27.10.21

Pedido de esclarecimento. Ao PCP

 

Deixo aqui, para registo, a minha intervenção, ontem, no debate na generalidade sobre o Orçamento de Estado para 2022.

 

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Senhor Presidente, Senhor Primeiro-Ministro, Senhores membros do Governo, Senhores Deputados,

Senhor Deputado Duarte Alves,

No dia 5 de dezembro de 1989, Jorge Sampaio dizia daquela tribuna: “Socialistas e comunistas conhecem as suas divergências como ninguém. Traçaram mutuamente uma fronteira que é mutuamente assumida. E são raianos. Ninguém conhece as fronteiras como os raianos.”

Nesse momento histórico, Jorge Sampaio liderava uma coligação de socialistas e comunistas à Câmara de Lisboa, que tão bem-sucedida foi. Nós somos dessa escola, que não disfarça as divergências, mas une forças para fazer à esquerda o que falta fazer. E é por aí que vão as minhas perguntas.

Este documento, “Balanço do Trabalho Parlamentar, XIII Legislatura”, do GP do PCP, faz uma lista das provas concretas de que a legislatura anterior foi, e cito, “um tempo de recuperar e conquistar direitos e rendimentos com inúmeros avanços e conquistas”. Embora assumidamente não exaustiva, é uma lista extensa, que se espraia por três páginas. Será que o PCP de hoje desvaloriza essas conquistas de direitos e rendimentos?

Depois, evidentemente, o documento diz que não vamos suficientemente longe. Que todos queremos mais, é certo. Mas será razoável chumbar o aumento extraordinário de todas as pensões até 1.097 euros? Vamos travar a universalização das creches gratuitas? Travar o aumento do investimento público? São questões que acho que nos deviam preocupar em nome do país – e creio que o PCP também se preocupa com isso.

Mas, Senhor Deputado, queria fazer-lhe especificamente a seguinte pergunta.

O PCP sempre disse que não misturava OE com outras matérias. Ainda em julho o líder parlamentar do PCP dizia que não era responsável nem digno misturar Orçamento com matéria laboral. Agora, mudou: o PCP explica o seu voto, contra o Orçamento mais à esquerda de sempre, com variadas matérias extraorçamentais.

Então, se a ideia era exigir um acordo abrangente, porque é que o PCP inviabilizou à nascença a possibilidade de acordos escritos de legislatura à esquerda, que, mesmo num formato mínimo, tão bons resultados deram na legislatura anterior?

Senhor Deputado, estão lá fora milhões de eleitores de todos os partidos de esquerda, PS, Bloco, PCP, que se entusiasmaram com o que conseguimos fazer em conjunto na legislatura anterior, que agora se perguntam: não terá o PCP dado um mau passo quando se apressou a dizer que não voltava a haver papel nenhum assinado à esquerda?

Não deveríamos, todos, reforçar esforços na recuperação da crise social e económica provocada pela pandemia, para que essa recuperação seja solidária e progressista?

E faço esta pergunta por uma razão muito simples: é que nós achamos que o PCP é fundamental nessa resposta. Era por isso que gostávamos muito de ouvir a vossa resposta, para sabermos se vamos continuar a poder discutir o orçamento da especialidade, para dar a resposta que o país precisa, ou se ficamos por aqui.

 

Porfírio Silva, 27 de Outubro de 2021
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