uma pergunta a revolucionários que talvez por aí andem
(imagem desviada do bolas e letras)
Face à verdadeira subversão do Estado de Direito que representa toda a novela Freeport, que nasceu de uma conspiração entre políticos, polícias e jornalistas (como foi provado em tribunal) e que assim continuou (como Paula Lourenço ontem documentou largamente em entrevistas à SIC Notícias) há uma pergunta que me baila na cabeça. É uma pergunta que faço enquanto membro da grande e difusa família mundial de socialistas, social-democratas e trabalhistas. É uma pergunta dirigida à esquerda da esquerda deste país, mormente ao PCP e ao BE. E a pergunta é: continuais a ser revolucionários, e portanto a valorar positivamente tudo o que contribua para a degradação do Estado de Direito e assim aplanar o caminho da revolução, incluindo esta brutal manipulação da justiça que cada vez é mais evidente que é a razão do caso Freeport - ou tendes algum tipo de verdadeira oposição ideológica ou política a estes processos e estais a ponderar a forma de dardes o vosso contributo para bloquear este golpe estado em curso?
ao cuidado dos senhores procuradores que gramam corin tellado
Pena não haver por aí o vídeo completo da entrevista. A doutora não tem mesmo papas na língua. E acho que também alguns assistentes no processo que escrevem como jornalistas ainda vão encontrar com que se coçar.
(Obrigado à Shyznogud por ter ouvido o meu apelo implícito.)
Outro excerto.(Agora obrigado ao Nuno.)
problemas que são sérios para outros países mas que entre nós não interessam nada comparados com as novelas de procuradores que gostavam de escrever corin tellados
O ministro alemão da Economia, Rainer Brüderl, defendeu a necessidade de facilitar a contratação de trabalhadores estrangeiros qualificados e até pensa num incentivo em dinheiro para os atrair. Numa entrevista ao diário Handelsblatt, diz o ministro Liberal: "O tema da atratividade da Alemanha para trabalhadores estrangeiros qualificados está no topo das minhas prioridades"; "quero um plano para os trazer para a Alemanha." Este plano pode incluir a redução do limiar de rendimento abaixo do qual os estrangeiros não podem vir trabalhar na Alemanha, acrescentou. A escassez de trabalhadores qualificados é uma preocupação real para a economia alemã, agravada pela baixa taxa de natalidade. A consultora McKinsey estima que a Alemanha terá em 2020 um défice de 2 milhões de trabalhadores qualificados.
Nós, por cá, temos mais em que pensar. 2020 vem muito longe: já estaremos demasiado carecas para nos interessar aparecer nos jornais. É o que parecem pensar alguns. "Parecem pensar".
29.7.10
sem papas na língua
A advogada Paula Lourenço, que defende os acusados de extorsão no caso Freeport, acaba de dar uma longa entrevista à SIC Notícias (Edição da Noite do jornal), na qual, desassombradamente, esclarece os distraídos acerca do que tem sido esse processo: um antro de conspiração política, de falta de profissionalismo, de falta de respeito de supostos agentes de justiça pela própria justiça. Começo agora a tentar encontrar o vídeo respectivo, cuja divulgação aqui seria um verdadeiro serviço público.
jornalismo das berças
Um jornalista que escreve isto que aqui se lê só pode ter chegado das berças, directamente de secretário da redacção de um jornal paroquial qualquer, na própria véspera. E assim se explica o seu espanto com o mundo.
(A culpa de eu andar a ler estas tolices é do João Magalhães.)
anti-ciclone
Daniel Oliveira escreve no Arrastão:
Alguma coisa está errada. Ou o primeiro-ministro fez o que os agentes de justiça andaram a soprar aos jornais mas o Ministério Público foi incompetente para o levar a julgamento, e alguém te de responder por isso. Ou o primeiro-ministro não estava envolvido em nada e alguém na justiça usou a sua função para combate político, e alguém tem de responder por isso.Integral aqui.
Se for o primeiro caso, é grave. Se for o segundo, é gravíssimo. Não há cidadãos de primeira e de segunda. Mas há responsabilidade. Pôr a política nacional a ferro e fogo para depois apresentar uma mão cheia de nada é inaceitável.
(Entretanto, na caixa de comentários (as caixas de comentários são a verdade da blogosfera), alguém escreve sobre aquele post: "E ontem tudo o que era xuxalista andava a mandar foguetes. Saíram todos da toca, parecia que tinham ganho o campeonato do mundo." O tótó pensa que os socialistas estão na clandestinidade, é? Desengane-se.)
os capitalistas é que sabem - e o PCP não lhes fica atrás
Quando, há três anos, Belmiro de Azevedo fez a OPA à PT, disse que ia vender a Vivo à Telefónica. Por 2 mil milhões de euros. Agora foi por 7,5 milhões. (Ler Ferreira Fernandes, a quem cheguei via Miguel Abrantes.)
O tiro rombo do capitalista-mor não é, mesmo assim, muito mais - nem muito menos - clarividente do que o rumo do PCP. O PCP não vê diferença nenhuma na nova situação. 350 milhões não são nada para o PCP. Uma posição noutra empresa brasileira, onde a PT espera dar o litro do seu sabor de implantar novas tecnologias, também não interessa nada ao PCP. Estará Belmiro prestes a aderir ao PCP - ou o PCP prestes a aderir ao Belmiro?
Para que não digam que estou a caricaturar a posição do PCP, aqui fica:
serviço combinado com a CP
Francisco Clamote, no Terra dos Espantos:
Se, ao fim de seis anos, que tantos durou a investigação, os procuradores responsáveis pela instrução do processo Freeport (Paes de Faria e Vítor Magalhães) acharam por bem referir, no despacho que encerrou a instrução, que havia interesse em ouvir José Sócrates, e que a diligência que só não foi realizada por falta de tempo, uma conclusão se impõe: estes procuradores não se importam de passar por idiotas. Digo "passar por", porque, em boa verdade, o que eles escrevem é pura idiotice, mas eles idiotas não são. Pelo contrário, vendo o seguimento dado pelo "Público" ao assunto, tudo indica que estamos perante um serviço combinado para que a campanha caluniosa não chegue aos "finalmente".Na íntegra: Os "idiotas" de serviço.
A hipótese não estranharia, pensando em outras coisas que se têm visto: há pessoas, dentro do aparelho judicial, que escrevem certas coisas nas suas papeladas muito oficiais, por muito tolas que pareçam, com um único fito: serem citadas por certos "jornalistas". Quizás, quizás, quizás.
seis anos não chegaram?
Freeport: Procuradores quiseram ouvir Sócrates mas não tiveram tempo.
O processo Freeport já teve utilidade para duas eleições legislativas. Utilidade, quer dizer: motivo para tentar obter trunfos eleitorais contra o odiado Sócrates de Portugal. Ao fim de seis anos, bem espremido, o processo não produziu nada que servisse para sujar Sócrates. Salvo, claro, a contínua sugestão disto e daquilo pelos emporcalhadores de serviço. Agora, parece que há uns tipos que lamentam não ter tido tempo para perguntar umas coisas a Sócrates. Há sempre uns tipos que engendrariam qualquer desculpa para dirigir a palavra a Angelina Jolie, outros já ficariam contentes por poder fazer umas perguntas a Sócrates. São gostos.
Pena é que o inefável Cerejo, que não quer nem por nada deixar secar a teta, consiga fazer uma peça "jornalística" daquele tamanho sem nunca se lembrar da pergunta óbvia: então e seis anos não chegaram?
para memória futura
Ainda sobre o Freeport, Miguel Abrantes:
Ao longo dos anos em que o processo se arrastou até ao fim do inquérito, a boataria, a intriga e a calúnia alimentaram várias campanhas eleitorais e serviram de arma de arremesso a políticos menos escrupulosos. Na origem de tudo isto, esteve até uma conspiração — devidamente documentada por uma sentença condenatória — que envolveu investigadores e políticos.Integral aqui.
Seria bom que parássemos um pouco para pensar e extraíssemos as necessárias ilações de tudo o que se passou. Não podemos defender o Estado de direito em part-time. Não podemos defender a legalidade só quando nos convém e instrumentalizar o processo judicial para atingir adversários políticos. Aqueles que o fizerem hoje podem arrepender-se amanhã, vítimas da sua obra de aprendizes de feiticeiro.
Talvez fosse útil que os encenadores da Face Oculta aproveitassem esta lição para arrepiar caminho. A tentativa ignóbil de tresler as leis, inventando um atentado contra o Estado de direito a cargo do primeiro-ministro, talvez tenha um pouco mais de sofisticação nos meios, mas é ainda mais patética nos resultados do que a triste conspiraçãozinha com que tentaram atingir José Sócrates no caso Freeport.
sacudir a miseravelmente a água do capote
Ler o João Galamba:
Salvo honrosas excepções, o grosso do jornalismo português mostrou, mais uma vez, que não tem pingo de vergonha e decidiu assobiar para o lado no 'caso Freeport', descartando qualquer responsabilidade pela tempestade de calúnia e difamação mediática a que sujeitou José Sócrates durante os últimos anos. 'A culpa é da justiça'; 'a montanha pariu um rato'; ou, num editorial do Público (sem link) que é um verdadeiro case-study sobre a(ir)responsabilidade do jornalismo português, 'a justiça investiga mal um caso que vendeu na praça pública como escaldante para depois concluir que nada de relevante acontecera...culpar os media é um exercício fácil. É inegável que houve excessos, mas também é inegável que houve fontes'. Ou seja, os media rejeitam toda e qualquer responsabilidade associada ao poder que exercem e assumem-se como vítimas inocentes de uma justiça disfuncional.Aqui, na integral do post, veja as contas feitas em detalhe.
Abortou mais um golpe de Estado
Só para citar Tomás Vasques:
A investigação ao licenciamento de um empreendimento comercial, em Alcochete – o caso Freeport –, em 2001, manteve um primeiro-ministro debaixo de fogo cerrado durante 6 anos. (...)Integral: Abortou mais um golpe de Estado.
É à luz do que agora foi concluído pelo Ministério Público que se deve fazer um exercício indispensável, a bem da saúde democrática do regime: projectar o «filme» ao contrário, de trás para a frente. Percorrer, um a um, todos os textos de opinião, em jornais, revistas e blogues; revisitar os Jornais de Sexta-feira, de Manuela Moura Guedes; desenterrar o defunto Independente durante a campanha eleitoral de 2005; até chegarmos à origem do processo: a denúncia «anónima» feita por gente ligada a partidos políticos.
os conselheiros do candidado a príncipe
António Nogueira Leite, que, dizem, Pedro Passos Coelho ouve, parece ter coisas profundas a dizer ao ouvido do candidato a primeiro-ministro. E, dado que PPC deve estar escaldado de ser apanhado a dizer coisas que se revelam tontarias prejudiciais, ANL passou a louvar os seus conselhos em citações apropriadamente referenciadas. Pena (para PPC) é que ANL aproveite depois os mesmos materiais para fazer postas na blogosfera. Um bonito exemplo é este.
28.7.10
fiz minha casa no teu cangote
Céu canta. Fica de olho nessa menina.
Entretanto, no que toca à letra, cujo primeiro verso vai como título desta posta, a principal dificuldade para um não brasileiro será com o sentido de "cangote". Pode sempre ficar-se por esta definiçãozinha anatómica. Para ir mais longe: num desses fóruns que existem por aí na rede, alguém discutia como traduzir essa letra para inglês. Um propunha traduzir "fiz minha casa no teu cangote" por algo como "I built my house on the back of your neck/shoulders", outro respondendo assim: "Besides its straightforward anatomic meaning, this word bears a sensuous connotation associated with the fact that it is a zone of the body especially sensitive to sexual stimulation. I don't think you'll find an English word for that. On the other hand, I have a correction as far as anatomy is concerned. The choice that you made (back of the neck) is more apt to translate the word nuca than cangote. Cangote, actually, is the side of the neck, beneath the ear." Já perceberam que Céu não se propõe simplesmente pôr-lhe a canga, não é?
levantem-se os acusados
Acusados de quê?! De usarem a perseguição pessoal e política, disfarçada de justiça popular, para venderem "notícias" e/ou ganharem eleições, não por mérito próprio, mas por via de intoxicação.
Quer conhecer a lista parcial do que isso foi durante estes anos? Tem aqui uma amostra.
27.7.10
outras europas
Sérvia, Kosovo, a Jugoslávia que era, Titos e outros velhinhos, nacionalismos e internacionalismos... Enfim, um vislumbre de um debate no Vias de Facto, por João Tunes, Felizmente, agora não caíram bombas em Pristina. A ler incluindo os comentários.
a Turquia é o algodão da UE
Cameron faz defesa apaixonada da adesão da Turquia à UE.
MNE alemão entende que a Turquia não está pronta para aderir à UE.
O assunto da hipotética e sempre adiada adesão da Turquia à UE ganha em ser visto à luz da visão que os "grandes" têm do que deve ser "esta" Europa. É a questão de saber se a UE deve ou não ter unidade política e rumo estratégico enquanto actor na cena mundial.
A França quer que a UE tenha uma visão estratégica para o mundo - na medida em que acha que a sua (francesíssima) visão do mundo é a única razoável para a Europa e poderá ser assimilada pelos seus pares, tornando-se europeia a visão francesa.
A Alemanha acha tolice que a UE perca tempo a gerar internamente uma visão estratégica própria, quando seria muito mais fácil simplesmente adoptar a visão germânica já bem definida e pronta a consumir.
O Reino Unido prefere que a UE não tenha de todo nem unidade política nem visão estratégica, para que a política internacional do colosso infantil seja mais facilmente manobrável a partir de Londres e Londres possa prosseguir os seus interesses no mundo sem grande empecilho.
(Ah, finalmente, a Comissão Europeia. No actual estado de coisas, a Comissão pensa que a Europa ter uma visão do mundo é Barroso poder sentar-me à mesa dos grandes nas cimeiras internacionais.)
São estas reflexões que alimento quando parece discutir-se (ainda e ainda) o que fazer com a Turquia relativamente a deixá-la ou não entrar na UE.
afinal não é a esquerda europeia que é anti-americana, como a direita gostava de dizer na era G.W. Bush
O subsecretário do Tesouro americano, Lael Brainard, num discurso no Peterson Institute for International Economics, um think tank de Washington, opinou que não devemos ser demasiado lestos a fazer marcha à ré em termos de estímulos à economia, já que a recuperação à escala global ainda precisa de apoio. "O ritmo da estratégia de retirada tem de ser cuidadosamente calibrado. Temos que ter cuidado para não ter uma retirada acelerada demais." (aqui o discurso integral)
Para seguirmos a manobra habitual dos "pró-americanos de conveniência", deveríamos agora "denunciar" o anti-americanismo da senhora Merkel, do senhor Barroso e respectivos amigos (e amigos da receita de apertar o cinto até matar o doente). Para eles verem o valor de tal "argumento".
a Turquia na visão britânica
Cameron faz defesa apaixonada da adesão da Turquia à UE.
Trata-se de um indicador de que se pode esperar que a adesão da Turquia seria um factor de enfraquecimento da UE enquanto unidade política.
23.7.10
podemos aprender coisas com a Angelina Jolie, sim senhores
Podemos aprender que vale a pena defender a decência, sim , mesmo quando ela é atacada pela barbárie moderna.
(pista corporativa)
Sociedades Humanas, Sociedades Artificiais: Perspectivas da Convergência
Um dos resultados da minha estadia como investigador visitante na Faculdade de Filosofia da Universidade Complutense, em Madrid, acaba de ser publicado na Trajectos. Trata-se de um artigo, a quatro mãos com Javier Bustamante, intitulado "Sociedades Humanas, Sociedades Artificiais: Perspectivas da Convergência".
O resumo é como segue:
Historicamente, as ciências do artificial têm explorado as possibilidades de máquinas inteligentes serem intercaladas nas interacções sociais dos humanos e de interagirmos com elas com um tipo de postura que signifique a sua admissão à relação social. Sem nos determos nos aspectos tecnológicos desse cenário, consideramos um obstáculo fundamental que ele enfrenta: as instituições, como marca distintiva das sociedades humanas, continuam a não ser compreendidas pelas ciências do artificial. Contudo, a convergência das sociedades humanas para sociedades artificiais pode ser conseguida, não pelos avanços das máquinas inteligentes, mas pelo empobrecimento das próprias sociedades humanas. Esse seria o resultado da limitação das possibilidades de construção institucional à disposição dos humanos. Esse processo de “naturalização” da sociedade tenderia a encerrar-nos num mundo de uma só camada, negando a possibilidade essencial de modificarmos o enquadramento institucional como modo de mudar o mundo e a estrutura dos problemas que nos concernem. Essas duas vias são neste texto consideradas como perspectivas da convergência entre sociedades humanas e sociedades artificiais.Pode ser lido aqui:
Porfírio Silva e Javier Bustamante Donas, "Sociedades Humanas, Sociedades Artificiais: Perspectivas da Convergência", in Trajectos, 16, pp. 7-18
arte com mundos dentro
A propósito da inauguração (ontem) e da abertura ao público (hoje) da grande exposição retrospectiva de 30 anos de carreira da artista Ana Vidigal,Menina Limpa Menina Suja, no Centro de Arte Moderna (da Gulbenkian), com uma proposta que entra nos esconderijos das nossas memórias para nos dar a repensar aquilo que anda arrumado como se estivesse resolvido, deixo um pequeno vídeo (de Cristina Ferreira Gomes) sobre a montagem da exposição. E sugiro uma visita ao blogue-repositório da Ana Vidigal, onde podemos espreitar um pouco das coisas que lhe passam pela cabeça e pelas mãos.
22.7.10
uma lição de jornalismo
O jornal i, que acho que ainda está nas bancas, tem um sítio em linha. É bom que isso exista, permitindo-me ainda ir vendo ao estado a que aquilo chegou. Vejam esta "notícia": Adolescente troca telemóvel por Porsche. Além de ser um exemplo das coisas interessantes que a folha tem para nos contar, tem outros aspectos curiosos. Desde logo, o conteúdo desmente categoricamente o título. Quanto a isso, nada a assinalar: é procedimento hoje em dia habitual em vários "jornais de referência". Se podem fazer isso para falar de Sócrates, por que não fazê-lo para um puto americano igual a tantos outro? Mas a peça tem verdadeiras notícias: nos EUA um Porsche (não sei se o Porsche Boxster S mostrado na foto que ilustra a notícia) custa 7 mil euros. E eu a pensar que o dólar estava valorizado face ao euro...
a menina boa
Exposição MENINA LIMPA MENINA SUJA, de ANA VIDIGAL, a partir de amanhã no Centro de Arte Moderna da Fundação Gulbenkian.
Ana Vidigal é pintora e fala.
21.7.10
paradigmas, mas não com o cheiro relativista que costuma ter a noção
Propostas do PS e do PSD sobre Scut chumbam, portagens permanecem.
A história das SCUT é exemplar na política portuguesa. Como diria Thomas Kuhn, no seu melhor, é um paradigma: um caso concreto muito representativo, que mostra o essencial de uma família de entes no mundo, uma família de acontecimentos que podem ser estudados através desse exemplar. Colocando esse caso na mesa de operações e dissecando-o.
Do lado do governo, é exemplar de como se deixam apodrecer situações: por serem, podres, mais embrulhadinhas e mais difíceis de engolir.
Do lado do PSD, é exemplar de um novo significado para "responsabilidade". O maior partido da oposição faz voz grossa e apresenta uma proposta. Como é responsável, faz o que chama uma proposta "difícil": que se cobrem portagens em todo o lado. Mas, na outra face da moeda da responsabilidade, gostaria imenso que o governo fosse apedrejado nas ruas por cobrar portagens. Para isso tem, evidentemente, de se colocar de fora.
Claro, portagens é assunto para governos em funções. Assunto pequeno, por não ser coisa de festa. Para candidatos, limpinhos dessas miudezas e grandiloquentes na pose, constituições é que interessam. Grandes ideias. Pois.
dar um passo em frente
A máxima leninista "um passo em frente, dois passos atrás", frequentemente revista por gente cautelosa e de muita aritmética para "dois passos em frente, um passo atrás", tem muitas variantes. A variante anything goes é mais ou menos assim: o que é preciso é dar passos, seja lá para onde for. É a máxima da "política dinâmica", aquela cujo único efeito que lhe interessa é o efeito ventoinha.
Isto, a propósito do artigo de Marco António Costa, no Económico: O imobilismo do PS.
eu tembém tenho um projecto de revisão constutucional
Também alarga os poderes de alguns e também torna mais pequenos outros. E também insiste numa série de ideias feitas com muitos anos. A única diferença é que leva esta forma gráfica. Mas, tal como outros, também não é um original meu.
Roubado a Rainha Profana.
conversa indirecta, inversa, oblíqua, ortogonal e ...imaginária, claro está
Aviso de recepção para a posta restante, sff.
sinto-me desconfortável nesta companhia
Paulo Rangel tem "sérias reservas" à reforma do sistema político de Passos Coelho.
Mesmo assim, mau mau é mesmo que estamos a partir para o próximo ciclo politico com duas ferramentas básicas: nevoeiro e ventoinhas. O nevoeiro é para ocultar as reais questões da moral cidadã em falta. As ventoinhas... não, não são para dissipar o nevoeiro. Apenas para refrescar. Distrair. Para irmos andando e rindo a desenterrar as velhas bandeiras que nunca deram frutos nenhuns. Mas, também, se calhar as bandeiras não são para dar frutos...
Shaun-Tan, no álbum The Arrival
rever a moral cidadã, antes de rever a constituição
Vitor Costa, Subdirector do Diário Económico, na edição de hoje:
A história não é nova e não era muito difícil perceber que se iria repetir. O aumento do salário mínimo nacional para 2011 que está acordado entre os parceiros sociais e o Governo não se irá concretizar sem uma enorme dose de polémica.Vale a pena ler na íntegra: Os acordos têm de se cumprir.
Foi assim no ano passado. Será assim este ano. Tudo para que algumas poucas centenas de milhar de trabalhadores consigam ter um salário de 500 euros mensais.
(...)
Num país onde tão raramente se conseguem acordos em concertação, não cumprir este deixará um rasto de desconfiança para o futuro que será impossível de gerir.
19.7.10
notícias da Irlanda
Dan Boyle, presidente dos Verdes, o parceiro mais pequeno da coligação governante na Irlanda, disse ontem ao Sunday Tribune que talvez tenha de se repensar a meta de reduzir o défice para menos de 3% em 2014. Segundo Boyle, se calhar não é socialmente sustentável passar de 14% do défice em 2009 para um valor que respeite o PEC em tão pouco tempo. Volta assim a ser colocada a questão da presença do seu partido no actual governo.
17.7.10
uma reflexão de Paulo Portas sobre o debate do estado da nação
Em particular sobre o seu próprio desempenho.
Onde no final é que está a chave da peça.
Cena final de E la nave va (1983), de Federico Fellini.
16.7.10
famílias de teorias constitucionais
Eu sei que não devia perder tempo com certas coisas. Mas elas são tão ilustrativas que não resisto.
Vamos por episódios.
Parece que Pedro Lomba, no Público (sem link), terá acusado José Sócrates de ter "operado um golpe de regime no BCP".
O João Galamba deu-se ao trabalho de lhe explicar até que ponto isso era meter os factos na gaveta e delirar à rédea solta.
Mas, e agora vem o meu ponto, lê-se lá nos comentários ao texto do Galamba esta pérola:
O Estado não tem, segundo a constituição, obrigações de fiscalização nestas matérias?Fico à espera que o comentador seja convidado por Kim Jong-il para ensinar teoria constitucional ao herdeiro nomeado para continuar a dinastia norte-coreana.
O 1º Ministro não é o responsável máximo desse mesmo Estado?
Então, qual a dúvida?
É obvio que José Sócrates é culpado, e até quem sabe, conivente com interesses pessoais na "matéria".
Fica o caro leitor avisado: se algum vier a ser PM deste país, e eu andar por aí a roubar melancias, o caro leitor é que será o responsável.
É este o estado da "opinião".
proteccionismo imaginativo
A propósito de UE, espanhóis, PT, interesses estratégicos nacionais, e coisas que tais, tem vindo aqui à baila o tema do proteccionismo económico. Especialmente na variante proteccionismo disfarçado, do tipo "nós assinamos todos os tratados, para obrigar os outros também a assinar, mas tudo faremos para os ludibriar". É que "o que é nacional é que é bom". E, por serem assim as coisas, temos dito que andam mal os que fazem gala de apontar o dedo acusador contra Portugal, ou os portugueses, quando jogamos esse jogo. É que, em qualquer jogo, uma parte do combate consiste em, dentro do respeito básico pelas regras, não sermos tansos: não ignorarmos quando as outras partes usam manhas para distorcer o contrato.
Serve este arrazoado como intróito ao reporte da mais recente notícia que tenho, pela edição semanal da Visão, da imaginação proteccionista dos Estados Unidos.
Os States, onde não chegam as cautelas da inteligência nacional portuguesa, preparam-se para introduzir comboios de alta velocidade. E lançam para o efeito, como é de norma, concurso público internacional. O que, está bem de ver, comporta o elevado risco de que sejam empresas europeias, ou mesmo japonesas, a ganhar a possibilidade das interessantes empreitadas em causa. Perigo que, afinal, talvez não se concretize, dado o requisito "moral" introduzido no concurso: as empresas concorrentes não poderão ter, durante a II Guerra Mundial, transportado judeus, soldados americanos ou quaisquer outros "passageiros involuntários" para campos de concentração. Mesmo que, como anteriormente já tenha sido lembrado, essa "cumplicidade" tenha sido importa pelas autoridades nazis, na Alemanha ou nos países ocupados, usa-se assim um pretexto moral como exercício de proteccionismo.
Espera-se que, desta vez, rasguem as vestes em público, com acompanhamento de grande choro, aqueles que se lamentam amargamente quando vislumbram alguma poeira de proteccionismo em práticas portuguesas.
(Entretanto, não devem acusar-me de anti-americanismo por esta crítica: essa acusação passou de moda, não sei bem por quê.)
15.7.10
só podem ter enganado o PR
Na Agenda do Presidente, na página oficial do primeiro magistrado, lê-se que "O Presidente da República recebe, em audiência pública, o Conselho Nacional de Juventude, por ocasião do seu 25º aniversário."
Só podem ter enganado o PR.
Onde se explica por quê.
a Alemanha em incumprimento?
Alemanha espera baixar défice para três por cento do PIB já em 2012.
Pensava que eram só os PIGS que estavam em incumprimento.
Afinal a Alemanha também tem défice excessivo. E se fosse só isso.
A propósito, James K. Galbraith, hoje à Visão:
«A Europa, como um todo, tem uma balança comercial equilibrada com o exterior. Mas, dentro da Zona Euro, a Alemanha tem uma balança claramente superavitária. E isto quer dizer que o resto da Zona Euro terá uma balança deficitária, na mesma proporção. Não é possível o superavit alemão sem o défice dos outros países. São imagens de espelho do ponto de vista contabilístico. Isto quer dizer, muito claramente, que se os alemães querem ter superavit, terão de suportar as dívidas dos outros.»Vale a pena ler tudo.
bebi muito ontem à noite, de certeza
O Público, numa notícia intitulada PSP detém 14 pessoas nos transportes públicos de Lisboa, escreve coisas como estas:
"foram efectuadas quatro detenções por falta de habilitação legal para condução"... mas, quem?! os utentes?! os condutores do Metro?! da Carris?!
"Quanto às restantes detenções, todas de apenas uma pessoa..."O que é que isto quer dizer? Que não havia siameses entre os detidos?
Frequentar muito ambientes de engenheiros deve estar a retirar-me a elasticidade hermenêutica de outros tempos... Ou então foi dos copinhos de Carlsberg que distribuíram ontem no Cabaret Hamlet no CCB/Festival de Almada...
notícias para todos os gostos
A taxa de abandono escolar precoce em Portugal foi 31,2 por cento em 2009, menos 4,2 pontos percentuais que em 2008 e menos 13,7 que em 1999, mas é ainda assim mais do dobro da média europeia, revelou hoje o Eurostat. (Público)
Estas notícias servem todas as inclinações. Servem, por exemplo, para algumas personagens falarem como se estivessem azuis de raiva pelo atraso do nosso país. Mesmo que nem um pingo de sangue vertam pelo esforço de avançar.
a conversão do BE e do PCP às virtudes do capitalismo global
Oposição acusa Governo de favorecer JP Sá Couto no negócio do Magalhães.
E lê-se ainda no Público:
«O deputado do Bloco de Esquerda (BE) Pedro Filipe Soares acusou o Governo de ser “responsável pela criação de um clima de favorecimento à JP Sá Couto”, empresa a que foi responsável pelo fabrico dos computadores Magalhães, sem que tivesse havido um concurso público.»
«O deputado do PCP Bruno Dias afirmou que “o Governo preparou o caminho de sentido único para a adopção do computador Magalhães”. “É tempo de por um ponto final neste regabofe de negócios sem transparência”.»
Vamos supor que é verdade. Se for verdade, isso quer dizer que o governo estava realmente a fazer - finalmente! - aquilo que qualquer país com dois dedos de testa faz: encontrar caminhos, por entre os dedos da "globalização", para proteger as empresas nacionais, e respectivos trabalhadores a precisar de emprego, e para não entregar o dinheiro dos seus contribuintes, com todo o desvelo, a empresas estrangeiras. É o chamado proteccionismo encapotado, que tem de ser praticado enquanto for praticado, como realmente é, pelos outros países.
Quando, em negócios como o da Vivo-Telefónica-PT, alguns clamam que o governo devia, em vez de usar as acções douradas, ter encontrado outras maneiras de resolver o problema por antecipação, é desse tipo de coisas que estamos a falar: encontrar "esquemas" que respeitem o enquadramento legal anti-proteccionista mas não favoreçam a vida aos outros contra as nossas empresas e o nosso emprego. É por esse proteccionismo encapotado que a esquerda da esquerda está sempre a clamar, reclamando contra as maldades da globalização e clamando como somos mal tratados pelo selvagem capitalismo global.
É por isso que, neste caso, compreendemos a direita: se Passos Coelho vai a Espanha para apertar a mão aos compatriotas da Telefónica no meio de uma disputa por interesses estratégicos para Portugal, por que há-de o PSD preferir que os computadores sejam de uma empresa portuguesa em vez de serem de uma empresa espanhola? É coerente.
Já, no caso do PCP e do BE, estamos perante uma enorme desonestidade política. Agem contra os mais altos princípios de que se reclamam "na generalidade". Mas, "na especialidade", continuam a lutar com denodo para salvar a coligação negativa.
Alessandro Bavari, da série Sodoma e Gomorra
ask the British
As autoridades britânicas estão a rever os mecanismos e procedimentos de supervisão do sector financeiro. A Autoridade para os Serviços Financeiros vai ser substituída por uma unidade dedicada à actividade prudencial localizada no banco central e por uma nova Autoridade para os mercados e para a protecção do consumidor. Espera-se que a reforma permita, no futuro, antecipar mais e melhor os problemas em gestação. Contudo, uma fonte do Banco de Inglaterra afirmou que esta reforma, nem nenhuma outra, evitará com certeza novas falências; tal como não indicará aos investidores o risco que realmente estarão a correr em cada uma das suas decisões. Adair Turner, chefe da autoridade de serviços financeiros, foi muito claro: não há forma de proteger os consumidores de tudo o que pode correr mal. As questões em cima da mesa são de outro tipo. Por exemplo, se queremos mais estabilidade financeira, temos de aceitar uma menor escolha para os consumidores de serviços financeiros - e assumir isso.
Alguém poderá, por favor, explicar a certas pessoas aqui em Portugal o que isto quer dizer? Refiro-me aos que acham que, quando há problemas no mercado, isso quer dizer que a supervisão teve necessariamente culpa. Sublinho: necessariamente. A supervisão pode ter culpas, mas para concluir isso é preciso indicar concretamente o que devia ter sido feito, à luz do que se sabia e das regras aplicáveis, e foi negligenciado. Noutro caso, o barulho contra a falta de omnisciência e de omnipotência da supervisão é pura demagogia. E falta de interesse em ir às questões que importam: por serem reais e poderem ser enfrentadas. Em vez de nos entretermos com os assomos de clarividência dos anjos de pacotilha.
Le 14 juillet
de "La vie en rose", sobre Edith Piaf
E, para o caso de me quererem fazer discursos, ainda digo:
13.7.10
Galbraith e os trabalhos de casa
James K. Galbraith, economista, esteve em Lisboa numa conferência promovida por uma fundação próxima do PS.
(A des/propósito: não vi lá nenhum dos Ladrões de Bicicletas, que gosta/va/m tanto dele, a ouvi-lo elogiar claramente o comportamento do governo português na resposta à crise.)
James K. Galbraith é filho de John Kenneth Galbraith, um economista muito conhecido que faleceu em 2006.
Contaram-me que, num dos canais de televisão cá do burgo, a senhora que, no sábado passado, fazia a reportagem da conferência introduziu a presença de James K. Galbraith dizendo que todos os alunos de economia nas nossas faculdades estudaram por livros dele.
Duas hipóteses interpretativas. Uma, a senhora não fez o TPC e não sabe distinguir o famoso mas enterrado John Kenneth Galbraith do vivo e activo mas ainda não tão famoso James Kenneth Galbraith. Duas, o PM, excitado com o apoio deste intelectual apreciado pela esquerda económica, mandou adoptar como sebenta os livrinhos deste americano que nos ajuda a desmentir completamente o propalado boato de que sejamos anti-americanos.
défices excessivos
A UE abriu procedimentos de défice excessivo contra mais quatro Estados-Membros: Chipre, Dinamarca, Finlândia e Bulgária. Agora, 24 dos 27 estão a ser "perseguidos" por esse mau comportamento. Só o Luxemburgo, a Suécia e a Estónia escapam.
E eu a pensar que isto só acontecia a Portugal, por culpa do malandro do Sócrates...
oligopólio, diz Trichet
Pensava eu que o pudor do presidente do Banco Central Europeu o impedia de usar certos termos, apesar de esses termos estarem bem ancorados em alguma das ferramentas teóricas que melhor calham ao palato dos economistas da moda. Trichet disse, em entrevista ao francês Libération, (aqui, para pagantes), que é tempo de acabar com o oligopólio à escala mundial em termos de agências de rating. Ele explica que apenas três agências, com impacte global, têm agido no sentido de amplificar quedas e ganhos nos mercados, assim agindo contra a estabilidade financeira.
Oligopólio, disse ele. Já era tempo de começar a chamar os bois pelos nomes. Mas usando os termos técnicos, para que eles percebam.
(Claro, resta sempre a seguinte dúvida: então não era o sacana do Sócrates que tinha lixado a economia mundial?)
Actualização. A entrevista integral a Trichet encontra-se em linha, em livre acesso, aqui. Obrigado pela indicação, Želimir. Como é bom ter leitores fantásticos!
e se os rumores fossem via TV em vez de via SMS?
DIAP classifica como prioritária queixa do BCP sobre rumores relativos à saúde financeira do banco.
Acho bem. Contrariamente aquilo que parece pensar uma certa esquerda da esquerda, a saúde financeira dos bancos não interessa apenas aos ricos.
O ministro das finanças acha esses rumores criminosos. Concordo. No que toca a tentativas de destruir as instituições, tem havido muitos actos criminosos nos últimos anos cá neste país.
temos um doutor em economia no mais alto cargo
Para o caso de ainda não terem sentido o júbilo que isso nos devia causar, e estarem um pouco perplexos por essa vossa/nossa falta, deixo-vos com a seguinte citação sobre o irrealismo da economia ortodoxa:
« O certo é que já passou o tempo em que os economistas podiam analisar em detalhes dois indivíduos trocando nozes por amoras na orla da floresta e depois sentir que a sua análise do processo de troca era completa, por muito instrutiva que a análise pudesse ser em certos aspectos. »Quem disse isto foi Ronald H. Coase, na conferência de aceitação do Prémio Nobel da Economia, 1991 (disponível aqui, para reverem a tradução livre)
bons serviços
Disputa pela Vivo: Telefónica ameaça travar negociações com PT e dividir Basilcel, que controla 60 por cento da Vivo.
Será o resultado dos bons serviços de Pedro Passos Coelho em Espanha?
Le premier bonheur du jour
Presidente da Câmara do Porto: 200 mil euros que deviam ser investidos no Red Bull vão para a habitação social.
Red Bull faz a política social de Rui Rio.
Isto, enquanto outros fazem a política social de Pedro Passos Coelho: Ernâni Lopes, numa intervenção para que foi convidado nas jornadas parlamentares do PSD, defende corte de 15 a 20% no salário dos funcionários públicos.
Os mutantes - Le premier/dernier bonheur/malheur du jour
Conselho Nacional de Juventude: Juventude sem Memória?
Segundo se diz no seu sítio oficial, o Conselho Nacional de Juventude (CNJ) é a Plataforma representativa das organizações de juventude de âmbito nacional, abrangendo as mais diversas expressões do associativismo juvenil (culturais, ambientais, escutistas, partidárias, estudantis, sindicalistas e confessionais).
Nesse mesmo sítio oficial do CNJ, e em outros dos seus meios institucionais, afirma-se que foi criado a 15 de Julho de 1985. Parece que até se preparam para comemorar esta semana os 25 anos. Bonita data, sem dúvida. Não fora… que a história não está nada bem contada. Vejamos.
A primeira data que o CNJ inscreve no seu historial, tal como ele consta por exemplo do seu sítio oficial, é apresentada deste modo:
15 de Julho de 1985 - Ano Internacional da Juventude - Realiza-se, no Hotel Diplomático, em Lisboa, a Assembleia Constituinte do Conselho Nacional de Juventude, São eleitos os primeiros titulares dos órgãos estatutários: Carlos Coelho, da JSD, Presidente da Mesa da Assembleia Geral; António Eloy, dos Amigos da Terra, Presidente do Conselho Fiscal; António José Seguro, da JS, Coordenador do Secretariado Executivo, que conta ainda com representantes da ACM, AEP, CKIE, Intercultura, JC e JSD.
Então, o que está errado?
É "apenas" isto: a 27 de Janeiro de 1983 – portanto, mais de dois anos antes da “constituição-agora-oficial” - , foram subscritas as Bases Gerais de Constituição do Conselho Nacional de Juventude pelas seguintes organizações: Juventude Socialista, Juventude Comunista Portuguesa, Juventude Centrista, Juventude Monárquica, Juventude da União de Esquerda para a Democracia Socialista, Juventude de Acção Social-Democrata, Departamento de Juventude da CGTP-IN, Departamento de Juventude da UGT, Movimento Católico de Estudantes, Juventude Operária Católica, Juventude Agrária e Rural Católica, Corpo Nacional de Escutas, Associação Guias de Portugal, Amigos da Terra.
Esse acto, subscrição das Bases Gerais, resultou de um intenso e produtivo trabalho preparatório. A primeira reunião desse processo teve lugar a 3 de Junho de 1982 e, em apenas nove encontros em tão poucos meses, foi possível um acordo tão alargado como aquele que reflecte a lista de organizações subscritoras acima apresentada.
Nas mencionadas Bases Gerais, o CNJ, além de se declarar autónomo do poder político, pretendendo permanecer independente de qualquer organismo estatal, enunciava como seus objectivos fundamentais constituir um espaço de intercâmbio entre as organizações de juventude portuguesas, ser um instrumento para dar corpo e voz às aspirações da juventude portuguesa, contribuir para o desenvolvimento do associativismo juvenil, assumir-se como interlocutor perante os poderes públicos, assumir a troca de experiências com organizações congéneres de outros países.
Entretanto, por razões que genericamente acho poder descrever como ligadas à luta política entre organizações de juventude partidárias e à luta política dentro de certas organizações de juventude partidárias, alguém decidiu refundar o que já estava fundado. O que, de caminho, ajudou a compor o CV de “herói da juventude” a algum ou alguns dos sempre-jovens da nossa praça. O que, enfim, é algo a que hoje alguns parecem estar habituados. Parece que até o Presidente da República vai apadrinhar, com a sua presença, os 25 anos de um CNJ que tem mais de 25 anos e que não nasceu como nos dizem que nasceu. Um CNJ com uma história oficial e uma história não-oficial escondida pelos pequenos estalines que abundam, agora armados de Photoshop para compor a história ao jeito.
Declaração de interesses. Fui um dos subscritores das Bases Gerais de Constituição do Conselho Nacional de Juventude, a 27 de Janeiro de 1983, integrando a representação da organização que tinha tomado a iniciativa de convidar as organizações de juventude para um processo de constituição do Conselho Nacional de Juventude. Não procuro reconhecimento, até por ter tido pessoalmente um papel mais do que modesto no processo, mas sinto algum enjoo pela persistência nesta falsificação da história. Tenho razões para crer que há, ou houve até há pouco tempo, dentro do CNJ, quem saiba desta história. Quem tenha inclusivamente lido os documentos que lá existem (existiam?) a evidenciar o verdadeiro processo de lançamento do Conselho Nacional de Juventude, a esclarecer o que esquecerem estes “jovens sem memória”. Entretanto, a construção persiste. Talvez seja preciso fazer a pré-história do CNJ...
12.7.10
não o critiquem, não vá ele desmanchar-se
PSD explica “ataques descabelados” a Passos Coelho com “desespero”. Segundo o Público, «Miguel Macedo, líder da bancada do PSD, abriu hoje as jornadas parlamentares com um forte ataque ao Governo e ao PS, pelos “ataques descabelados” ao presidente do partido, Pedro Passos Coelho a propósito do negócio PT/Telefónica na Vivo.»
Depois da suspensão da democracia por seis meses, uma ideia notável da anterior presidente do PSD, agora queriam uma suspensão das críticas a Passos Coelho durante seis meses, era? Na realidade, o homem disse tanto disparate neste assunto, com manifesta imponderação, que mais valia deixá-lo andar e estatelar-se. Mas, daí a exigir o pudor constrangido do resto do mundo para os disparates do senhor, parece-me exagerado.
onde o senhor Semeta e de lá não saia
Os ministros das finanças da Alemanha e da França, perigosos comunistas representando dois Estados notoriamente soviéticos, divulgaram na sexta-feira passada uma carta (dirigida à Presidência Belga, na pessoa do respectivo ministro das finanças) apelando a que a EU avance com os planos para introduzir a taxa sobre as transacções financeiras. O comissário europeu Algirdas Semeta, em declarações hoje ao Frankfurter Allgemeine Zeitung (link para pagantes), para explicar por que não se nota que tenha feito o trabalho de casa nessa matéria, diz que é preciso ter cuidado, não nos apressarmos com tal iniciativa, pois que é muito fácil pedir tais coisas mas a Comissão Europeia tem de se assegurar de que não se tomam decisões absurdas. O argumento é, como sempre, que isso pode afectar a competitividade dos centros financeiros europeus. A chantagem do costume, feita para dar argumentos aos que, do lado da política, estão sempre assustados em fazer qualquer coisa que discipline os mercados – por gostarem mais que sejam os mercados a “disciplinar” os países (nos intervalos de estarem a receber massivos apoios financeiros dos respectivos orçamentos). Parece que lá para os lados da Lituânia, de onde vem o senhor Semeta, a ideia parece nova e nunca estudada. Daí que, claro, seja preciso ter muito cuidado. Estas declarações vêm mesmo a tempo para sublinhar a boca muito aberta de Durão Barroso quanto à acusação de estar a Comissão Europeia numa linha ultraliberal. Uma acusação descabidíssima, claro está.
(Este é mais um apontamentos da série O protão é mais pequeno do que se pensava e por enquanto ninguém sabe porquê.)
(Este é mais um apontamentos da série O protão é mais pequeno do que se pensava e por enquanto ninguém sabe porquê.)
o golo do guarda-redes
Iker Casillas entrevistado por Sara Carbonero após a final do Mundial de Futebol da África do Sul, onde a Espanha venceu justamente com uma preciosa contribuição deste seu guarda-redes, que se opôs com sucesso a duas evidentes oportunidades de golo dos holandeses. No princípio, a propósito da entrada a perder da Espanha na competição, ainda houve quem criticasse a presença da namorada nas imediações, que teria distraído o capitão da sua tarefa de proteger as redes. Como se fosse possível impedir tal coisa. Depois de passadas todas as provas, Casillas pôde saltar de mansinho por cima de todos os "desportivamente correctos" e fazer aquilo que humanamente lhe apetecia, para lá dos papel que a cada um estava destinado. Não parece que a jornalista tenha desgostado. Bom golo.
Aditamento. O Adolfo Palma fez o seguinte comentário a esta situação: "Entrevistar o namorado não está lá muito de acordo com a deontologia jornalística, mas o beijo acaba por salvar a coisa porque funciona como declaração de interesses."
9.7.10
da série do protão
Segundo a Lusa, o presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, reforçou hoje que o direito comunitário é também um direito português, lembrando que as 'golden share' são "contrárias" ao Tratado de Lisboa.
Ora, o processo C‑171/08, no qual Portugal foi dado como estando em incumprimento por causa da existência da golden share na PT, teve início numa iniciativa da Comissão Europeia que deu entrada no Tribunal em 21 de Abril de 2008, enquanto o Tratado de Lisboa entrou em vigor a 1 de Dezembro de 2009.
As datas confirmam que Barroso, longe de estar a fazer uma apreciação pertinente e justa sobre o caso, estava a fazer baixa política.
(Este é mais um apontamentos da série O protão é mais pequeno do que se pensava e por enquanto ninguém sabe porquê.)
Notícias da Polónia. Ser liberal não é ser parvo.
O partido no poder na Polónia (Plataforma Cívica) tem até agora sido considerado como a força política polaca mais entusiasta das privatizações. O governo polaco queria, de facto, privatizar empresas de sectores como a produção de electricidade, minas, química e farmacêutica. E esperava, com isso, realizar, só em 2010, um montante próximo de metade do défice orçamental previsto para este ano. Além desse factor pragmático, a orientação privatizadora é também uma marca política da Plataforma Cívica relativamente ao partido de oposição Lei e Justiça. Contudo, esse impulso não tem avançado ao ritmo previsto. A interpretação que até recentemente se dava ao facto de nunca mais se concretizar a prevista venda massiva de empresas públicas era, pois, a crise económica. No aspecto capacidade e disponibilidade dos potenciais compradores para se disputarem o suficiente para encher os cofres do Estado.
Contudo, nos últimos tempos o governo tem sinalizado uma mudança de sua filosofia neste assunto. O governo ainda quer privatizar, mas sem perder o controlo de um certo número de grandes empresas. O ponto de viragem teve um sinalizador muito vivo no caso do BZ WBK, um dos mais importantes bancos comerciais polacos, que, aparentemente, pode voltar à esfera de influência estatal. É que o (de longe) maior accionista do BZ WBK, a irlandesa AIB, ficou em dificuldades quando chamada a repor parte das ajudas estatais que recebera e, no aperto, anunciou querer vender os seus activos na Polónia. Ora, sabido isto, o governo, que já detém a maioria do capital do maior banco polaco, o PKO BP, veio dizer que queria tomar posição no BZ WBK. Se isso se concretizar, o resultante PKO BP ficará com cerca de 10 milhões de clientes e tornar-se-á um dos maiores bancos da Europa Central. Para que as coisas não corram mal, o Supervisor do Sector Financeiro Polaco já se terá posto a caminho da Irlanda para arranjar uma solução sem problemas para nenhuma das partes – de modo a deixar pendurados concorrentes esperados como o HSBC, o Santander, o Deutsche Bank ou a Nordea.
A alma da nova estratégia parece ser o peso-pesado Jan Krzysztof Bielecki, que deu recentemente uma entrevista ao diário Gazeta Wyborcza declarando, nomeadamente, que o Estado terá de manter o controlo sobre umas 20 grandes empresas, economicamente estratégicas. Acrescentou, na ocasião, que é perigoso deixar que os estrangeiros tomem conta da banca. Não deixou de reconhecer que era preciso corrigir os erros de gestão que muitas vezes contaminam as empresas que dependem do jogo político, mas defendeu que esse problema devia ser atacado com mais profissionalismo das administrações. Confrontado com a linha política anterior, perguntaram-lhe se tinha mudado de opinião. Ele respondeu que o que tinha mudado era a situação e que a situação é que lhe ensinava o que era necessário fazer.
É, não é?
a banalidade
Eduardo, não é blasfémia. É apenas banalidade. Para quando deixarmos de ir a correr na esteira de qualquer media dúzia de fotografias de paupérrima qualidade, tão somente por as mesmas se acobertarem a uma alusão sem qualquer subtileza a uma suposta blasfémia?
As Soluções do Socialismo Democrático para a Crise Económica
É uma conferência. Começa hoje à tarde, em Lisboa.
Intervirão, entre outros: Andreas Schieder (Secretário de Estado das Finanças da Áustria), João Leão (Gabinete de Estudos e Estratégia do MEID), Stephany Griffith Jones (Columbia University), Kelly Ross (AFL-CIO), James K. Galbraith (Lyndon B. Johnson School of Public Affairs), Maria João Rodrigues, Ruairi Quinn (Partido Trabalhista da Irlanda), Pervenche Beres (Comissão de Emprego do Parlamento Europeu), Göran Persson (ex Primeiro-Ministro da Suécia).
Programa aqui.
coisas para as quais serve o Parlamento Europeu
Uma das razões que levam muitas pessoas a depreciarem o papel do Parlamento Europeu é muitas vezes não ser fácil saber o que por lá se faz. Daí que seja sempre bom termos informação sobre isso. Daí sugerir a leitura de Uma derrota anunciada, de Rui Tavares. Começa assim: « Um bom zombie nunca morre à primeira ».
8.7.10
coisas que vamos aprendendo
O protão é mais pequeno do que se pensava e por enquanto ninguém sabe porquê.
Este assunto da PT e da Vivo e das acções douradas e do proteccionismo e dos espanhóis e do Tribunal Europeu e coisas mais tantas em rebuliço - teve dois aspectos assinaláveis, que talvez tenham mais interesse para o futuro do que aparentam de momento.
Primeiro: o líder do Governo e do PS ensaia um discurso mais à esquerda do que é seu costume. Embora a governação não seja menos de esquerda por lhe faltar a prosápia correspondente, nem o discurso impacte necessariamente na realidade com a força desejada, vamos apreciar com expectativa o rumo que dará no futuro José Sócrates à sua determinação contra os desvarios neoliberais. Em especial, quando chegarem à mesa as novas privatizações.
Segundo: o líder do PSD exibiu fragilidade (inconsistência entre os grandes princípios e as questões concretas), ligeireza excessiva em assuntos decisivos (ir para Espanha fazer negaças ao governo do seu país no meio de uma tempestade político-empresarial ibérica), incapacidade para dominar os seus generais e coronéis (não sei se foi mais embaraçante um Relvas mais papista que o presidente ou Teixeira da Cruz a apoiar o Governo). Deste modo, Pedro Passos Coelho teve a sua primeira oportunidade para mostrar impreparação e imaturidade. E não perdeu pitada dessa oportunidade.
direitos adquiridos
«Quem quer mandar em empresas não as privatiza. Quem as privatiza não as renacionaliza depois.» Pedro Santos Guerreiro, Jornal de Negócios Online
Pois. A história é para ser um beco sem saída: a gente mete-se lá e, quando dá conta que se enganou, nada a fazer. Salvo esfregar o cocuruto da cabeça contra a parede até sangrar.
Percebe-se o ponto. A ideia de que pode não ser boa estratégia o Estado prescindir de todos os seus meios de influenciar directamente aquilo que na economia interessa a todos, e não apenas aos accionistas, está a fazer um inesperado caminho entre nós. Não por força de perversas mentes ideológicas, mas pelo exemplo de casos concretos. Corre-se, portanto, o risco - matutam alguns - de que algum governo mais afoito pense em retomar esta ou aquela rédea solta. Vai daí, acrescente-se um artigo à teoria: privatizar é possível, nacionalizar é proibido. Ardeu, ardeu: no privado não se toca, mesmo que o interesse comum esteja em causa.
Quer dizer: direitos adquiridos para capitalistas!
golden share na PT: Portugal perde no Tribunal Europeu
Já foi divulgada a decisão do Caso C-171/08: o Tribunal de Justiça deu razão à Comissão Europeia contra Portugal. Conclusão: os direitos especiais contrariam a liberdade de circulação de capitais.
Aa propósito das golden shares como malvado-instrumento-proteccionista-que-todos-os-bons-liberais-de-ginjeira-querem-atirado-às-urtigas, apetece-me relembrar um piquenito episódio além fronteiras.
Quando, em Outubro de 2007, o Tribunal Europeu deu razão à Comissão Europeia contra a Alemanha na questão da "Lei Volkswagen" (processo explicado aqui), a Porsche, que andava de olho na Volkswagen, exultou: The move opens the way for Porsche, a 31 per cent stakeholder, to gain control of VW.
Mas, como é sabido, a história não acabou aí: Volkswagen to buy 42 percent of Porsche, full merger planned.
Ah, pois. O problema é que nós somos quem somos: temos muita vergonha de ter interesses estratégicos que não sejam os interesses estratégicos dos outros. Ou de apenas alguns. Por disso se fazer o barulho dos comentadores, mais perdemos.
dar-se ao respeito
Telefónica quer negociar com PT para concretizar operação da Vivo.
O que só mostra que Portugal, pela mão do governo, fez bem em dar-se ao respeito. A pior táctica em negócios é ser tomado por tanso - que seria o caso se não tivéssemos usado as armas que tínhamos ao nosso dispor.
espanholismos | comam tapas que isso passa
Para dizer a verdade, acho um bocado parola a tentativa de arrancar agora uma onda de anti-espanholismo a propósito da PT. Vitalino Canas acusa Passos Coelho de se “ajoelhar” perante os interesses espanhóis. Dadas as relações entre os dois governos, só pode ser contraproducente.
Não obstante, se isto quer dizer que António Nogueira Leite partilha esta opinião sobre o interesse da PT para o país, começamos a compreender donde vem o chorrilho de contradições do PSD neste assunto. Vem do conselheiro do príncipe, directamente.
Todas as ocasiões são boas para compreender as equipas que se preparam para o jogo. Estou a pensar se sofro pela Espanha ou pela Alemanha.
accionistas de Portugal
«Assumindo que é contra a existência de uma golden share na PT ou noutras empresas, o líder do PSD considerou que era importante manter a participação da PT na brasileira Vivo. Mas, sublinhou, que a decisão de vender essa participação foi tomada pelos accionistas, “maioritariamente portugueses” e que “o que Estado português fez foi impedir que essa decisão dos accionistas fosse para a frente”.» (Público)
Acho que Pedro Passos Coelho está a levar longe demais as suas confusões acerca deste caso. Agora parece confundir os accionista da PT com "accionistas de Portugal". Se acha que os accionistas podem fazer o que lhes der na gana para receber o pilim de que precisam, compreendemos: andam muitos portugueses na mesma aflição! Já, se pensa que desse modo resulta uma automática defesa dos interesses nacionais, acho que está a baralhar os planos. Aconselho amigavelmente o presidente do PSD a ler este pequeno apontamento.
Desencontro, Jorge de Sena
Só quem procura sabe como há dias
de imensa paz deserta; pelas ruas
a luz perpassa dividida em duas:
a luz que pousa nas paredes frias,
outra que oscila desenhando estrias
nos corpos ascendentes como luas
suspensas, vagas, deslizantes, nuas,
alheias, recortadas e sombrias.
E nada coexiste. Nenhum gesto
a um gesto corresponde; olhar nenhum
perfura a placidez, como de incesto,
de procurar em vão; em vão desponta
a solidão sem fim, sem nome algum -
- que mesmo o que se encontra não se encontra.
Jorge de Sena
invenção para os dias quentes
Estando encalorado, use este dispositivo.
Estando fervente, use este dispositivo mais sofisticado sugerido pela Ana Vidigal.
outras PTs, outras acções douradas, outros nacionalismos
A propósito desta procissão que ainda vai no adro que é a estória das acções douradas do Estado na PT, e o seu uso no caso da Vivo, parece interessante ir olhando para outras regiões do complexo puzzle que está tecido, designadamente em termos de União Europeia. Por ora, damos aqui alguma informação acerca da chamada "Lei Volkswagen", um imbróglio que está longe de concluído, e que servirá provavelmente para futuras reflexões sobre a matéria.
A “Lei Volkswagen”, promulgada em 1960 e revista várias vezes, foi a via encontrada pela Alemanha para “enquadrar” a privatização da construtora automóvel. Era aí montado um esquema com vários elementos para proteger a germanidade da empresa. A saber: o Estado Federado da Baixa Saxónia fica com 20% das acções (a República Federal também teve acções, mas vendeu-as entretanto); há um tecto nos direitos de voto dos accionistas: independentemente do número de acções, nenhum accionista pode exercer mais do que 20% dos direitos de voto; qualquer decisão tem de recolher mais de 80% dos votos (contrariamente aos 75% exigidos no caso geral de empresas com uma protecção pública), o que, no contexto destas normas, garante uma espécie de direito de veto das acções detidas pelos poderes públicos; tanto o Estado Federado como a República Federal têm direito a dois lugares no conselho de administração.
Em 2005, a Comissão Europeia colocou a Alemanha no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, acusando-a de que este esquema atentava contra a liberdade de movimento de capitais e contra a liberdade de estabelecimento. Em Outubro de 2007, o Tribunal deu razão à Comissão na questão do movimento de capitais (mas não na questão da liberdade de estabelecimento).
O Tribunal, ao tomar a sua decisão, realça o facto de a dita lei ser considerada uma “medida nacional” por ela ser da exclusiva competência do Estado e só o Estado a poder modificar. E considera que o resultado do esquema, no seu conjunto – mesmo que composto por medidas que individualmente seriam aceitáveis – é limitar injustificadamente a liberdade de circulação de capitais. Especificamente, o Tribunal analisa as justificações apresentadas pela Alemanha: proteger os trabalhadores, proteger os accionistas minoritários, proteger o emprego criado pela actividade da empresa – e conclui que a Alemanha não conseguiu explicar a necessidade daquele esquema para proteger aqueles interesses que até seriam legítimos.
Depois de notificada, a Alemanha modificou a Lei Volkswagen, em Dezembro de 2008. Fê-lo, contudo, de forma que a Comissão Europeia considera insuficiente, designadamente por manter a “minoria de bloqueio” de 20% das acções. A Alemanha argumenta que o Tribunal só condenou a conjugação desse elemento com o tecto de votos limitado a 20%. A Comissão exige o desmantelamento de todos os elementos identificados pelo Tribunal e os serviços da Comissão têm considerado que há base para voltar a ir a Tribunal demandar a Alemanha – só que a Comissão propriamente dita (o colégio de Comissários) ainda não terá decidido o que fazer.
Posto isto, acho oportuno fazer notar algumas lições que este caso nos pode ajudar a extrair.
Noto que não há notícia de qualquer actor público na Alemanha – partidos, sindicatos, associações empresariais, opinião publicada – ter dirigido qualquer crítica ao governo da senhora Merkel por causa da interpretação restritiva que faz do acórdão do Tribunal Europeu.
Noto a ligeireza com que alguns por aí dizem que o "proteccionismo" de Portugal no caso PT lança a desonra sobre o nome do país nos mercados internacionais - quando, nos mercados, a grande desonra é ser tomado por parvo. Não me consta que a Alemanha tenha sido desonrada por casos como este.
Noto que os Estados podem arranjar maneiras de retardar a aplicação de decisões do Tribunal Europeu, ou mesmo de modular essa aplicação por via da interpretação das mesmas - e constato que, por cá, alguns pensam, e anseiam, que o céu nos caia em cima já a 8 de Julho no caso de uma decisão desfavorável. E noto, do mesmo passo, que não se está a dar suficiente peso ao valor da litigação como parte da defesa dos nossos interesses: talvez a Telefónica, se perceber a determinação portuguesa em lhe fazer perder a oportunidade do negócio por via do arrastamento da litigação, se convença a passar da estratégia da agressão para a estratégia da negociação. A não ser que os aliados da Telefónica estejam precisamente na direita portuguesa.
Noto que as razões invocadas para o "proteccionismo" da Lei Volkswagen - proteger os trabalhadores, proteger os accionistas minoritários, proteger o emprego criado pela actividade da empresa - devem parecer estranhas aos capitalistas lusos, que certamente não imaginam que um Estado europeu invoque tais "ninharias" para se dar a tanto trabalho.
(Para referência: o caso da Comissão contra a Alemanha por causa da Lei Volkswagen tem o número C-112/05.)
uma proposta moral alternativa
A conversa moral sobre o aborto, declinada em tom de chicana política, tem um novo argumento: os mesmos "tiranetes" que não querem proibir o aborto, querem importunar a prostituição.
Escreve CMF:
Este bando danado (...) chegou ao ponto de iniciar uma cruzada contra aqueles castiços anúncios de “massagens” que hoje inundam, e pagam, até o jornal mais orgulhoso.
O mercado particular em questão é a política espanhola, o porta-voz é um habitual destilador de ódio contra o governo do PSOE em especial, mas a ligação moral entre a condenação das leis de interrupção voluntária da gravidez e a defesa da livre publicidade à prostituição - constitui, para mim, um argumento novo. Na verdade, esta linha de raciocínio deve ser uma continuação dos ataques de CMF à ASAE, em que se distinguiu, já que a demanda continua a ser "a defesa da liberdade": Sobre a liberdade deste Admirável Mundo estamos conversados, diz ele. Para ele, trata-se da liberdade de "ir às putas". Claro que, para o governo do PSOE, e para os muitos cidadãos que em Espanha têm defendido a proibição dos anúncios encapotados à prostituição, não é essa liberdade que se trata de defender. Mas, claro, para este "insurgente" horrorizado com as leis de interrupção voluntária da gravidez, a liberdade de "ir às putas" é que interessa. Ou será mesmo a "liberdade de empreendimento"?
Brecht
O nosso leitor Želimir deixou o seguinte comentário ao post as obras e a graça do Espírito Santo:
Bertold Brecht: Melhor que roubar um banco, é fundar um.
Credo, que maldade...
Credo, que maldade...
as obras e a graça do Espírito Santo
Ricardo Salgado fala ao PÚBLICO sobre veto do Governo à venda da Vivo: "Foi o Governo que tomou a iniciativa, agora terá de assumir o processo".
O homem do Espírito Santo está preocupado com a PT. Até parece que é por isso que está muito aborrecido com o uso da golden share neste caso. Mas há uma pergunta, subjacente a este texto de Luis Rainha, para a qual não vejo resposta clara: se o pilim da venda da participação na Vivo era para ir para os accionistas, e não para a PT propriamente dita, que interesse teria a PT, como empresa, em tal coisa? Talvez se possa encontrar a resposta indo à procura da contradição entre os interesses financeiros de curto prazo e os interesses "industriais" de longo prazo (dar dimensão e horizonte à empresa). É que não há só uma "economia capitalista", mas várias. E não acredito na dedicação do Espírito Santo à causa dos interesses nacionais.
Devia haver um Nobel para o simplismo militante (*)
Um post.
Sobre os sacanas que nos governam. (Carlos Guimarães Pinto, n'O Insurgente.)
Uma leitura daquele post.
Os novos feijões mágicos: a venda da Vivo. (Luis Rainha, no Vias de Facto.)
(*) Proposta roubada a Luis Rainha.
5.7.10
pseudónimos e anonimatos
Dado o tamanho que atingiu a bolha do tema "pseudónimos e anonimatos" na blogosfera, bolha soprada pelos ideólogos da Caça aos bruxos, vejo-me obrigado a fazer um anúncio. E faço-o apesar de, manhosamente, nunca ter despertado qualquer suspeita.
O anúncio é como segue.
"Porfírio Silva", com que assino neste blogue e em outros lados, é um pseudónimo. Quando comecei a escrever com ele sabia que havia uma sepultura de uma pessoa com esse nome num cemitério de uma recôndita aldeia do concelho de Aveiro. Mas nunca pensei que acreditassem ser este o meu verdadeiro nome. Acho prudente, agora, "esclarecer" o assunto.
Peço desculpa ao tipo que tem, realmente, o nome de Porfírio Silva. Acredito, piamente, que este uso lhe tenha causado alguns amargos de boca. Espero que, em compensação, tenha também recolhido algumas alegrias.
Sobre a foto que tenho, também abusivamente, divulgado associada a este pseudónimo: em breve darei notícias.