Poucos dias antes das eleições autárquicas deixei por aí umas picadas aos socialistas ou seus "companheiros de estrada" que, com andarem a fazer contas ao futuro de Seguro durante uma campanha eleitoral, pareciam confundir as prioridades. Até perguntei, com alguma má-disposição, se as eleições eram para secretário-geral do PS.
Infelizmente, tenho agora a mesma sensação relativamente ao comportamento da direcção do PS no rescaldo de 29 de Setembro. Há demasiado esforço em tentar demonstrar que "o PS alcançou o melhor resultado de sempre para um partido nas eleições locais em Portugal". Qual é o problema com essa tese? Coisa pouca: não é verdade. É um sofisma. Só não lhe chamo directamente uma mentira porque é possível encontrar um critério que sustenta essa ilusão (número de câmaras). Mas a comparação das percentagens e a comparação do número de votos não autorizam essa afirmação. Bem pelo contrário. É que ganhar Lisboa ou ganhar o Corvo é, em cada caso, ganhar uma câmara: mas, no que toca ao significado nacional, os casos são muito diferentes. E o significado político das perdas (nomeadamente para a CDU), bem como o significado da abstenção, desautorizam essa leitura simples e gloriosa. Menos empenho em tentar ganhar campeonatos internos (Seguro teria feito melhor que os seus antecessores) e mais empenho em discernir os claros e os escuros destas eleições, era o que se podia esperar de uma direcção partidária que pensasse mais no partido e no país do que na sua própria sobrevivência.
Apesar de irritado com mais esta pequenez da direcção do PS, tinha decidido não me meter neste assunto. Mas revi essa decisão depois de ter tomado conhecimento de uma mensagem dirigida pela direcção do PS aos principais actores da família socialista, social-democrata e trabalhista da Europa. Nessa missiva (bem como na mensagem de correio electrónico que a embrulhava, onde se escreve preto no branco: "O PS alcançou o melhor resultado de sempre para um partido nas eleições locais em Portugal") é esse enganado auto-elogio que prevalece - em vez de, como seria mais útil, lembrar aos parceiros lá fora como estes resultados mostram a necessidade de encontrar uma alternativa de combate à crise que, em vez de castigar os portugueses, os mobilize. Esta comunicação dos resultados das autárquicas (que me decidi a publicar, abaixo, depois de me ter chegado por várias fontes, todas escandalizadas) é, do ponto de vista político, uma nulidade. No mínimo, uma nulidade: a política do vazio, sem uma leitura séria do acto eleitoral, um desperdício de papel quando há tanto que o PS tem a dizer (e a repetir e a repetir) aos seus camaradas europeus, que tantas vezes parecem não perceber o que se passa neste jardim à beira-mar plantado.
Era bom não sermos levados para a velha estória do "de vitória em vitória até à derrota final". Para não cairmos nisso é preciso evitar o triste exercício de lançar poeira para os nossos próprios olhos.