Rio vem advogar como novidade a adoção de uma “flexibilidade pedagógica”, que está longe de ser uma proposta inovadora. Aliás, a sua existência foi consagrada pela Lei de Bases do Sistema Educativo, em vigor desde o ano de 1986, sendo uma das premissas da educação em Portugal.
O referido programa anuncia o fim das turmas mistas, situação que se encontra em contradição com a autonomia pedagógica que advoga. Nesse quadro, parece esquecer experiências que tiram bom proveito da heterogeneidade dos grupos. Acresce que não diz como é que é possível erradicar essas turmas, qual o orçamento necessário para o efeito e se para tal existem recursos humanos disponíveis.
Na amálgama das propostas surge também a indicação de que farão depender a abertura de novas ofertas formativas de um estudo de viabilidade apresentado pelas escolas ao Ministério da Educação. Mas esse é já hoje o procedimento adotado.
A proposta com que Rui Rio se apresenta às eleições insiste num “currículo centrado no conhecimento”, que gostaria de ver proscrito o desenvolvimento de competências, a mobilização do saber fazer e a aplicação prática das aprendizagens. Reitera-se com essa proposta o pior da política educativa de Passos Coelho.
Esquecendo que são as escolas em que os alunos obtêm piores resultados aquelas que necessitam de maior atenção, o PSD propõe atribuir mais recursos humanos (sob a forma de crédito horário) aos estabelecimentos em que se verifique uma progressão dos resultados escolares. Para trás ficarão aqueles que necessitam que a escola continue a ser um elevador social, que lhes permita vencer o cerco da pobreza e que, nessa medida, se verão privados de recursos essenciais.
Entre as ideias peregrinas que apresenta, surge a de se criarem três academias para a formação de dirigentes escolares. Neste contexto, Rio e a sua equipa ignoram o papel dos estabelecimentos de ensino superior, universitário e politécnico, espalhados pelo país, que têm, com sucesso, formado os docentes para os processos de gestão e administração escolar. Querem também atribuir ao Ministério da Educação a responsabilidade de conferir a formação profissional aos docentes, ignorando que são as universidades e os politécnicos que têm a experiência, o conhecimento, a investigação e os recursos para esse efeito.
Mais grave é o facto de quererem colocar em causa a Autonomia e Flexibilidade Curricular, não percebendo que esta não corresponde a um currículo feito “à vontade do freguês”, em que cada qual “dá o que quer”. Mas que, ao invés, pretende conferir sentido a um conjunto de aprendizagens essenciais, iguais para todos, organizadas e adequadas a cada grupo e a cada território, estabelecendo relações de sentido com os conhecimentos dos alunos, os seus contextos e oportunidades de aprendizagem.
O ensino profissional é também apoucado nas propostas do PSD. Com efeito, denunciam algum mal-estar com a dimensão de dupla certificação, que existe no nosso sistema. Em Portugal, estas ofertas formativas não são becos sem saída, mas permitem aos alunos ingressarem no mercado de trabalho ou num curso superior. O modelo defendido por Rio assume que o Ensino Profissional é só para “ensinar uma profissão”.
Desconhecendo que existe no país um sistema de antecipação das necessidades de qualificação, o programa do PSD vem pomposamente propor que se listem as qualificações entendidas como prioritárias. Também ignora que os setores empregadores são ouvidos para a definição de novos referenciais de formação, medida que vem agora sugerir com o entusiasmo de quem julga estar a inventar a pólvora.
Este documento propõe ainda acabar com as provas de aferição do 2º e 5º anos de escolaridade, que servem, dada a sua disposição nestes períodos intermédios, para detetar atempadamente problemas e promover estratégias de melhoria. Rio quer recuperar as provas finais no 4º e no 6º ano, que Nuno Crato foi buscar a um ultrapassado pensamento pedagógico, numa perspetiva que transforma estes momentos de avaliação num fim em si mesmo, ao serviço da rotulação precoce das crianças e jovens.
O atual programa do PSD prevê ainda “desenvolver uma educação estética, transversal ao curriculum escolar”. Também aqui, parece desconhecer a relevância e a profundidade do trabalho que hoje é levado a cabo por todo o território nacional pelo Plano Nacional das Artes, pelo Plano Nacional de Cinema e pelo Programa de Educação Estética e Artística. Com iniciativas e estruturas que promovem, nas escolas, a realização de projetos de natureza transdisciplinar, que desenvolvem aprendizagens mais integradas, significativas e duradouras.
O programa de Rio para a Educação é também uma amalgama de contradições, de desconfianças e de ocultação de resultados. Criticando, por um lado, o aumento do número dos profissionais docentes disponíveis e a despesa global com a Educação (como se esta não fosse um relevante investimento para o Futuro do país), por outro, apresenta a escrutínio um conjunto de medidas vagas, sem qualquer indicação de impacto. Trata-se, pois, de um documento que oculta resultados que nos devem, hoje, orgulhar, como são os casos da evolução do abandono escolar precoce, da melhoria das taxas de aprovação dos alunos ou da melhoria das conclusões do ensino secundário.
Em suma, o programa do PSD revela, na sua globalidade, um absurdo desconhecimento sobre o atual sistema educativo português e sobre as premissas essenciais de uma educação do século XXI. Apresenta um arrazoado de desconexas generalidades e de ideias com resultados duvidosos, alicerçadas em narrativas ultrapassadas, lembrando um já velhíssimo Crato, ensopado em naftalina.