7.2.15

postal para Pedro Santos Guerreiro.



Pedro Santos Guerreiro escreve hoje no seu espaço no Expresso: «Sobre a questão grega, Passos Coelho não muda de opinião: está sempre com Merkel. António Costa também não muda de opinião: está sempre do lado de onde sopra o vento.»

Pelo respeito que este jornalista me merece, acho-me no dever de enviar este postal a Pedro Santos Guerreiro.

O seu diagnóstico sobre Passos Coelho está basicamente certo, mas incompleto. PPC só tem uma ideia sobre Portugal na Europa e essa é "seguir Merkel". Mas, mais grave ainda, Passos Coelho é, também em matéria de Europa, muito esquecido: passa a vida a dizer que não disse aquilo que repetidas vezes afirmou antes. E isso é um defeito que toca mais fundo do que o erro político de não ter uma visão patriótica da nossa pertença à Europa.

Já o seu diagnóstico sobre António Costa está completamente errado. Por quê? O ponto essencial foi cristalinamente explicado pelo próprio António Costa ainda esta semana. Para quem quis ouvir. Ou ler. Em entrevista ao Público, António Costa diz a certo ponto:

«Sempre tenho dito que numa Europa a 28 ninguém pode antecipar ou prometer um resultado. (...) O que tem sido a involução das posições do Syriza desde o início da campanha eleitoral até às eleições e das eleições até ao dia de hoje demonstra bem que temos sido bem avisados em não nos amarrarmos a uma única solução, porque quando se vai para uma mesa de negociações tem que se ter claro qual é o objectivo, mas tem que se ter a disponibilidade de trabalhar com as diferentes variáveis e encontrar as melhores soluções para alcançar esse objectivo.»

Quer dizer: António Costa não alinha nessa visão "heróica" da política que consiste em pedir aos políticos posições definitivas, com todas as arestas bem marcadas, tudo ou nada. Essa visão "heróica" está profundamente arreigada quer na política tradicional quer no "comentarismo" tradicional. A política tradicional prefere dizer que o mundo é a preto e branco, porque essa mensagem simplista supostamente rende mais votos. O "comentarismo" tradicional compra mais audiências se passar por cima dos pormenores e se focar apenas nos contrastes fortes, porque as estórias parecem mais picantes. Mas tudo isso está longe do que Portugal precisa hoje nesta Europa.

O que António Costa diz - assume contra os ventos da facilidade e dos discursos simplistas - é que seria errado fazer exigências demasiado concretas e definitivas quando o quadro é incerto, dinâmico, e a negociação a 28 exige que tenhamos objectivos claros sem sermos dogmáticos nas modalidades concretas de eventuais soluções. E mais: um futuro primeiro-ministro tem de saber que jogar em tom de promessa, agora, as cartas negociais de um futuro governo seria irresponsabilidade e falta de atenção ao interesse nacional.

Assim, caro Pedro Santos Guerreiro, talvez António Costa não corresponda ao seu modelo "heróico" de político: aquele que se considera o centro do mundo e continua a julgar que o Sol gira à nossa volta. Ainda bem que António Costa não corresponde a esse modelo de "velho político" e, pelo contrário, define uma meta mas não desdenha vários caminhos possíveis para lá chegar. Como explica, na mesma entrevista que já mencionei: «E sempre insisti na mesma formulação: o que é fundamental é assegurar um equilíbrio entre as condições de pagamento da nossa dívida, de cumprimento das obrigações constitucionais, designadamente com os pensionistas, e a necessidade de termos meios financeiros para realizar os investimentos para o futuro.»

Se isto é estar atento ao vento, ainda bem que António Costa está atento ao vento. Ou o Pedro Santos Guerreiro pensa que as velas dos grandes veleiros são fixas e aguardam que seja o vento a ajustar-se ao barco? Quem quereria seriamente navegar em mar revolto num veleiro assim tão mal construído?