. Paulo Portas morreu. Quer dizer: meteu-se dentro do esquife e lá esperará pelo fim dos seus dias. Sim, porque os partidos mais pequenos só servem para alguma coisa se forem de confiança. (Era bom que os "grandes" também fossem de confiança, mas em política o tamanho conta.) E Paulo Portas, com ou sem razão nas guerras que travou, deixou de ser um parceiro de confiança para o PSD. No imediato, pagou a Passos Coelho na mesma moeda: desconsideração leva como troco desconsideração. Talvez Portas pense que "outro PSD" até lhe agradeça ter despachado o incompetente PPC, mas engana-se: qualquer PSD, de futuro, pensará duas vezes antes de se colocar na mão de Paulo Portas.
2. Passos Coelho chegou a este ponto porque, além de ser incompetente, é um enorme mentiroso. Ganhou as eleições a dizer às pessoas que não eram precisos sacrifícios, já que as dificuldades se deviam à má governação de Sócrates. Começou aí a alienar a genuína confiança que as pessoas precisam de ter nos governantes - e minou as condições para pactuar com os outros partidos as melhores escolhas em momentos difíceis, quando ignorava olimpicamente todas as opiniões diferentes da de Gaspar. Até Seguro, que chegou com vontade de ser manso com o governo da direita, por causa da sua estratégia de distanciamento de Sócrates, tanto pontapé levou do governo que acabou por ter de se afastar da sua preferida afabilidade. Esta crise política não é sequer culpa da oposição, nem mesmo, lamento dizê-lo, da luta popular: é culpa do autismo (que me perdoem os autistas) e da impreparação de PPC.
3. No meio disto tudo, e quanto ao essencial, a esquerda continua a ver passar os navios. Como já aqui escrevi muitas vezes, o PS tem muitas ideias, provavelmente até muito boas, mas ainda não se percebeu qual é "a sua ideia" para o país. E isso nota-se. A esquerda da esquerda dá poucos sinais de perceber que o maximalismo não leva a lado nenhum e, provavelmente, não aprendeu nada com a estratégia pela qual levou Passos Coelho às cavalitas ao palácio de S. Bento. Se o PS, assustado com isso, se virar para o CDS, vai pagar um preço assustador, porque precisamos de encontrar um caminho que substitua o afrontamento pelo diálogo social e deixar a esquerda de fora é tornar isso ainda mais difícil.
4. Precisamos de gigantes no governo, anões não servem. E gigantes com apostas claras, capazes de um contrato de verdade e justiça com o povo. Verdade e justiça. Afinal, dar resposta a um problema que se encontra equacionado numa frase que está em exposição permanente no meu blogue há bastante tempo: «O atraso de Portugal é grande. A economia é deficitária. Mesmo que se eliminassem todos os lucros da grande burguesia e se procedesse a uma melhor distribuição da riqueza, o produto nacional não asseguraria, ao nível actual, a acumulação necessária para um desenvolvimento rápido e uma vida desafogada para todos os portugueses. Para o melhoramento das condições de vida gerais será necessário aumentar a produção em ritmo acelerado. E isso obrigará não só a investir como a trabalhar mais e melhor.» São palavras de Álvaro Cunhal, em discurso ao VII Congresso do PCP, em Outubro de 1974.