30.11.07

Testar a hipótese da ordem social espontânea (4/5)

Continuamos com outra da série de experiências realizadas por Castro Caldas (2001) no âmbito do que vimos chamando um teste (com ferramentas de Inteligência Artificial) à “hipótese da ordem social espontânea”.



Problema de Cooperação

Vai agora ser introduzida uma nova situação experimental, lidando agora com um problema de cooperação, com um traço que podemos considerar qualitativamente diferente: a presença de um dilema moral (isto é, de uma situação em que o que é melhor para o colectivo não se impõe em si mesmo como melhor para o indivíduo), que implica o abandono do território da indiferença moral.

Caracteriza-se como segue esta situação experimental. Existe um grupo de indivíduos, os quais não podem comunicar entre si; a cada um é pedido que entregue uma contribuição monetária dentro de um envelope fechado e que anuncie (ao experimentador) o seu montante; o somatório das contribuições é multiplicado por um factor positivo (“investido”) e repartido por todos os participantes, na proporção da contribuição anunciada por cada um (sem tomar em conta a contribuição efectiva); a situação será repetida várias vezes. Se a contribuição de um determinado indivíduo for nula mas ele anunciar a contribuição máxima, o seu ganho será maximizado (em qualquer situação, não contribuir é sempre melhor). Resultados experimentais em circunstâncias similares mostram a emergência, com o tempo, do chamado “oportunismo não contributivo” – o que pode significar, a prazo, o fracasso do grupo. Novas simulações com o AG são compatíveis com os resultados obtidos empiricamente, no sentido mencionado.

Se isto é assim, porque é que na realidade existem inúmeras situações de acção colectiva sustentadas e sustentáveis ao longo do tempo e não (apenas) o desastre colectivo que estas experiências indicam que deveriam emergir da mera interacção espontânea de indivíduos egoístas? Castro Caldas vai investigar a resposta testando a “solução hobbesiana”: um contrato social negociado livremente, cuja garantia de cumprimento por todos é tarefa de um soberano. Precisa-se, pois, de um metagente.

Para a respectiva simulação (de novo com o AG-aprendizagem-social), a situação anterior é modificada para que o experimentador funcione como um metagente, no seguinte sentido: controla que a contribuição anunciada por cada indivíduo corresponda à sua contribuição efectiva; garante que a repartição dos resultados do investimento é proporcional à contribuição efectiva e não à anunciada; penaliza as falsas declarações. Mesmo sem concretizar para todos os indivíduos a possibilidade de controlo, o metagente consegue que as contribuições efectivas e declaradas passem grosso modo a coincidir: a “disposição moral” dos agentes torna-se elevada e a viabilidade do grupo é garantida.
Para além deste recurso ao metagente externo, é simulada uma metagência distribuída (controlo dos membros do grupo, no tocante ao respeito das regras partilhadas, por outros membros do grupo) – o que só funciona satisfatoriamente em situações com níveis elevados de “disposição moral” dos participantes (se o incumpridor for indiferente à reprovação dos seus pares, a censura social – na ausência de coação – não orienta o seu comportamento). O Autor conjectura, então, que o desejável seja a combinação da metagência externa com a metagência distribuída, uma vez que as regras sociais de emergência espontânea não parecem ser suficientes e, pelo contrário, parece ser necessária “a invenção deliberada de regras partilhadas que ou são assumidas enquanto obrigações pelos agentes ou lhes são coercivamente impostas” (Castro Caldas 2001:192).

Embora sem entrarmos aqui em detalhes, convém mencionar que Castro Caldas investiga o que chama “problemas da solução hobbesiana”, um dos quais se apresenta como segue. A presença do “soberano”, e a consequente padronização dos comportamentos individuais no respeito pelas regras, se for demasiado rígida pode traduzir-se numa solução não satisfatória para o problema da tensão entre exploração e pesquisa, isto é, pode ser incapaz de conciliar a coordenação inter-individual potenciadora da exploração eficiente dos nichos de recursos conhecidos com a liberdade individual que permite descobrir alternativas e respostas às mutações – sendo que essa liberdade individual tem de incluir o risco de erros e das suas consequências para o grupo. Castro Caldas simula, ainda com o AG-aprendizagem-social, situações que mostram a existência destes problemas e elenca três ordens de problemas da solução hobbesiana: (1) a coação conduz a uma uniformidade de comportamentos que pode traduzir-se em perda de adaptabilidade do grupo às mudanças do ambiente; (2) uma ordem social ineficiente mas vantajosa para uma coligação dominante pode ser sustentada ao longo do tempo; (3) uma ordem eficiente pode ser injusta.


REFERÊNCIA

(Castro Caldas 2001) CASTRO CALDAS, José Maria, Escolha e Instituições – Análise Económica e Simulação Multiagentes, Celta Editora, Oeiras, 2001





Postais anteriores nesta série: um , dois , três

29.11.07

Aeroporto de Lisboa

Ontem chegou aqui ao grupo um novo colega holandês que vem por umas semanas participar num projecto de investigação em curso. Sendo um jovem, é a primeira vez que vem a Lisboa e declarou-se assustado com a aterragem por ser "pelo meio das casas". Explicámos que, sim, a coisa tem de ser melhorada, já andamos a tratar de avançar para um novo aeroporto, mas está a demorar um bocadinho a decisão acerca da melhor localização. E ele: "pois, ninguém quer o aeroporto à porta de casa, não é?". Olhámos uns para os outros, pensámos "não podemos explicar todas as doenças de um país na primeira conversa" - e calámo-nos.

Testar a hipótese da ordem social espontânea (3/5)

Apresentamos agora as primeiras experiências, e as mais simples, realizadas por Castro Caldas (2001) no âmbito do que vimos chamando um teste (com ferramentas de Inteligência Artificial) à “hipótese da ordem social espontânea”.


Problema de Coordenação (versão 1)


Consideremos a seguinte situação: existe um grupo de indivíduos, os quais não podem comunicar entre si; a cada um é pedido que escolha uma de dezasseis cores, acção pela qual cada um receberá um pagamento; cada participante é informado de que o pagamento respectivo será calculado multiplicando um determinado montante fixo pelo número de indivíduos que tenham escolhido a mesma cor que o participante em questão; a situação será repetida um certo número de vezes e, de cada vez, os participantes podem mudar de escolha; entre repetições, os indivíduos são informados acerca de quantos participantes escolheram cada cor e dos pagamentos originados. Normalmente, nesta situação, todos os participantes convergirão para aquela cor que, acidentalmente, mostrou de início maior frequência – e nessa escolha se manterão. Esta situação foi simulada com o AG-aprendizagem-social e deu o resultado referido: a regra “escolher a cor x” emerge e impõe-se como uma regra partilhada (convenção). A hipótese da ordem espontânea parece funcionar.



Problema de Coordenação (versão 2)


Uma nova situação experimental corresponde à situação anterior, salvo num pormenor: o pagamento a cada indivíduo deixa de depender apenas da frequência com que foi escolhida no conjunto dos participantes a cor sobre a qual recaiu a sua própria escolha – passa a ser afectado também por um índice próprio de cada cor (do género: as cores são ordenadas de 1 a 16 e, todos os outros factores permanecendo iguais, uma escolha da cor número 16 é remunerada dezasseis vezes mais do que uma escolha da cor número 1). Os participantes não conhecem os índices atribuídos às cores, nem a forma exacta como eles contribuem para o cálculo do pagamento. A convergência da totalidade das escolhas para a cor número 16 é a mais favorável a todos os participantes – mas é de esperar que isso possa não acontecer. De facto, uma certa convergência inicial, acidental, para uma qualquer cor – mesmo que seja uma das menos remuneradas – cria um atractor que vai reforçar-se com o tempo: o peso de uma escolha muito frequente aumenta a sua atractividade e desincentiva qualquer participante a mudar de opção (mesmo que conheça a função exacta que determina o pagamento, a opção isolada pela melhor opção teórica é penalizada). Este resultado é confirmado por uma nova simulação com o AG-aprendizagem-social. Este resultado mostra que a solução “espontânea” encontrada pela mera prossecução dos interesses individuais pode ser, pela própria lógica da situação, uma solução ineficiente – e, talvez pior, mesmo os indivíduos que ganhem consciência da situação nada podem fazer para a modificar, uma vez que só lhes está disponível a acção individual (caso designado por “lock in” institucional). Isto, note-se, apesar de o melhor (respectivamente, o pior) para o indivíduo, ser também o melhor (respectivamente, o pior) para o grupo.



REFERÊNCIA
(Castro Caldas 2001) CASTRO CALDAS, José Maria, Escolha e Instituições – Análise Económica e Simulação Multiagentes, Celta Editora, Oeiras, 2001





Pode ler as anteriores notas desta série clicando aqui para a primeira ou clicando aqui para a segunda.

28.11.07

Uma moralidade (novela gráfica a quatro mãos - 6/6)


Na rua, enquanto os outros riam com a vingança ardilosa contra o descuido do automobilista, o cão mais velho lia para os outros uma passagem do Tratado sobre a Abstinência, que o filósofo Porfírio, nascido na Fenícia, escreveu no século III: "E, uma vez que isto se considera uma injustiça, que não se faça uso do leite, da lã, dos ovos, nem do mel. Porque do mesmo modo que é um delito tirar as roupas a uma pessoa, o mesmo acontece com o tosquiar de uma ovelha, pois a lã é a sua veste."
(FIM)



Desenho: Ruaz / texto: Porfírio Silva. Clicar para aumentar.


Gostaram? Podem encontrar mais desenhos - e textos também bons - deste mesmo autor (Ruaz) no blogue Homem do Farol, que se encontra listado, ali na barra lateral, entre as "Outras Casas". Et pour cause.

27.11.07

Uma moralidade (novela gráfica a quatro mãos - 5/6)

Acordei a meio da noite. Na cela em frente, acompanhada de dois matulões, a mulher que me atropelara, pouco vestida, bebia champanhe e dançava. Não estava nada com ar de doente. Donde viria a música?
(continua)




Desenho: Ruaz / texto: Porfírio Silva. Clicar para aumentar.

26.11.07

Uma moralidade (novela gráfica a quatro mãos - 4/6)


A única cela ocupada naquele piso (ou seria em toda a cadeia?) era a minha. Entre as sete e meia da manhã e as oito da noite ninguém disse nada, ninguém apareceu, o abandono total doía-me mais do que a fome e a sede. Apesar de vir de uma noite de borga, não consegui dormir o dia todo. Às oito da noite aparece um tipo (seria um guarda? mas estava vestido com um fato de treino ridículo, às riscas pretas e brancas, como uma zebra…) que me olhou sem uma expressão, sussurrou "até qualquer dia" e saiu. Deitei-me e acabei por adormecer. Sentia-me como um elefante doente deitado num quarto de hotel de quinta categoria.
(continua)




Desenho: Ruaz / texto: Porfírio Silva. Clicar para aumentar.

Testar a hipótese da ordem social espontânea (2/5)

O que andamos aqui a fazer, lendo uma obra de José Maria Castro Caldas, é seguir uma série de experiências de Simulação Multi-Agentes que pretendem fornecer elementos para discutir a hipótese da ordem social espontânea: será que a mera interacção de agentes que prosseguem exclusivamente o seu interesse individual, tal como ele é percepcionado individualmente, resulta necessariamente em soluções eficientes para os problemas colectivos?



Não entraremos aqui nos pormenores de construção da base computacional da experiência, que recorre ao Algoritmo Genético (uma técnica de evolução artificial). Contudo, sempre diremos que Castro Caldas define dois modelos para testar como é que agentes, em interacção com um grande número de outros agentes (numa “sociedade artificial”), aprendem a seleccionar um comportamento que responda o melhor possível à “função de utilidade” que para eles foi definida. Um “comportamento” é definido por uma “regra” que em cada momento tem como efeito aquilo que o agente faz ou deixa de fazer. O Algoritmo Genético (AG), como ferramenta de evolução artificial, é aplicado, pois, às regras que ditariam o comportamento dos agentes.

Num dos modelos, designado como AG-aprendizagem-individual, cada agente dispõe de um reportório de regras de comportamento que podem ser seguidas por esse agente (reportório de regras na mente de um agente). Trata-se, portanto, de um algoritmo genético de várias populações (de regras), tantas quantas os agentes simulados. O AG-aprendizagem-individual simula aprendizagem por reforço: para cada situação, um indivíduo dispõe de um reportório limitado de acções alternativas; as que forem testadas e negativamente avaliadas serão abandonadas; as que forem usadas e avaliadas positivamente continuarão a ser usadas; novas acções podem ser incluídas no reportório, para teste e avaliação e eventual uso posterior.


No outro modelo, designado por AG-aprendizagem-social, todos os agentes partilham o mesmo conjunto de regras de comportamento que podem seguir num dado momento. Pretende-se que representem o conjunto de possibilidades de acção que “a sociedade” conhece num dado momento. Trata-se de um algoritmo genético com uma única população de regras. O AG-aprendizagem-social simula a aprendizagem de um agente inserido num ambiente social, baseada na observação dos comportamentos de outros agentes e das respectivas consequências. Aqui só daremos relato dos resultados das experiências com o modelo AG-aprendizagem-social, mas as conclusões não são limitadas por esta opção.


Vamos apresentar várias experiências, cada uma delas com a seguinte estrutura: um tipo de problema “social” anteriormente estudado por outros meios é apresentado; o problema é traduzido numa aplicação do AG na sua interpretação comportamental; compara-se o resultado da situação que seria previsto pela hipótese da ordem social espontânea e o resultado produzido pela experiência multiagentes com AG.



REFERÊNCIA
(Castro Caldas 2001) CASTRO CALDAS, José Maria, Escolha e Instituições – Análise Económica e Simulação Multiagentes, Celta Editora, Oeiras, 2001






Pode ler a primeira nota desta série clicando aqui.

24.11.07

Porque hoje é sábado...



Hey, Jude, don't make it bad
Take a sad song and make it better
Remember to let her into your heart
Then you can start to make it better

Hey, Jude, don't be afraid
You were made to go out and get her
The minute you let her under your skin
Then you begin to make it better.

And any time you feel the pain, hey, Jude, refrain
Don't carry the world upon your shoulders
Well don't you know that its a fool who plays it cool
By making his world a little colder

Hey, Jude! Don't let her down
You have found her, now go and get her
Remember, to let her into your heart
Then you can start to make it better.

So let it out and let it in, hey, Jude, begin
You're waiting for someone to perform with
And don't you know that it's just you, hey, Jude,
You'll do, the movement you need is on your shoulder

Hey, Jude, don't make it bad
Take a sad song and make it better
Remember to let her into your heart
Then you can start to make it better

Na na na na na ,na na na, hey Jude...

23.11.07

A ciência não é um bicho de sete cabeças...

... mas este escorpião devia pesar uns 180 quilos.

O Ciência ao Natural, que é um blogue de primeira categoria, onde a ciência é bem contada por quem a faz, publicou ontem e ainda está fresco um post intitulado Quanta vida por descobrir - Escorpião com mais de 2,5 metros. Vale a pena ir lá ver/ler.

Uma moralidade (novela gráfica a quatro mãos - 3/6)


"Senhor guarda… eu não atropelei mulher nenhuma. Está no hospital? Mas foi ela que se atirou ao carro! Foi ela que me virou, como se eu fosse uma sardinha dentro da lata! Se eu estou a gozar? Mas como posso eu estar a gozar com uma coisa destas? Ela está muito ferida? Mas eu não fiz nada! Nada! Preso? Preso, como?!"
(continua)




Desenho: Ruaz / texto: Porfírio Silva. Clicar para aumentar.

22.11.07

Uma moralidade (novela gráfica a quatro mãos - 2/6)


Foi tudo muito brusco. A mulher de vermelho, afogueada, aparecida de um buraco qualquer, salta-me ao caminho pela esquerda. Esbaforida, corre contra o carro, grita-me qualquer coisa que não entendo (mas é de raiva), empurra o carro com uma só mão, não posso crer, o carro vira-se, estou de cabeça para baixo dentro do carro, a mulher grita "socorro! socorro! este malandro atropelou-me! estou desgraçada!". Desgraçada, ela?! Ora essa…
(continua)



Desenho: Ruaz / texto: Porfírio Silva. Clicar para aumentar.

21.11.07

Uma moralidade (novela gráfica a quatro mãos - 1/6)

Novela gráfica. Começa hoje e continua durante seis dias úteis consecutivos: desenhos de Ruaz e texto de Porfírio Silva.


6 da manhã. Conduzo, vagamente acordado, depois de uma noite de copos. Desço a rua dos eléctricos, carreiro metálico escorregadio que nos puxa para o rio ao fundo. O sol matinal cega-me os olhos pestanejantes. Não se vê vivalma. Apenas uma matilha de cães excitados vagabundeia.
(continua)




Desenho: Ruaz / texto: Porfírio Silva. Clicar para aumentar.

20.11.07

Acerca dos efeitos não intencionados de acções deliberadas

«Há decisões que se tomam e que se lamentam a vida toda e há decisões que se amarga o resto da vida não ter tomado. E há ainda ocasiões em que uma decisão menor, quase banal, acaba por se transformar, por força do destino, numa decisão imensa, que não se buscava mas que vem ter connosco, mudando para sempre os dias que se imaginava ter pela frente.»
Miguel Sousa Tavares, Rio das Flores, Oficina do Livro, Outubro de 2007, p. 527

Tempo de romãs

Selenite dixit: "novembro avança / em direcção à luz / mais breve". Ao alcance de um clique, aqui, no seu contexto.

Testar a hipótese da ordem social espontânea (1/5)

A nossa anterior série de postais, “Compreender o papel das instituições na vida social (para lá da teoria económica neoclássica)”, leva-nos a considerar as instituições.

Se admitirmos a existência das instituições e que elas, e não apenas os indivíduos, desempenham um papel na ordem social, na vida dos colectivos – ainda podemos admitir que as instituições sejam, simplesmente, o produto emergente da interacção espontânea entre agentes individuais. José Maria Castro Caldas, a certo passo de uma investigação desenvolvida no quadro da Economia com ferramentas da Inteligência Artificial, realiza um conjunto de experiências com a hipótese da ordem social espontânea. Essas experiências não são realizadas com robots físicos encorpados, mas com agentes de software, na linha da Simulação Multi-Agentes. Veremos aqui alguns aspectos desse contributo, até porque ele nos aproxima da estranha convivência entre ciências do artificial e pensamento económico.



Diz-nos Castro Caldas, em Escolha e Instituições: Análise Económica e Simulação Multiagentes (Castro Caldas 2001), que nem mesmo os economistas neoclássicos consideram que o “mercado livre” exista num vazio de regras: antes atribuem as regularidades comportamentais observáveis na sociedade exclusivamente à tendência para o equilíbrio e (como o equilíbrio resultaria das escolhas racionais, ou de processos de aprendizagem que convergiriam para estados estacionários compatíveis com estas escolhas), em última análise, à própria racionalidade. A explicação alternativa para as regularidades na acção social existe: regras partilhadas, normas e convenções sociais. Na tradição institucionalista próxima de Hayek, é reconhecida a importância das regras partilhadas sobre as quais assenta a ordem social. Mas é feita uma distinção entre regras concebidas deliberadamente (produção legislativa, por exemplo) e regras geradas de forma espontânea, que resultam do agregado das acções desenvolvidas por cada um dos indivíduos na prossecução do seu interesse próprio, acções essas e indivíduos esses que não teriam qualquer intenção de por essa via produzir regras. Hayek consideraria que as regras resultantes de um crescimento espontâneo são as regras próprias de uma ordem social benéfica (Castro Caldas 2001:175-176).



Castro Caldas, recorrendo ao Algoritmo Genético (uma técnica de evolução artificial) e dando-lhe uma interpretação própria (a que chama “interpretação comportamental”), vai realizar experiências de Simulação Multi-Agentes que pretendem fornecer elementos para discutir esta hipótese da ordem social espontânea: será que a mera interacção de agentes que prosseguem exclusivamente o seu interesse individual, tal como ele é percepcionado individualmente, resulta necessariamente em soluções eficientes para os problemas colectivos?

A isto nos dedicaremos nos próximos dias, nesta série de postais.



REFERÊNCIA
(Castro Caldas 2001) CASTRO CALDAS, José Maria, Escolha e Instituições – Análise Económica e Simulação Multiagentes, Celta Editora, Oeiras, 2001


19.11.07

Os iluminados


Peter Brueghel, A Queda dos Anjos, 1562



O século XX foi um século contraditório.
O mundo progrediu muito nesse século, tanto em termos materiais como em termos "espirituais".
Há menos gente a morrer de fome ou de doenças, trabalha-se menos horas e em melhores condições de conforto e de segurança, há melhores habitações e melhores infraestruturas dos espaços públicos, há mais generalizado acesso à educação e à cultura, etc., etc. Mesmo que muitos continuem a viver abaixo dos limiares mínimos em todos estes aspectos e em outros - e continuam - houve um real progresso por muitos terem passado a ter melhores condições.
Em termos "espirituais" também se progrediu: a discriminação de género já não é o que era, a discriminação racial tornou-se mais discreta, os trabalhadores têm hoje direitos que não tinham em 1900, a censura regrediu, a pena de morte aplica-se em menores áreas geográficas, etc., etc.
Todas as nuvens negras, bem como alguns retrocessos, não desmentem que os avanços foram enormes.
Contudo, o século XX foi também um século de grandes desgraças provocadas por factores propriamente políticos. As ditaduras mais ou menos fascistas ou mais ou menos comunistas estão entre os grandes flagelos. Fizeram muito mal a muita gente. Mas, o que é pior, fizeram muito mal em nome de grandes causas.
O que é curioso é que o mecanismo subjacente a esses flagelos é simples e constante. É o mecanismo dos iluminados.
O "mecanismo dos iluminados" é aquele mecanismo que consiste em alguns tomarem o poder e dizerem: nós vamos salvar os desgraçados. Sabemos quem eles são, qual é o problema deles, e vamos resolver o problema deles quer eles queiram quer não. Se eles não compreendem que nós somos a salvação deles, vamos salvá-los mesmo que seja contra a vontade deles. Vamos fazê-los felizes à força. E esse mecanismo matou milhões.
O problema do mecanismo dos iluminados continua a existir hoje. É o problema dos que pensam poder dispensar a colaboração dos cidadãos na salvação da pátria. O problema dos que pensam poder impôr, ainda por cima em democracia, a felicidade por decreto. Independentemente de os "alvos" compreenderem e partilharem, ou não, as salvíficas metas propostas.
Com uma dificuldade suplementar: em democracia esse método, além de mau, nunca chega ao fim da receita. E o cozinhado sai esturricado.
Pobre país que caia na ilusão dos iluminados.

(Faço deste postal um sinal de apreço por um conjunto de amigos com quem costumo discutir estas coisas.)


18.11.07

A espuma dos dias no Espelho dos Sentidos

O blogue Espelho dos Sentidos toca outra frase da mesma música que nos movia quando publicámos há dias o textimagem A espuma dos dias. Refiro-me, no Espelho dos Sentidos, ao post o essencial, trazendo Boris Vian ao baile (à baila).

16.11.07

Memórias. Berlim, 1989, um dia como este, um muro como qualquer outro.



(Clicar)


Quando começaram a abrir rasgões no muro da vergonha, eu estava lá (tinha ido à conferência "Security in Europe: Challenges of the 1990's" e fiquei mais uns dois ou três dias, porque era a primeira vez que ía a Berlim e queria conhecer). No princípio, as máquinas abriram só umas "portas" no betão e só passavam (de leste para oeste) os reformados que tinham família do lado de cá, talvez porque o regime achava que já só davam despesa. Só depois é que a brecha se foi alargando. Descobri agora duas folhinhas que escrevi na altura, "do lado de lá", no meio da agitação. Estão a ficar roídas pelo tempo. Antes que desapareçam, transcrevo-as para este arquivo-pessoal-público.

Folha 1. "Aqui é a Marx-Engels Platz, em Berlim Leste. Hoje são 17 de Novembro de 1989. O Muro já tem aberturas mas ainda falta muita coisa. Aqui está a ocorrer uma manifestação (ou concentração) de estudantes (pelo menos parecem, pela sua juventude, apesar de também haver gente mais velha). Vim para aqui directamente da estação de metropolitano, onde comprei o meu visto e troquei os obrigatórios 25 DM por 25 marcos da DDR. Do lado de lá vale, não 1 para 1, mas 1 para 10 ou ainda mais. Há o pequeno pormenor de que tenho a máquina fotográfica da Guida ao ombro, mas não consigo tirar nenhuma fotografia. Até o azar pode ser histórico... Outro pormenor é que está um frio danado, que entra por todo o lado apesar de estar com dois pares de meias calçados, camisa, camisola de gola alta, casaco de inverno e gabardina. São aqui 15.50H."
Folha 2. "No mapa, tenho aqui uma indicação sobre a Igreja de S. Nicolau, no centro histórico de Berlim. Fui para entrar, vi que se pagavam entradas e que havia um museu. Como não estou com grande tempo para museus, fui perguntar se também se pagava para ver a igreja. Resposta: «Isto não é uma igreja. Isto é um museu.» Entendi: estamos, realmente, no Leste. São 16H 13M."

Memórias das minhas ingenuidades, pois. Eu não falava uma palavrinha de alemão, mas recolhi um comunicado da SPARTAKIST - Herausgegeben von der Trotzkistischen Liga Deutschlands, com o título "Für eine leninistisch-trotzkistische Arbeitpartei!". E em baixo de página: "Für den Kommunismus von Lenin, Luxemburg und Liebknecht!". Ainda tenho uns jornais, uns autocolantes, uns "alfinetes de peito", desses dias. E, claro, umas pedrinhas pequeninas que eu próprio rapei do muro, à unha, enquanto outros já andavam em cima dele com picaretas.
Agora, já não há muro, mas há um grande fosso que permanece. Se aquilo fosse um fecho éclair, em vez de um muro, ainda estaria aberto?


(Texto publicado pela primeira vez a 17/11/03, no Turing Machine. Precisamente aqui.)



Robótica Institucionalista

O meu blogue "sério", "científico", "filosófico", realmente ligado ao meu actual trabalho de investigação (pelo menos aos seus aspectos mais generalistas), já está a funcionar em pleno. Uma ou (excepcionalmente) duas vezes por semana, lá estarei. É o Institutional Robotics.

Para saber mais sobre o assunto, mesmo antes de ir para outro blogue, pode ler este postal e/ou esta reportagem.




A Instituição, Manuel Botelho, 1985, carvão sobre papel, colecção Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa

(clicar para aumentar)

15.11.07

Amor e sexo com robots




O blogue sobre tecnologia da New Scientist publica uma série de perguntas e respostas sobre o livro Love and Sex with Robots. The Evolution of Human-Robot Relationships, de David Levy, que deve sair em Abril de 2008. (resumo aqui)

O postal pode ser lido clicando aqui: Your questions on love and sex with robots answered...

Não leiam e depois queixem-se de que perderam alguma coisa...

Compreender o papel das instituições na vida social (para lá da teoria económica neoclássica) - 5/5

Andámos a fazer uma leitura da crítica institucionalista de Geoffrey M. Hodgson à teoria económica neoclássica, em três pontos:
Primeiro, uma crítica do individualismo metodológico;
Segundo, uma crítica da hipótese da maximização;
Terceiro, uma crítica do conceito racionalista de acção.

Ora, estas críticas convergem para a necessidade de considerar a existência e o papel das instituições na vida económica e social – porque não existem indivíduos como átomos constituídos de forma absoluta fora da interacção social. As motivações económicas são formadas ou moldadas pelas mais variadas circunstâncias sociais e históricas. Uma economia moderna não funciona sem instituições: as trocas não são apenas transferências de bens, serviços e dinheiro entre agentes. Na verdade envolvem muitas instituições, como, por exemplo, direitos de propriedade, que são protegidos pelo Estado, por um sistema legal, por precedentes que tomam força de lei; os próprios contratos obedecem a certas regras, em parte legais e em parte sociais, que os enquadram; certas profissões são regidas por obrigações morais que ultrapassam as disposições contratuais formais (o juramento de Hipócrates para os médicos, por exemplo); a compra e venda de força de trabalho envolve a dignidade da pessoa humana, fazendo com que a generalidade dos países civilizados regule essa troca de forma que tem em consideração muito mais do que o seu interesse económico; o próprio dinheiro é uma complexa instituição social.



Um aspecto importante da abordagem institucionalista é que ela rejeita o determinismo. As instituições não determinam unívoca ou estritamente o comportamento dos indivíduos. Os indivíduos são constituídos pelas instituições, mas também participam na sua constituição. As instituições têm estabilidade e inércia, nascem de processos rotinizados partilhados por conjuntos de indivíduos de uma mesma sociedade e reforçam essas rotinas, tornando-as duradouras. Uma parte importante do papel das instituições é o seu peso cognitivo: estabelecem quadros de interpretação dos dados sensoriais e da informação, criando caminhos de construção do conhecimento. Até certo ponto as instituições fazem os indivíduos ver o mundo de certa maneira, em formas habituais. Isso não significa, contudo, que as instituições não possam mudar.




Um aspecto da dinâmica dessas mudanças, e do papel que os indivíduos nela desempenham, é discutido por Hodgson noutra obra (Hodgson 1993: capítulo 16). Há uma interacção complexa entre instituições formais (por exemplo, organizações explícitas) e instituições informais (hábitos, costumes). Por exemplo, uma empresa tem uma hierarquia e certas regras explícitas codificadas, mas também comporta relações pessoais entre indivíduos, quer pertençam ao mesmo nível hierárquico, quer pertençam a níveis diferentes – e tanto o aspecto formal como o aspecto informal contribuem para o impacte da empresa no mundo e para influenciar a acção individual.



As instituições mudam, mas de forma complexa e de acordo com ritmos diferenciados, combinando elementos de estabilidade e de instabilidade. Por um lado, por vezes a mudança institucional formal é mais difícil do que a mudança dos comportamentos individuais, provocando até a percepção de um desfasamento entre as instituições vigentes e novos desafios. Isso pode dever-se, por exemplo, à dificuldade de alcançar acordos entre os indivíduos para actualizar as instituições. Por outro lado, é por vezes mais fácil mudar as regras formais de funcionamento de uma instituição (por exemplo, o regulamento de um organismo) do que mudar os hábitos e rotinas que estão enraizadas de forma não explícita. Por vezes a mudança institucional faz-se com as mesmas pessoas (que mudam de comportamento), enquanto outras vezes a mudança só se torna efectiva quando mudam as pessoas (quando chegam novos indivíduos sem memória dos hábitos antigos). Estes exemplos reforçam, portanto, a ideia de que as instituições não são máquinas que determinam o comportamento dos indivíduos, comportando uma mistura de poder e de flexibilidade, de inércia e de potencial modificação, que agem sobre os indivíduos mas que também são afectáveis pelos seus membros individuais.


REFERÊNCIA
(Hodgson 1993) HODGSON, Geoffrey M., Economics and Evolution: Bringing Life Back into Economics (todas as referências são para a tradução portuguesa, Economia e Evolução: O Regresso da Vida à Teoria Económica, Oeiras, Celta Editora, 1997)


Esta série fica por aqui. Já de seguida (mais ou menos...) vamos dar outros desenvolvimentos a esta viagem. Voltem e verão. Proximamente começaremos uma série intitulada “Testar a hipótese da ordem social espontânea em Simulação Multi-Agentes”.


***




14.11.07

Prémio Nacional de Professores


Leio nos jornais que o Prémio Nacional de Professores foi atribuído, logo nesta primeira edição, a Arsélio de Almeida Martins, professor de matemática, de Aveiro (Escola Secundária José Estêvão). Acho a iniciativa uma boa coisa em si mesma, mas fiquei particularmente contente com o nome do primeiro laureado com o prémio.
É que interagimos na comunidade do ensino secundário em Aveiro, eu como suposto "representante dos alunos", ele como suposto "representante dos professores" (o "suposto" e as aspas vão à conta das debilidades da democracia representativa...) vai para mais de 20 anos. Nunca fui seu aluno de matemática (talvez infelizmente, talvez a minha matemática fosse melhor hoje em dia), mas lembro-me de um professor com uma característica sem a qual nada vale a pena, sem a qual nada tem qualidade: humanidade. Lembro-me do Professor Arsélio como uma pessoa de uma extraordinária humanidade e sensibilidade. Sei que há mais "professores Arsélios" neste país, mas este foi aquele que me deu a grande alegria do dia de hoje, quando li a notícia do seu prémio nos jornais. Apesar da distância, o seu prémio deu-me contentamento por um dia. O que já é tanto! Parabéns!

Ao Diário de Notícias Arsélio Martins diz coisas de imensa sabedoria, que alguns (por não perceberem nada do que é educar) devem achar banais. Perguntam-lhe "O seu método de trabalho tem algumas características especiais?" e ele responde: "O meu método de trabalho é baseado em coisas simples: ser persistente. Não esperar resultados de imediato, porque não há milagres. Tentar explorar várias formas de explicar a matéria. Não aceitar nenhuma limitação ao meu trabalho e lutar até ao fim. Tento ser agradável com as pessoas, levá-las a gostar de mim, porque é importante estabelecer uma relação de confiança. É um luxo as pessoas com quem trabalhamos gostarem de nós."

Uma nota: estava a mostrar esta notícia no DN ao meu colega de gabinete, que é um investigador holandês. Ele, olhando para o início da notícia, leu que o Prémio tinha sido atribuído a um "membro do Bloco de Esquerda" e perguntou: mas porquê escrevem isto? o que tem uma coisa a ver com a outra? Pois...

Para saber mais sobre o Prémio Nacional de Professores.
O blogue de Arsélio Martins, o lado esquerdo.

A espuma dos dias

Não sejas tão leve com o que chamas a espuma dos dias. Porque nem sempre vem uma onda de mar que limpe essa espuma. E essa espuma pode ganhar consistência, enrijar, tomar posse dos trilhos por onde ainda precisarás de passar, travar-te os passos, tolher-te os movimentos, encher-te a boca de mudez. Disso se faz a poluição mais refractária. É do uso e abuso da leveza, do tanto-faz, do não-é-nada-comigo, do quem-sou-eu-para-saber, ... que fluem tantas inesperadas barreiras que nos atravessam a pele e nos escurecem os dias.


(Foto de Porfírio Silva)

13.11.07

Compreender o papel das instituições na vida social (para lá da teoria económica neoclássica) - 4/5

Andamos, apoiados em Geoffrey M. Hodgson, a recensear a crítica institucionalista à teoria económica neoclássica. Estamos a organizar esse material em três pontos:
Primeiro, uma crítica do individualismo metodológico;
Segundo, uma crítica da hipótese da maximização;
Terceiro, uma crítica do conceito racionalista de acção.

Hoje chegamos ao terceiro ponto.

Terceiro, temos uma crítica do conceito racionalista de acção (Hodgson 1988: capítulo 5).



Nem toda a acção relevante em economia é dominada pelo cálculo racional: há acções relevantes em economia que surgem de maneira diferente. Há processos mentais inconscientes e subconscientes que influenciam a acção (se todo o comportamento relevante para a economia fosse estritamente racional não existiria, por exemplo, a publicidade tal como a conhecemos, apelando a dimensões simbólicas). Na própria percepção há processos computacionais inconscientes.


A informação não entra em bruto na mente do decisor. Muitos teóricos da economia falam como se a informação fosse um fluido indiferenciado de dados sensoriais a entrar na cabeça de um indivíduo. Só que não é isso que acontece: a informação é acedida através de um enquadramento cognitivo afectado pela cultura e pelas instituições. Ora, o nosso aparelho conceptual, que filtra os dados dos sentidos, é formado em interacção com os outros.


É importante, para seres com capacidades computacionais limitadas, que nem todos os processos mentais sejam conscientes e deliberativos, porque isso permite poupar capacidade computacional para aquelas acções que efectivamente são decididas de forma consciente e deliberativa. Uma das formas dessa poupança de capacidade computacional está naqueles níveis de acção em que dependemos de rotinas e hábitos. Crenças, atitudes e valores também orientam a nossa interpretação da realidade. Também a autoridade, que tendemos a aceitar quando a consideramos legítima, tem esse papel. Em parte aceitamos padrões normativos que definem aquilo que as pessoas pensam ser modalidades apropriadas de acção e relacionamento social. O conformismo é uma aceitação generalizada desse mecanismo, mas mesmo o inconformismo em geral não questiona tudo, mas apenas certas regiões de normas. Mesmo o que os economistas referem como o “interesse próprio” de cada um é algo que também é formado socialmente: o que um servo da gleba medieval podia considerar como interesse próprio não coincide com o que um assalariado do século XXI pode considerar como o seu interesse próprio, porque há aí uma dimensão social e histórica.


Os hábitos e as rotinas definem linhas de acção frequentes que não são sujeitas a avaliação racional contínua, que seria incompatível com a fluidez da própria acção; os hábitos e as rotinas podem começar por mera imitação ou também por escolha consciente, podendo também ser abandonadas ou modificadas por verdadeiras decisões. As rotinas, além de pouparem a capacidade computacional disponível, também reduzem a incerteza, na medida em que reconhecemos que os outros agentes também seguem rotinas e se tornam, assim, mais previsíveis.

(continua)


12.11.07

Ir além da mediania

No número de Junho (2007) da revista científica IEEE Robotics and Automation (Volume 14, Número 2, pp. 16-17), o Professor Pedro Lima, do Instituto de Sistemas e Robótica (Instituto Superior Técnico) publica um pequeno texto intitulado "Robotics Educational Activities in Portugal: A Motivating Experience". O texto é antecedido de uma pequena "Nota do Editor" que mostra que é possível, entre nós, ir além da mediania. A nota do editor, subscrita por Paolo Fiorini, reza assim (em tradução ao correr da pena):

«Embora o número de actividades de investigação e disseminação em robótica estejam correlacionadas com o tamanho do país em que são realizadas, a contribuição desta coluna, escrita por Pedro Lima, de Portugal, mostra que o tamanho do país não é uma condição necessária para um ambiente robótico animado. Se o número de actividades é normalizado pela população, Portugal é provavelmente um dos países mais activos na investigação robótica, assim como na organização de eventos educacionais e de promoção. Nesta coluna Lima descreve sucintamente as actividades que têm sido organizadas em Portugal nos últimos anos. Queremos ter a esperança de que, numa coluna futura, nos dirá igualmente qual o segredo para o enorme sucesso da robótica em Portugal.»

9.11.07

Contribuinte sofre

O Eduardo Graça, no Absorto, publica um postal intitulado Contribuinte sofre. Deve ser lido. Eu revejo-me no pânico de ser atacado por máquinas anónimas que têm pouco jeito para escutar, mesmo quando os alvos tenham culpas no cartório, porque seremos tão ameaçados se tivermos a pagar como se tivermos a haver. O Absorto conta um caso concreto - e não podemos deixar de pensar nos casos concretos, porque "elas" (as coisas) não acontecem só aos outros.

Compreender o papel das instituições na vida social (para lá da teoria económica neoclássica) - 3/5

Andamos, apoiados em Geoffrey M. Hodgson, a recensear a crítica institucionalista à teoria económica neoclássica. Resumimo-la em três pontos:
Primeiro, uma crítica do individualismo metodológico;
Segundo, uma crítica da hipótese da maximização;
Terceiro, uma crítica do conceito racionalista de acção.

Hoje passamos ao segundo ponto.

Segundo, temos uma crítica da hipótese da maximização (Hodgson 1988: capítulo 4).




O “homem económico racional” da teoria económica neoclássica tem no centro a ideia de que os agentes, graças a um cálculo racional que tem em conta toda a informação relevante, maximizam um certo resultado expresso num único valor (utilidade ou lucros, por exemplo), o que em geral depende do pressuposto de que os indivíduos fazem uma ordenação consistente das suas preferências, ordenação essa que é transitiva (se A é preferível a B e B é preferível a C, então A é preferível a C) e irreflexiva (para qualquer produto A, A não é preferível a A).
A forma primitiva da hipótese da maximização considera que tal comportamento é consciente e deliberativo: o agente tem consciência do exercício de optimização da sua função de utilidade, tem consciência do leque de alternativas ao seu dispor e das consequências das suas acções, tem consciência de todo o conjunto das suas preferências e da respectiva ordenação; o agente reúne e processa a informação necessária à determinação do curso de acção, procedendo então ao cálculo de probabilidades necessário à maximização da utilidade.

Houve tentativas para assimilar, no quadro neoclássico, a crítica de Simon à versão forte da hipótese da maximização, crítica essa que assentava na noção de racionalidade limitada: “satisfizar” seria um comportamento minimizador de custos, porque recolher toda a informação necessária à maximização teria demasiados custos. Só que essa tentativa falha, porque o problema não é escassez de informação, mas sobrecarga de informação para agentes com poder computacional limitado. No “cubo de Rubic” há mais de 43 triliões de posições iniciais possíveis e um número limitado de formas óptimas (número mínimo de movimentos) para ordenar o cubo para cada posição inicial, mas ninguém resolve o problema calculando esse percurso óptimo: antes se seguem certos procedimentos simples que, sendo suboptimais, são muito mais operacionais para seres que não sejam (como os humanos não são) calculadores perfeitos e ilimitados.

Note-se aqui que na economia neoclássica as noções de racionalidade global e de equilíbrio estão intimamente relacionadas: o equilíbrio, estado em que todos os agentes atingiram o máximo da sua função de utilidade, só é atingido por efeito de um cálculo global e generalizado. No enquadramento da racionalidade limitada o que há são revisões de procedimento à medida que a informação vai sendo disponibilizada e avaliada, cada agente procedendo a essas revisões de forma diferente de outro agente, sem nunca se atingir um equilíbrio óptimo.

Face às críticas massivas que se foram acumulando a esta forma da hipótese da maximização, foram elaboradas formas aparentemente mais sofisticadas. Uma delas é a abordagem das “preferências reveladas”: dispensa-se o pressuposto de que o agente realiza um trabalho introspectivo para determinar as suas preferências e o curso de acção que elas ditam, assumindo-se que as preferências simplesmente se revelam por observação do comportamento do agente. Contudo, mesmo esta versão “objectiva” da hipótese não funciona. Por exemplo, se cada produto tiver vários atributos, qualquer deles serve para ordenar as preferências, possibilitando a manifestação de preferências intransitivas ou reflexivas (considerando, em situações diferentes, diferentes atributos do mesmo produto). Além disso, se os comportamentos revelarem preferências diferentes em momentos diferentes, não se pode determinar comportamentalmente se as preferências mudaram ou se elas são simplesmente inconsistentes. Além disso, persiste a dificuldade de que a ordenação geral de preferências requer conhecimento perfeito do mundo.

Outra tentativa de sofisticar a hipótese da maximização é dar-lhe uma versão evolucionista: as empresas que se adaptaram ao seu ambiente económico agem “como se” maximizassem e sobrevivem; as outras não. Contudo, não tendo sido apresentado nenhum mecanismo evolutivo credível que explique como se atinge o comportamento óptimo, como é que ele é sustentado e transmitido ao longo do tempo, nem como é que se passa essa informação de uma geração de empresas para outra, esta versão da hipótese não pode ser considerada seriamente.
De qualquer modo, em qualquer das suas versões, a hipótese da maximização adere à concepção instrumental da racionalidade: o “homem económico” tem fins que se distinguem claramente dos meios, os fins são determinados fora da economia, o cálculo racional diz respeito apenas aos meios. Só que não é em geral verdade que “os fins justificam os meios”, havendo interdependência entre meios e fins (por exemplo, certos fins nunca chegam a ser adoptados porque implicariam meios inaceitáveis).

(continua)


8.11.07

Debates utópicos


Viram o filme Torre Bela, de Thomas Harlan, do já longínquo ano de 1975? A nota de divulgação, aquando da recente reposição, rezava assim: «Documento único e extraordinário sobre a ocupação da Herdade da Torre Bela no Ribatejo no pós-25 de Abril. A 23 de Abril de 1975, cinco semanas depois do 11 de Março e dois dias antes do aniversário da revolução dos cravos, ex-trabalhadores agrícolas, prisioneiros políticos libertados e rufias invadem a herdade, propriedade do duque de Lafões, numa acção rara por decorrer no Ribatejo (quando a maioria das ocupações se passavam no Alentejo e o Ribatejo permanecia refúgio da Direita) e por não estar, ao contrário das outras, ligada ao Partido Comunista. Realizado por Thomas Harlan e produzido por Paulo Branco, é um acutilante olhar político sobre uma época, uma utopia e as suas contradições.»
Ora, esse filme tem um diálogo de antologia, que parece ser acerca da propriedade de uma pequena ferramenta agrícola, mas que é afinal sobre os mais complicados recantos da mente humana, da luta entre o que sonhamos ser e o que tememos que o mundo realmente seja. Um diálogo entre utopia e realismo. Aqui fica um excerto.
Declaração de voto minha: neste diálogo, não pensem que estou do lado que vocês pensam que eu estou. Qualquer que seja o lado em que vocês pensam que me poiso.




Impressão Acidental


Porfírio Silva, Impressão Acidental (Ameaça no Ar)


7.11.07

Compreender o papel das instituições na vida social (para lá da teoria económica neoclássica) - 2/5

Pretendemos, então, recensear a crítica institucionalista de Geoffrey M. Hodgson à teoria económica neoclássica. Vamos resumi-la em três pontos:
Primeiro, uma crítica do individualismo metodológico;
Segundo, uma crítica da hipótese da maximização;
Terceiro, uma crítica do conceito racionalista de acção.

Por hoje ficamo-nos pelo primeiro ponto.

Primeiro, temos uma crítica do individualismo metodológico, característica central do modo de fazer ciência da economia neoclássica (Hodgson 1988: capítulo 3).




O individualismo metodológico não se limita ao atomismo social truístico (“a sociedade é formada por indivíduos”), nem nega a existência de entidades sociais, nem que elas influenciam o curso dos acontecimentos humanos. O individualismo metodológico, pretende, precisamente por ser um posicionamento metodológico, que qualquer boa explicação dos fenómenos sociais tem de ser formulada em termos individuais, uma vez que todas as acções são executadas por indivíduos e os colectivos nada são para lá dos actos dos seus membros individuais. Essas explicações individualistas em ciências sociais geralmente assumem agentes dotados de intenções, cuja acção individual é animada por propósitos e dirigida a objectivos. O que liga a acção individual aos fenómenos colectivos é o método compositivo: o ponto de partida é o indivíduo (abaixo dele nenhuma análise é invocada, deixando os processos inconscientes ou subconscientes na sombra e/ou remetendo-os para a psicologia); tudo o resto são composições sucessivas e hierárquicas, piramidais, da acção dos elementos básicos; o macro é explicado pelo micro. Em certas variantes do individualismo, os colectivos são tratados como indivíduos, como se as empresas, famílias ou classes sociais fossem as únicas unidades dotadas de propósitos.


Ora, a abordagem institucionalista rejeita que o comportamento individual seja o único ponto de uma explicação possível: as explicações adequadas podem ter de conter níveis sub-individuais (psicologia), bem como instituições sociais e cultura, que podem influenciar o comportamento individual, embora de forma não determinista.
(continua)


Será que existem raças humanas?

O texto que se segue é um artigo de Francisco Dionísio, Isabele Gordo, Lounés Chiki, Mónica Bettencourt Dias, Rui Martinho, Sara Magalhães, todos Doutorados em Biologia e investigadores no Instituto Gulbenkian de Ciência, publicado no Público de 3-11-2007, p. 43. Deixo-o aqui só para o vir ler de vez em quando.

James Watson, prémio Nobel da Medicina, agitou recentemente o mundo ao afirmar que os negros teriam inteligência inferior. A intensidade do debate que se seguiu, com diferentes entidades e personalidades a tomar posição sobre estas afirmações, terá impedido os esclarecimentos necessários sobre o principal conceito subjacente às suas palavras, o de grupos humanos distintos e facilmente identificáveis, em linguagem leiga, o conceito de raças humanas.

Sabemos que há grupos distintos de cães. Um doberman, por exemplo, tem características diferentes das de um caniche. Estas características morfológicas são definidas por informação genética diferente, que é mantida porque cães de um grupo só são cruzados com cães desse mesmo grupo. Estes grupos resultaram de uma vontade humana de separar conjuntos de cães diferentes por várias gerações, impedindo assim o cruzamento entre esses indivíduos, o que levou a uma diferenciação das características de cada grupo, tornada mais óbvia ao longo do tempo. Um outro exemplo de grupos ainda mais distintos é o da couve-de-bruxelas e da couve-flor. Neste campo, como a diferenciação genética é maior, feita ao longo de mais gerações, alguns geneticistas até aceitariam que se trata de “raças diferentes” da mesma espécie de couve.

Mas nenhum grupo humano foi sujeito a estas condições de isolamento. De facto, todos os dados científicos mostram que temos um ancestral comum em África e que desde sempre o constante movimento e a consequente troca de bens, informação cultural e genética impedem que se gerem grupos humanos isolados. É sabido que basta haver migração de poucos indivíduos em cada geração para homogeneizar potenciais diferenças genéticas entre grupos.

A cor da pele é das características mais fáceis de reconhecer nas pessoas e provavelmente por essa razão foi erroneamente utilizada para tentar organizar os humanos por grupos, raças. No entanto, não é por uma característica ser fácil de visualizar, como é o caso da cor da pele, que isso a torna representativa de todo o património genético dessa pessoa, reflectindo todo um leque de outras características com uma componente genética, como, por exemplo, a cor dos olhos. Dependendo da característica genética em questão, um português poderia ser agrupado mais facilmente com um chinês ou um etíope do que com o seu vizinho do lado. Por exemplo, poderá ser melhor para si receber sangue de um etíope que partilha consigo o mesmo grupo sanguíneo, do que receber sangue do seu vizinho do lado pertencente a outro grupo sanguíneo. São tantas as nossas características genéticas e tão variadas que é impossível agrupar-nos em raças.

O conceito de raças humanas ainda faz menos sentido desde que, de há uns 40 anos para cá, os dados mostram que no continente africano está representada quase toda a informação genética dos humanos do nosso planeta. Dado este facto, faz pouco sentido dizer que os negros são um grupo geneticamente diferente de qualquer outro. Assim, se hoje houvesse uma doença que devastasse todos os continentes, a sobrevivência dos africanos garantiria a preservação de quase todo o património genético da nossa espécie. Todos os outros continentes têm uma menor representação daquilo que nós, seres humanos, somos geneticamente. Assim, antropólogos e geneticistas juntam-se hoje em dia para dizer que o conceito de raças humanas não faz sentido.

5.11.07

A propósito dos disparates racistas de James Watson...

... vimos pela blogosfera (e pela imprensa) textos que dão vergonha. Filósofos, por exemplo, a exibirem (como um pavão exibe as suas penas) a exibirem a sua arrogância intelectual, assente no culto alquímico pela "ciência" despida de qualquer responsabilidade perante os outros e a polis. Penalizo-me por não ter encontrado maneira de dizer qualquer coisa mais séria sobre o tema, mas tento agora "limpar-me" deixando aqui ligações para dois postais que, concordemos ou não com tudo em cada pormenor, dão o tom para uma reflexão séria. Com a devida vénia:

No Zero de Conduta podemos ler O politicamente correcto tem as costas largas.

Em O melhor blogue possível, de Rui Tavares, podemos ler Serão os prémios Nobel menos inteligentes do que os empregados de café?

Apanhei os links no Natura Naturans. Agradeço. Em complemento, vou mais tarde colocar aqui um artigo de biólogos que foi publicado na imprensa escrita no sábado passado.

Compreender o papel das instituições na vida social (para lá da teoria económica neoclássica) - 1/5

Muitos autores têm criticado a corrente dominante, neoclássica, do pensamento económico. Está fora de questão fazer aqui um levantamento aprofundado dessa crítica, mesmo nos seus traços principais. Contudo, daremos aqui uma breve atenção a alguns aspectos centrais dessa crítica tal como são apresentados por Geoffrey M. Hodgson, na medida em que este autor se orienta pela necessidade de começar a desenhar uma alternativa que nos interessa: a abordagem institucionalista.

Hodgson (1988) assinala que a teoria económica neoclássica implica:
(i) comportamento racional, maximizador, por parte de todos os agentes económicos;
(ii) ausência de problemas crónicos de informação: incerteza quanto ao futuro, ignorância sobre as estruturas e parâmetros do mundo, divergência na cognição de fenómenos individuais;
(iii) preferência teórica por estados de equilíbrio estável e falta de atenção aos processos históricos de transformação e às dinâmicas.



Veremos, posto este diagnóstico, alguns dos aspectos mais salientes da crítica desse autor a esta abordagem. É o que faremos nos próximos postais.

REFERÊNCIA
(Hodgson 1988) HODGSON, Geoffrey M., Economics and Institutions – A Manifesto for a Modern Institutional Economics (todas as referências são para a tradução portuguesa, Economia e Instituições – Manifesto por uma Economia Institucionalista Moderna, Oeiras, Celta Editora, 1994)




1.11.07

ARGUMENTUM ORNITHOLOGICUM

Ron Mueck, Angel (1997)


Fecho os olhos e vejo um bando de pássaros. A visão dura um segundo ou talvez menos; não sei quantos pássaros vi. Era definido ou indefinido o seu número? O problema envolve o da existência de Deus. Se Deus existe, o número é definido, porque Deus sabe quantos pássaros vi. Se Deus não existe, o número é indefinido, porque ninguém pode fazer a conta. Nesse caso, vi menos de dez pássaros (digamos) e mais de um, mas não vi nove, oito, sete, seis, cinco, quatro, três ou dois pássaros. Vi um número entre dez e um, que não é nove, oito, sete, seis, cinco, etc. Esse número inteiro é inconcebível; ergo, Deus existe. (Jorge Luís Borges)



Este texto de J.L. Borges provocou uma ocorrência curiosa. Enviei-o para um grupo de discussão pedindo que me enviassem breves comentários filosóficos ao mesmo, que, dizia eu, podiam ser «quer sobre a forma, quer sobre a "tese" em causa, quer sobre o raciocínio lógico a que se apela, quer mesmo sobre a possibilidade de um tal texto ter uma tese».


Recebi a seguinte resposta, de "Jocax": «Olá Porfirio! Desculpa, achei o argumento ( transcrito no fim da mensagem ) totalmente falacioso , para não dizer ridículo mesmo! :-) O fato de vc não lembrar ou não saber quantos pássaros imaginou não significa que existiu um número de pássaros bem definido pois alguns deles, como imagens, poderiam estar incompletos, como uma imagem borrada e, assim, não se poderia dizer se era um pássaro ou meio pássaro. ALÉM DISSO, vc se lembra quantas crianças tinha na sala de aula do seu primeiro ano de primário no dia 12/11/1960 ? Alguém neste mundo vai lembrar disso? E se os documentos sobre isso foram queimados naquele incêndio da escola? Isso prova alguma coisa sobre Deus? Não tem nada a ver! Embora o número de alunos fosse, diferentemente do exemplo dos pássaros, um número bem definido, ninguem vai lembrar! Vc precisa ler com cuidado o Link que vou te mandar Ok ? Leia (segue um link). Jocax.»


Manifestamente, por vezes não gosto de ser levado demasiado a sério. Respondi: «Obrigado, Jocax. O link que sugere eu vou re-encaminhar para o Jorge Luis Borges, o autor do "argumento". Trata-se de um texto LITERÁRIO de Borges, não de um texto FILOSÓFICO. Borges fez muitas ironias desse género, que podem ser apreciadas filosoficamente, mas não como se pretendessem demonstrar alguma coisa. Eu não estou em nenhuma movimentação para DEMONSTRAR a existência ou não existência de Deus: por razões filosóficas, esse tema não me interessa. O que me interessa, neste ponto específico, é apenas a forma de proceder do grande Borges. Obrigado por ter dado atenção à minha mensagem. Um abraço. Porfírio»


Aqui fica a historinha. Voltem ao início e gozem o texto de Borges. E a suprema ironia do falso cego. (Tal como se pode gozar a pretensa lucidez de outros verdadeiros cegos.)


(Texto publicado inicialmente no Turing Machine, mais precisamente a 14/04/04, aqui.)