JE SUIS CHARLIE
Eu podia negar. Responder-te que não
fui eu que falei a fala livre.
Abanar a cabeça como se eu não
tivesse desenhado palavras no chão da cidade.
Como se não carregasse o fardo da responsabilidade
de avançar contra o vento.
Eu podia renunciar - mas apenas no sentido
de esse ser o outro caminho,
a porta de uma estrada que eu não tento.
Tive que dizer-te que sim, era eu
a mão que tu procuravas para cortar
"oui, c'est moi"
E agora o meu corpo frio voa
e a minha mão desenha no ar
tudo o que ainda tinha por inventar.
Há um traço imenso a ligar todos os nós
da corrente dos que morrem
sempre que morre a liberdade do outro.
E tu, quieto, desenhas esse traço continuamente.
Porfírio Silva (sobre o 7 de Janeiro de 2015 em Paris)