Senhor Secretário de Estado,
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista requereu a audição do Governo a propósito dos
resultados da matemática no TIMSS 2019.
Que fique claro: o que nos importa são as aprendizagens. Que
mais alunos aprendam mais e aprendam melhor, não só matemática, mas também
matemática.
Cientes de que o ensino da matemática não se destina
principalmente a aumentar o número de catedráticos nessa disciplina ou o número
de sócios de uma qualquer sociedade científica, mas a fazer com que todos os
alunos fiquem de posse de mais conhecimentos e mais competências
transversalmente necessárias a muitas áreas do saber, a desempenhos
profissionais qualificados e a uma vida cidadã plena.
Portugal participou pela primeira vez no TIMSS em 1995. Nesse
ano, os resultados dos nossos alunos de 4º ano a matemática foram dos piores a
nível internacional. Tivemos o pior resultado dos países europeus.
Voltámos a participar em 2011. Nesse ano, os alunos do mesmo
nível ficaram claramente acima da linha de água. Passámos para o lado positivo
da tabela. Uma subida de 90 pontos.
Isto é: entre o último dos 10 anos de governo de Cavaco Silva
e o último ano de governo de José Sócrates, com os governos de António Guterres
pelo meio, uma subida de 90 pontos, que é uma subida praticamente sem paralelo
entre todos os países participantes em qualquer das edições do estudo.
E isto não aconteceu por acaso, aconteceu porque houve aí um
grande investimento, designadamente com o Plano de Ação para a Matemática –
Plano que teve avaliação, mas nunca publicada porque o Ministro Nuno Crato a
escondeu (há quem, afinal, goste pouco de avaliação).
Se nos focarmos realmente nas aprendizagens, é isto que precisamos:
sólidos passos em frente. Comparada com aquele salto de 90 pontos, a variação no
TIMMS entre 2011 e 2015, ou entre 2015 e 2019, corresponde, numa escala de 0 a
20, a meras 18 ou 14 centésimas. Precisamos de mais ambição do que isto.
E precisamos de nos focar na equidade. Há aspetos destes
estudos que são cruciais: a diferença que faz ter ou não ter educação
pré-escolar; a importância do foco na promoção do sucesso; os recursos
disponíveis, ou não, em casa. A desigualdade persistente entre rapazes e
raparigas. O facto de a escola não conseguir travar a reprodução das
desigualdades sociais. Os professores, a formação e as condições de trabalho
que eles precisam para levar a carta a Garcia. Disto não falam os ex-governantes
que enchem a boca com facilitismo e exames, mas estas são as questões cruciais
da escola pública quando trabalhamos por uma sociedade decente.
Face a isto, é difícil saber se a estafada demagogia em torno
destas questões se deve mais a ignorância ou a má-fé.
Sim, os alunos que participaram neste estudo foram abrangidos
pelo fim dos exames do 4º ano – mas o grande avanço na aprendizagem da
matemática, entre 1995 e 2011, não deveu nada a exames, que não existiam.
Além disso, os exames de 4º ano são uma raridade nos países
civilizados, e no quadro do TIMMS não há qualquer correlação entre bons
resultados e a existência destes exames.
Também há quem diga que os resultados do TIMSS 2019 são
efeito da autonomia e flexibilidade curricular. É mentira, porque essa
legislação, pelo escalonamento da sua aplicação, não abrangeu estes alunos. E
nunca ouvi ninguém queixar-se de que a mesma flexibilidade prejudicasse
pedagogicamente as escolas particulares e cooperativas, onde essa liberdade
organizativa já existia.
Senhor Secretário de Estado, neste contexto, a nossa questão
é relativamente simples de formular. Sabemos que o Governo tem vindo a
trabalhar, desde 2016, na renovação do ensino da matemática. Saudamos a prudência, ponderação, e envolvimento de muitas
pessoas e instituições, com que esse
trabalho tem vindo a ser realizado – tudo o contrário do que fez Nuno Crato,
que, num ápice, extinguiu disciplinas, modificou programas sem respeitar o
prazo legal da sua vigência, mudou metas de aprendizagem definidas apenas 2
anos antes, deitou fora as provas de aferição, mexeu em tudo e mais alguma
coisa sem avaliação independente, sem estudos e sem diálogo, como se o Ministro
se considerasse o próprio Rei Sol da 5 de outubro.
A questão é, pois: a bem do ensino e
da aprendizagem da matemática, o que podemos contar em termos de resultados de
todo o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido com tanta abrangência e
profundidade?