25.3.22

Guerra e Instituições.

 

 
Dmitri Alperovitch publicou, no site online da Foreing Affairs, a 18/03, um artigo intitulado "The Dangers of Putin’s Paranoia".
 
Deixo três pequenos excertos:
 
"Mas a principal razão pela qual a guerra da Rússia na Ucrânia está a correr tão mal é que, segundo fontes com quem falei junto do Ministério da Defesa russo, o Presidente russo Vladimir Putin parece ter escondido os seus planos militares até mesmo dos seus conselheiros mais próximos até ao último momento possível. Já um líder invulgarmente paranóico, Putin estava tão obcecado em manter as suas intenções em segredo que manteve muitos oficiais militares e membros do seu conselho de segurança nacional às escuras sobre o momento e o alcance da invasão."
 
"O extremo sigilo de Putin ajuda a explicar alguns dos aspectos mais intrigantes da guerra. Por um lado, explica porque é que as autoridades russas não estavam preparadas para a onda de sanções económicas que se seguiu à invasão. No dia em que as primeiras tropas russas atravessaram a fronteira para a Ucrânia, o banco central russo ainda tinha mais de metade dos seus activos em contas no estrangeiro, onde podiam ser facilmente congelados - um grande descuido estratégico que desconcertou os observadores estrangeiros e deixou a economia russa muito mais vulnerável às sanções ocidentais. Se as autoridades económicas russas soubessem que o Kremlin estava prestes a lançar uma invasão em grande escala, teriam certamente feito mais para proteger os activos russos da retaliação económica."
 
"A abordagem secreta de Putin ao planeamento da guerra também explica porque é que as ciberoperações russas têm sido muito menos extensas e sofisticadas do que muitos peritos esperavam."
 
Fim de citações.
 
Isto é interessante do ponto de vista da compreensão da guerra em curso, porque introduz um elemento explicativo que assenta na compreensão das dinâmicas institucionais subjacentes - neste caso, pela degradação do próprio mecanismo normal de poder, que nem em regimes autocráticos tem de ser absolutamente pessoalizado.
 
Contudo, esta observação é relevante de um ponto de vista mais corriqueiro, que toca mesmo a democracias consolidadas: a tendência para a concentração de poder no topo da pirâmide, muitas vezes confundindo-se com a personalização do poder (poder total à liderança, pouco e mal partilhado com um círculo muito restrito de próximos), corrói o funcionamento das instituições e substitui o grau apropriado de colegialidade e diversidade interna próprio de instituições sãs por uma lógica de grupo fechado no seu próprio poder. Essa lógica, mais tarde ou mais cedo, corrompe a capacidade dos detentores do poder para compreenderem o mundo. Este é um ponto que convém nunca esquecer.
 
 
 
Porfírio Silva, 25 de Março de 2022
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