Os deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista na Comissão de Educação da Assembleia da República contactaram, durante a semana que agora termina, umas largas dezenas de Agrupamentos de Escolas e Escolas não agrupadas, por todo o país. Nunca presencialmente, contrariamente ao que fazemos habitualmente, mas por telefone ou meio similar.
Esses contactos serviram para aferir da situação concreta no terreno, neste momento de grande dificuldade. Tendo feito pessoalmente alguns desses contactos, tendo lido os relatos dos meus colegas de bancada e tendo reunido com eles (por vídeoconferência, várias vezes nestes dias) para analisar a situação, sublinho, desde já, os seguintes aspectos:
- os profissionais da escola pública, desde logo os professores, deram uma resposta extraordinária ao desafio com que foram confrontados, fazendo das tripas coração para não deixar sem apoio os seus alunos; mesmo com falta de meios, fizeram por não interromper as aprendizagens... chegando até a cansar as famílias com tantas propostas de trabalho!
- as persistentes desigualdades sociais que caracterizam o nosso país (como a generalidade dos outros) acentuam-se e tornam-se mais presentes neste momento: os que "estão digitalizados" e os que não têm equipamentos e/ou acesso capaz à internet, vivem em realidades muito diferentes - mas não é só isso: o contexto familiar empurra uns para cima e puxa outros para baixo, o que constitui o principal desafio a que a nossa escola tem de ser capaz de responder para cumprir a sua missão; os casos mais extremos são os dos "desaparecidos", alunos que, desde a interrupção da escola presencial não estão localizáveis pelos seus professores, apesar do esforço para os contactar;
- as escolas, orientadas pelo Ministério da Educação, criaram uma rede de apoio básico (refeições e acolhimento de filhos de profissionais em funções prioritárias) que é decisiva: apesar de a procura, nesta primeira fase, não ter sido grande (considerando a grande dimensão da população envolvida), com o passar do tempo a procura vai aumentar e a existência desta resposta vai revelar-se crucial;
- há problemas muito difíceis de resolver, designadamente no que concerne a aprendizagens que envolvem componentes práticas que não se podem concretizar a distância (como, por exenmplo, no ensino profissional) e no que toca aos mais pequenos que, fechados em casa, perdem assim muitas oportunidades de estimulação que são fundamentais ao seu desenvolvimento;
- a escola é muito mais do que um local de aquisição de conhecimentos: a escola é uma experiência total, uma âncora para muitas crianças e jovens, principalmente para todos aqueles que têm vidas difíceis fora da escola e ali encontram adultos de referência, atenção e cuidado.
Trata-se, agora, de continuar. Ninguém vai desistir agora. Como afirmou hoje o Secretário de Estado da Educação, João Costa, "o terceiro período vai acontecer, as notas do segundo período não são as notas finais". Essa determinação é essencial, não podemos permitir que as nossas crianças e jovens fiquem a marcar passo nesta fase tão importante das suas vidas. Vai ser fácil? Não vai. Mas, trabalhando em equipa, adoptando as adaptações necessárias, com metodologias para que (quase) ninguém estava preparado, vamos conseguir. O Ministério da Educação já fez chegar às escolas o ROTEIRO - 8Princípios Orientadores para a Implementação do Ensino a Distância (E@D) nas Escolas (clicar no título para aceder). Em conversas com directores e professores, já hoje, pude notar que a marcação de um rumo, de uma linha para o que é preciso fazer, constitui um incentivo mobilizador.
Isto não acabou e não vai ser fácil. Entretanto, o que se está a conseguir fazer, com trabalho colectivo e determinação, faz-nos ter orgulho na escola pública. Já hoje, dizia-me um director de agrupamento: "o que me preocupa é que nós éramos a melhor parte da vida destes meninos". A escola pública vai encontrar os caminhos para continuar/voltar a ser "a melhor parte da vida" de tantas crianças e jovens que merecem a sua oportunidade.
Obrigado a todos os que fazem escola em todas as circunstâncias!
Porfírio Silva, 27 de Março de 2020