O caso dos submarinos é exemplar a vários títulos.
Paulo Portas faz malabarismos retóricos para tentar iludir a sua responsabilidade central na encomenda dos dois exemplares que vieram complicar a vida orçamental do Estado no corrente exercício. Em substância, o que Portas fez foi tentar mentir sobre a sua responsabilidade na compra dos submarinos. Que a imprensa tenha achado graça a isso, em vez de o denunciar, é outro factor a fazer deste caso um exemplo do mal que nos assola.
Por outro lado, a compra dos submarinos é apenas mais um episódio de algo que muitos parecem não querer ver: uma certa atenção ao que o Estado gasta parece ser coisa relativamente recente na cultura política nacional. É isso que faz com que Cavaco Silva, um dos principais, se não mesmo o principal responsável pela engorda da Administração pública, fale hoje como se não tivesse nada a ver com isso. Contudo, foi esse o isco, talvez decisivo, para uma das suas vitórias absolutas. Mas a falta de memória é outro traço da coisa pública que temos.
Outro factor que vem ao de cima com o caso dos submarinos é a salgalhada política que a esquerda da esquerda aproveita para fazer com assuntos de Estado: os cartazes do BE ("nem mais um cêntimo para guerras") simbolizam aproveitar a maré para atacar de forma primária a defesa nacional: uma noção civilizada de defesa nacional, que inclui a cooperação de cada país com acções que interessam à segurança internacional para lá das nossas fronteiras.
Há, como mostra o caso dos submarinos, um clima de vale tudo na política nacional, que corre o risco de nos atirar para o fundo enquanto cantamos e rimos. Exemplo desse clima Titanic é o entendimento perfeito, para efeitos de retórica imediata, entre os que são contra o "pacote de austeridade" por acharem que alguém devia pagar aos portugueses por darmos ao mundo a satisfação de existirmos - e os que são contra por acharem que devia ter vindo mais cedo. Que ambas as "escolas" consigam dar as mãos, politicamente, para fazerem o mesmo discurso nesta situação, retrata bem o estado da nação. É a aplicação viva - e inesperada - da tese de que acabaram as diferenças entre esquerda e direita. Pelo menos entre a direita portuguesa e a esquerda da esquerda à portuguesa.