21.5.16

Brasil, Europa.

11:42




Esta semana tive dois encontros relevantes na qualidade de Secretário Nacional do PS responsável pelas Relações Internacionais.

No dia 18 recebi no Largo do Rato uma delegação de cinco sendadoras e senadores e deputados de vários partidos de esquerda do Brasil. Nessa ocasião fui informado da situação política que lá se vive e expressei preocupação, porque o processo actual configura uma entorse constitucional, na medida em que há uma mudança de natureza do regime: a fonte de poder executivo, tal como previsto pela Constituição, é o presidente eleito directamente pelo povo, mas passou agora para as mãos de um parlamento que não recebeu mandato para o efeito. Nesta situação, o Brasil tem agora um governo com um programa que não recebeu nenhum mandato popular: nem para o governo, nem para o seu programa. Garanti que nenhum valor é mais alto para nós do que a democracia e que, por isso e pelas conquistas sociais que estão em risco, continuaremos atentos ao que se passa no Brasil.

No dia 19 recebi o Primeiro Vice-Presidente da Comissão Europeia, Frans Timmermans, tendo-lhe feito saber que damos muito valor e apoiamos o seu trabalho em matéria de Estado de Direito e de Direitos Fundamentais na União Europeia, até porque a Europa só pode reganhar significado político e relevância se for efectivamente uma comunidade de valores. O encontro foi também oportunidade para reafirmarmos posições acerca da correcta relação entre Portugal e a Comissão Europeia, designadamente no que toca a uma cooperação virada para o futuro - e não para um "acertar de contas" baseado nos resultados dos últimos anos.

20.5.16

uma luta do ex-ministro David Justino contra o actual ministro Tiago Brandão Rodrigues, por via de David Justino presidente do CNE !?

16:52



O PSD está numa deriva radical, a qual se nota especificamente também na Educação. Mais precisamente, agora, com a questão dos contratos de associação.

Luís Montenegro, líder parlamentar do PSD, tem sido um dos arautos desse radicalismo, designadamente ao ter assumido o papel de tentar criar uma guerra entre a Igreja e o Estado nesta matéria, quando é claro que não há nenhum critério confessional na política do governo (nenhuma escola receberá ou deixará de receber mais turmas pelo critério de ser ou não ser confessional).

Nisso, Montenegro fica bem na fotografia ao lado de Passos Coelho, que entrou na guerra dos privados com um ataque pessoal ao Ministro da Educação, com um ataque aos sindicatos que deveria envergonhar a sigla "social-democrata" do seu partido, e com uma tentativa de inverter a Constituição (onde houver uma escola privada, não se investe na escola pública).

Uma das manifestações mais preocupantes dessa deriva radical é a tentativa de instrumentalizar órgãos independentes. Como a proposta do PSD, chumbada hoje na AR, de pedir um estudo ao Conselho Nacional de Educação sobre custos do ensino privado e do ensino público.

O PS explicou porque chumbou a proposta (segue-se recorte da declaração de voto entregue hoje):

Este Projeto de Deliberação traduz a intervenção do Deputado Pedro Passos Coelho, no debate quinzenal de 13 de Maio passado, quando propôs que o governo adiasse quaisquer decisões sobre contratos de associação para o próximo ano, realizando entretanto um estudo sobre os custos das opções em consideração. Trata-se, portanto, de uma proposta para não decidir.
Ora, em primeiro lugar, esse estudo pode ser realizado pelos serviços competentes do próprio Ministério da Educação, sem necessidade de o solicitar ao Conselho Nacional de Educação (CNE). Aliás, o CNE teria sempre de recorrer aos serviços do Ministério da Educação para obter os dados, pelo que a proposta do PSD serve o propósito de sugerir, sem o fundamentar, que os dados fornecidos pelo Ministério da Educação não são fiáveis.
Em segundo lugar, e mais grave, esta proposta do PSD, se entendida como motivo de adiamento das decisões a tomar sobre contratos de associação, é, pelas suas consequências, claramente irresponsável – qualquer que seja a opinião sobre o que fazer com os contratos de associação. Assim:
(a) Os que entendem que devem ser abertas todas as novas turmas desejadas pelas escolas com contrato de associação, deixando o estudo da rede para o próximo ano, pretendem, na prática, comprometer um novo ciclo de financiamento por mais três anos, sem um estudo que demonstre essa necessidade. A menos que considerem a hipótese de abrir as turmas e depois não lhes dar continuidade, o que seria inaceitável.
(b) Se, pelo contrário, entendermos que os contratos em vigor, celebrados por três anos, só contemplam a continuidade das turmas abertas no corrente ano letivo, a proposta de não decidir este ano (que é a proposta do PSD) implica que não sejam assinados novos contratos, portanto que não sejam abertas novas turmas este ano, provocando uma situação de rutura da oferta nos territórios onde efetivamente haja carência da rede pública.
Em qualquer dos casos, a consequência da proposta do PSD é inaceitável. E por isso o Grupo Parlamentar do PS vota contra este Projeto de Deliberação.

Note-se bem o que está em causa: instrumentalizar um órgão independente, o CNE. O que o PSD está a tentar é o seguinte: criar uma luta do ex-ministro David Justino contra o actual ministro Tiago Brandão Rodrigues, por via de David Justino actual presidente do Conselho Nacional de Educação. Trata-se, simplesmente, de uma completa falta de respeito pelas instituições. Não se esperaria isto do PSD? Talvez não. Mas é esse o PSD que temos hoje.

16.5.16

MFL, a social-democracia e as escolas públicas ou privadas.

19:32

A Dr.ª Manuela Ferreira Leite, na edição de 30 de Julho de 2015 do programa Política Mesmo (TVI), analisou o programa eleitoral da PàF. A linha mais clara do seu discurso era a seguinte: não posso apoiar, porque eu sou social-democrata e este programa não é social-democrata. Esse posicionamento baseava-se numa análise do conceito de liberdade de escolha, muito presente no dito programa da coligação PSD/CDS.

Transcrevo alguns pontos do que disse então Manuela Ferreira Leite. O programa completo pode ser revisto aqui.


Manuela Ferreira Leite, excerto 1:
«Há uma ideia que atravessa todo o texto e que é a liberdade de escolha. (…) Estou a partir da hipótese tem a ver com sector público ou sector privado. (…) Naqueles pontos fundamentais em que se pode escolher se determinado serviço é fornecido pelo sector público ou pelo sector privado, eu tenho a opção de tanto ir a um como ir a outro. Esse é o ponto (…) com o qual eu não consigo estar solidária, pela simples razão de que eu sou social-democrata. (…) Nessa situação é fundamental a ideia com que a social-democracia encara o Estado social. Este Estado social baseia-se, assenta em três pilares: na educação, na saúde e na segurança social. E aí considera-se que uma parte importante destes pilares são fornecidos pelo Estado. O Estado fornece estes serviços aos cidadãos. Evidentemente que qualquer deles pode ser desempenhado também pelo sector privado. E por isso no texto do programa se vê muita vez a liberdade de opção e o reforço do papel regulador e fiscalizador do Estado. E evidentemente que o Estado regulador surge exactamente naquelas funções em que devendo ser feitas pelo Estado são também pelo privado. Então, o Estado vai regular para que esse serviço seja fornecido de acordo com determinado tipo de condições.»

Manuela Ferreira Leite, excerto 2:
«Se eu tiver que por os meus filhos na escola acho óptimo poder escolher entre ir para o sector público ou para o sector privado. (…) Tem graça nos três primeiros anos, ou nos quatro primeiros anos, ao fim de dez anos acabámos, ficámos com um sector em que a qualidade do ensino no privado é para alguns e o público vai ficar apenas com a parte de menor qualidade e portanto para aqueles que menos podem. E portanto toda a construção de Estado social , que eu julgo que é aquilo que é a matriz da social-democracia, é que estes três pilares , o Estado social assenta nestes três pilares , estes três pilares são fornecidos em parte importante pelo Estado e só o poderão ser subsidiariamente, com certeza, pelo sector privado. Se assim não for, se as escolas públicas, os hospitais públicos, as partes dos apoios sociais ficarem só apenas para as IPSS, no caso da assistência social, ou a escola pública apenas para alguns, para aqueles mais pobres que não podem de forma nenhuma pagar essas diferenças, e os hospitais também apenas para esses, quer dizer que entrámos num regime assistencialista. Quer dizer, o Estado entra, e participa, e paga, aos pobrezinhos. Isso é absolutamente contrário à matriz social-democrata.»

Manuela Ferreira Leite, excerto 3:
«Quando se fala na liberdade de opção da educação e da saúde, nos três primeiros anos deve ter alguma graça, ao fim de dez anos realmente houve uma privatização do sector da saúde e do sector da educação. (…) Aceita-se de certa forma que possa haver uma complementaridade, por exemplo na educação, ou na saúde, dos privados em relação ao público, porque não existem unidades suficientes para assistir à procura de toda a gente. Mas não é o caso da educação. No caso da educação existe uma rede pública que por motivo de reduzir tantos alunos, aquilo que está a acontecer é fecharem as escolas, não é a abrirem escolas. Porque está a diminuir a procura. No caso em que existe uma rede pública, por que é que nós vamos ter que apoiar uma rede privada, se nós temos uma pública? E se vamos ter que a pagar? E se não podemos deixar de a pagar? Não consigo entender. »




6.5.16

Ensino Particular e Cooperativo.

13:44

Reproduzo a minha intervenção, esta manhã no plenário da Assembleia da República, no debate de atualidade sobre “Ensino Particular e Cooperativo”, requerido pelo PSD. Vídeo mais abaixo.


* * *



Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhores Membros do Governo,

Neste debate de hoje sobre Ensino Particular e Cooperativo, convém começar por esclarecer o que está em causa.
Não estamos a discutir a liberdade de ensinar e de aprender. Ninguém põe em causa a liberdade de criar escolas privadas e cooperativas; as famílias têm a liberdade de escolher essas escolas em vez das escolas públicas; o Estado não interfere no projeto educativo dessas escolas, nem na sua gestão; os graus conferidos por essas escolas são reconhecidos. Portanto, não está em causa a liberdade de ensinar e de aprender, mas sim o financiamento.
É legítimo discutir financiamento, é legítimo que os proprietários de escolas queiram discutir o modelo de negócio e tentem obter mais financiamento do Estado. Mas não é legítimo confundir as questões.

O que acontece é que o governo está a fazer uma gestão cuidada e rigorosa dos dinheiros públicos, como é seu dever. Mas, claro, o Partido Socialista não concordaria que, em nome da gestão dos dinheiros públicos, se desrespeitassem os compromissos do Estado. Para isso já bastou a legislatura anterior e a prática do governo anterior.
Os contratos de associação firmados pelo anterior governo serão respeitados. Será financiado o número de turmas previsto nos contratos, nos montantes fixados pelos contratos. Todos os alunos poderão prosseguir e completar o ciclo de estudos que estão a frequentar, na turma em que se encontram atualmente.
E, ainda, serão financiadas novas turmas de início de ciclo de estudos, consoante as necessidades identificadas pela avaliação criteriosa da rede, que está a decorrer.

Alguns apostam na cartada ideológica para embelezar reivindicações que dizem apenas respeito a financiamento. Pois, sejamos claros: aqui só há uma ideologia, que consiste em respeitar as leis do país e, desde logo, a Constituição e a Lei de Bases do Sistema Educativo.
Não há nenhuma novidade legislativa no que o governo está a fazer: a novidade é que este governo cumpre a lei e executa os contratos de acordo com as regras dos concursos que deram origem a esses contratos.
E, por isso, não se admite que a escola pública seja tratada como supletiva da escola privada, não admitimos a prática inaceitável de fechar turmas no público para artificialmente criar espaço para turmas no privado. Isso não podemos aceitar, porque temos a obrigação democrática de promover a igualdade de oportunidades também no acesso à educação.
Estamos certos de que, nas decisões que o Ministério da Educação venha a tomar em termos de gestão da rede, nenhuma entidade será prejudicada ou beneficiada por razões ideológicas. As decisões sobre as turmas a abrir terão em conta as necessidades locais e a gestão criteriosa dos recursos públicos.

Senhoras e senhores deputados,
É claro que, quando se trata de gerir a rede de oferta educativa, estamos a lidar com problemas difíceis. Alguns alertam que poderá haver desemprego de. Na realidade, já há desemprego de professores, designadamente na escola pública, desde logo porque há muito menos alunos, é a realidade demográfica. Só nos últimos 7 anos letivos, perdemos mais de 137 mil alunos e perdemos mais de 30 mil professores.
No entanto, esta realidade não afetou igualmente a escola pública e a escola privada. O que se fez na legislatura anterior foi sistematicamente cortar mais no financiamento do ensino público do que cortaram no ensino privado. Sim, Nuno Crato cortou em tudo, até no ensino privado, mas cortou mais no ensino público e até isso mostrou agir por impulso ideológico.
Portanto, sim, há um problema de desemprego de professores, e temos de estar atentos a esse problema, mas não têm autoridade nenhuma para falar disso aqueles que no governo anterior disseram aos professores que a saída deles era a imigração.

E também temos de recusar a irresponsabilidade dos que usam o alarmismo como arma política. É o caso de quem fala de despedimento eminente de quatro mil professores nas escolas com contratos de associação. É que, estando em vigor contratos plurianuais de três anos, é completamente injustificado que estejam a ameaçar de despedimento imediato todos os professores dessas escolas.

Senhoras e senhores deputados,
A liberdade de cada família optar pelo sistema público ou pelo sistema privado mantém-se inalterada. Os contratos de associação não são ferramentas de promoção da liberdade de escolha das famílias, porque financiam diretamente os proprietários das escolas e não as famílias.
E não, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, Senhores membros do Governo, fechar uma escola pública para abrir uma escola privada, isso não promove a liberdade de escolha, isso não promove a igualdade de oportunidades, nem respeita a lei.

Disse.