15.11.13

coisas independentes.


Um dos fenómenos das últimas eleições autárquicas foi uma certa proliferação das listas independentes. Já aqui apreciei (de um ponto de vista basicamente funcional) esse fenómeno, mas o que quero agora lembrar é outra coisa. Um certo autarca independente pôs-se de fora da movimentação para constituir os independentes como uma força própria na associação dos municípios. Explicava-se: fazer uma espécie de bloco de independentes não tinha base nenhuma no programa e na atitude com que essas listas se apresentaram ao eleitorado e, de certo modo, traía de forma infeliz essa mesma independência. Essa movimentação parecia uma tentativa de criar uma espécie de “partido dos independentes” , o que parecia uma contradição nos termos. Confesso que achei pertinente a observação.

Olhemos, agora, para outra “coisa independente”. O Ministro Crato, o tal que gostaria de implodir o Ministério da Educação (e que parece levar muito a sério esse seu programa), faz tudo o que pode para transferir realidade da escola pública para as escolas privadas – mesmo que isso implique atacar os sagrados mandamentos da troika (destinando mais dinheiro ao ensino privado). A sua demanda é ideológica: em vez de cuidar de que a escola pública seja cada vez melhor espaço de liberdade e de construção de oportunidades iguais, quer aumentar as reservas privadas de felicidade para poucos, as quais, em média, atendendo à experiência passada, serão sempre mais conformes ao redil ideológico do Ministro. A sua última invenção-copiada são as “escolas independentes”: escolas arrancadas à escola pública para serem geridas por professores. Apesar de discordar desses planos para retalhar a escola pública (a ideia final destes ideólogos é sempre a mesma: esburacar tanto a rede pública que esta se torne efectivamente dependente dos privados), ainda acho que poderíamos discutir uma troca razoável. Eu aceitaria as escolas independentes se o financiamento das escolas-polvo (empresas proprietárias de escolas várias numa lógica de polvo) fosse transferido para escolas realmente independentes.
Chamo escolas realmente independentes a escolas que resultem de iniciativas locais de cidadãos interessados numa oferta educativa alternativa, que tenham outras razões que não o lucro para esse interesse. Por exemplo, sendo encarregados de educação e querendo juntar-se para dar mais aos seus educandos, ou sendo professores e querendo construir formas novas de ensinar. Essas escolas realmente independentes poderiam, também, ter enviesamentos ideológicos ou culturais, como é o caso com a maioria dos colégios privados, mas não seriam polvos-em-rede ao serviço de “reservas de elite”: sendo locais, assentes em iniciativas de base, em vez de cogumelos plantados ao sabor das estratégias de certas corporações, poderiam tornar-se em fonte de pluralidade, diversidade, entusiasmo, experimentação – algo que poderia beneficiar a educação em Portugal no seu conjunto.
Eu estaria disposto a olhar com simpatia para estas escolas independentes, se elas fossem realmente espaço de pluralidade – em vez de serem máquinas de fazer dinheiro ou instrumentos de arregimentação ideológica em larga escala. Mas, para isso, as “escolas independentes” não poderiam ser uma contradição nos termos, como o “partido dos independentes” dos autarcas, de que falámos a começar.