6.8.14

Mobilizar Portugal.



Reproduzo aqui a minha intervenção na Convenção Nacional MOBILIZAR PORTUGAL, realizada em Aveiro, no passado dia 26 de Julho de 2014, na sessão final, na qualidade de coordenador da moção Mobilizar Portugal.


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Caras Amigas e Caros Amigos,
Caras e Caros Camaradas,
É com um prazer muito especial que participo nesta Convenção em Aveiro, onde iniciei a minha participação cívica, quando aos 14 anos subi as escadas de um prédio aqui do centro da cidade para me inscrever na Juventude Socialista, nesta cidade onde fui ativista e dirigente associativo.

Este é um regresso que me sabe muito bem. Mas, estar aqui nesta Convenção representa para mim um regresso mais fundamental: o regresso à esperança de que ainda vamos a tempo de celebrar os 50 anos do 25 de Abril num Portugal mais desenvolvido, mais eficaz e mais eficiente, e, ao mesmo tempo, com mais equidade e com direitos mais efetivos para todos. E estamos muito precisados dessa esperança, uma esperança realista que seja capaz de se dotar dos instrumentos para a sua concretização. Uma esperança que só será possível se formos capazes de Mobilizar Portugal.

Para Mobilizar Portugal, o nosso candidato a primeiro-ministro lançou um desafio: construir uma Agenda para a próxima Década.

Tivemos, hoje, nesta Convenção, um momento forte de impulso na construção da Agenda da Década.
Pelo que pudemos ver e ouvir, pelas conclusões apresentadas pelos coordenadores dos painéis, começou bem a construção desta Agenda da Década.

Algumas vozes queixaram-se de que este movimento para Mobilizar Portugal veio aqui discutir a lusofonia, o interior e as cidades, o mar, a modernização das empresas e do Estado, a ciência, a cultura, o combate às desigualdades – e, queixam-se essas vozes, não discutimos o défice e a dívida.
O défice e a dívida são temas importantes, não tenhamos dúvida, e falaremos deles nesta campanha.

Mas é preciso saber em nome de que país queremos resolver esses problemas.

Seria uma enorme tragédia que se atacasse o problema da dívida e do défice só para, depois, voltar a esquecer quais são os estrangulamentos fundamentais que adiam sempre a prosperidade económica e social do País. O PS não quer resolver esses problemas à custa dos que pagam sempre as crises quando a direita governa. Notem que o lema deste movimento que somos é “Mobilizar Portugal”.

Ora, para mobilizar os portugueses para um caminho, entusiasmante mas exigente, não basta caminhar: é preciso saber para onde vamos. A questão fundamental é, exatamente, que País queremos ser daqui a dez anos. E por isso esta construção da Agenda da Década é tão importante. Este processo não é um processo de tecnocratas ou ideólogos a querer experimentar mais umas receitas à custa do país. Isso já sabemos o resultado que dá e não queremos repetir. Como também não é um processo meramente voluntarista.

É que “Mobilizar Portugal” não é só questão de conteúdo das políticas, não é coisa que se faça com uma série de decretos, é também o modo de fazer as coisas, o método: respeitar as pessoas, respeitar as instituições, mudar as representações e as aspirações, envolvendo os atores económicos e sociais na identificação das questões relevantes e na apropriação dos objetivos e dos instrumentos. É colocar em marcha a negociação séria, o compromisso que não apaga as diferenças. E tudo isso só é possível se soubermos levantar os olhos e olhar para a frente. 

Por isso estamos empenhados nesta construção da Agenda da Década.

Pensar em comum e pensar estrategicamente é um grande desafio. Ainda mais quando esse exercício tem de ser feito no quadro de uma Europa que tem ela própria de ser repensada.

A Europa foi enfraquecida por seis anos de crise.
Enfraquecida economicamente, pela recessão.
Enfraquecida socialmente, pelo desemprego massivo e pelas desigualdades.
Enfraquecida politicamente, porque perdeu legitimidade aos olhos dos cidadãos pela forma desordenada e incompetente como reagiu às crises.
A Comissão Europeia enfraqueceu-se a si própria, e foi enfraquecida pelo regresso de um intergovernamentalismo agressivo.
A ideia de governação económica europeia foi capturada por uma visão ideológica da disciplina orçamental, que usa o estribilho das reformas estruturais para impor a desregulação dos mercados, a compressão salarial e o recuo nos direitos sociais.
A ideia de reforço da coesão perdeu a centralidade política que já teve e que precisa de voltar a ter.
A crise lembrou, a quem o tivesse esquecido, que a Europa não se legitima apenas politicamente. A construção europeia requer igualmente um continuado processo de legitimação económica, já que a Europa só faz sentido se for também um projeto de prosperidade partilhada.

Contudo, a tentação de virar as costas à Europa seria um erro grave.


Por quê? É importante responder, de novo, a esta pergunta: por quê a Europa?

Certamente que, hoje, não basta repetir, embora seja verdade, que esta comunidade deu ao continente um período de paz sem precedentes.
Mas isso já não basta. Metade da Europa a empobrecer não vai sequer ser capaz de garantir a paz.

Para os nossos valores de justiça social e progresso, o mundo está difícil.
Essa combinação sagaz de progresso económico e de progresso social a que chamamos modelo social europeu está ameaçado por transformações económicas reais: a liberalização financeira desregulada a nível global, em prejuízo da economia produtiva, diminuiu drasticamente a autonomia dos poderes democráticos.
Não podemos perder de vista que a Europa avançou para a criação do euro para proteger os países face aos perigos da globalização financeira – e ter presente que esses perigos aumentaram, não diminuíram.
É certo que, afinal, o euro não estava preparado para nos proteger do potencial de desestabilização da finança global liberalizada, como alguns alertaram atempadamente.
Mas também é certo que, fora da Europa, ou numa Europa mais fraca, estaríamos ainda mais expostos aos riscos da globalização. O caminho não passa, pois, por desistir da Europa ou por regressar a qualquer ideal de autarcia. O caminho passa por renovar o nosso empenhamento na Europa, em trabalharmos para fazer da moeda comum um vetor de prosperidade e convergência.

Mas para isso precisamos de uma nova atitude de Portugal na Europa.

Porque é preciso trabalhar para transformar promessas de convergência em realidade efetiva. 

Porque é preciso trabalhar para eliminar fatores de distorção do funcionamento da zona euro que são prejudiciais ao nosso desenvolvimento. Não podemos achar normal que, no seio da mesma zona monetária, uma empresa de um país do Sul se financie a taxas de juro 2 pontos percentuais acima da taxa a que se financia uma empresa de um país do Norte.

É preciso voltar a colocar os direitos das pessoas no centro da construção europeia. Por exemplo, não é que a solução para o desemprego esteja na emigração – como disse António Costa, a liberdade de circulação não pode ser confundida com necessidade de circulação – mas aqueles que vão trabalhar fora das fronteiras nacionais não podem ser penalizados por uma portabilidade insuficiente das qualificações e dos direitos sociais.

Há, pois, muito trabalho a fazer na Europa.

Desde logo, trabalhar pelo objetivo de completar a arquitetura do euro a tempo de o salvar. Alguns passos já foram dados, mas há ainda muito a fazer.
A união económica e monetária tem de reforçar as políticas de convergência, a Europa tem de se dotar de mecanismos permanentes de redução das assimetrias entre Estados-Membros. Várias propostas e estudos têm sido avançados em vários países, nós não podemos fazer de conta que não sabemos de nada, como tem feito o atual governo. Portugal tem de ter uma voz audível nesse processo.

É claro que o caminho não está em sermos um Estado Membro que falha as suas obrigações europeias. Mas a verdade é que, se o Pacto de Estabilidade e Crescimento e o Tratado Orçamental reconhecem que a política orçamental deve assumir, em regra, um cariz contracíclico, quer dizer, deve permitir estimular a atividade económica em períodos de recessão e deve funcionar como contenção em situações de crescimento, o que tem sido aplicado não é esse lema sábio e prudente de “poupar nos tempos bons para utilizar nos tempos difíceis”. O que tem sido aplicado, com a colaboração, com o quase entusiasmo ideológico do governo PSD/CDS, é uma leitura parcial deste enquadramento europeu, que prejudica o crescimento económico e a criação de emprego. Nós não queremos ser um país incumpridor, queremos é que os instrumentos europeus sirvam a convergência e não a divergência. E temos de saber, técnica e politicamente, mostrar que é possível uma aplicação inteligente dos tratados e dos pactos.

Temos, primeiro, de saber criar compromissos internos tão alargados quanto possível que nos deem mais força na negociação europeia. E, depois, temos de ser capazes de estabelecer alianças, de geometria variável, com outros Estados Membros, que reforcem as nossas posições, percebendo que outros países, devido à sua situação económica e social, têm interesses convergentes com os nossos. O que não podemos é fugir dessas convergências no concerto europeu, como tem feito o atual governo.

É preciso negociar, negociar sempre, procurar sempre aliados, manter as alianças, argumentar, persuadir. Quem já teve experiência de negociação europeia sabe que nada está nunca ganho à partida e nada está nunca perdido à partida, mas é preciso saber o que se quer e trabalhar constantemente em todos os planos para o alcançar. 
 
Mas para isto ser possível, não podemos enganar-nos no diagnóstico das nossas debilidades estruturais, para não as agravar ainda mais com estratégias de desvalorização interna. A economia portuguesa não ganhará competitividade reduzindo o preço dos bens e serviços que já produz, mas produzindo bens e serviços diferentes, mais intensivos em conhecimento. Portugal não pode desperdiçar os seus recursos, nomeadamente os fundos estruturais, a atolar-se em visões de curto prazo.

Por isso precisamos desta Agenda para a próxima Década. Uma agenda que mobilize os Portugueses em torno de objetivos nacionais comuns, de longo prazo, sustentáveis. Para que não estejamos sempre a desfazer o que de bom conseguimos fazer, apenas por causa da pequena guerrilha política imediatista.

Portugal precisa, agora, de uma viragem. Vista a forma ideológica e insensível como o atual governo lidou com a crise – mudar de políticas, de métodos, de protagonistas, é uma urgência. Agora, não basta a alternância, Portugal exige uma alternativa. Cair agora numa espécie de rotativismo, apenas criaria mais desilusão, mais descrença, mais desconfiança. E agravaria a crise da representação.

Por isso faz falta um PS forte. Só um PS forte será capaz de Mobilizar Portugal.

Sejamos claros: uma maioria absoluta no Parlamento dará ao PS as melhores condições para Mobilizar Portugal. Mas nem uma maioria absoluta deverá desviar o PS da procura dos compromissos alargados que deem mais amplitude e mais profundidade à mudança necessária.

Seria desejável que outras forças políticas, que não estejam comprometidas com a atual governação, quisessem contribuir para a nova maioria política, tal como contamos que os parceiros sociais se empenhem na construção de uma nova Agenda.

O tão abusado conceito de “arco da governação” não pode servir para justificar a exclusão sistemática de certos partidos da responsabilidade de governar. É na sua pluralidade que o Parlamento representa o país e não há qualquer razão para o PS ignorar as aspirações dos eleitores representados pelos partidos que no parlamento se sentam à sua esquerda. 

Mas a esquerda que no Parlamento se senta à esquerda do PS não pode voltar a enganar-se de adversário, porque no passado cometeu erros de avaliação que ajudaram a alçar ao poder o atual governo.

Também apelamos a essa esquerda para que reconheça que a contestação e a oposição, por si sós, não resolvem os problemas dos portugueses. É preciso aceitar o desafio de construir uma alternativa.

O país não precisa de consensos artificiais e opacos. O que o país precisa é de compromissos transparentes, onde as diferenças são assumidas e servem de cimento para convergências mais sólidas e mais relevantes, sabendo que os compromissos podem tomar formas diversas.

Quem terá coragem de aceitar o desafio?

Nós estamos aqui para isso.

A construir um programa de recuperação da economia e do emprego, para a próxima legislatura.
A construir uma visão estratégica para o país para a próxima década.

Inspirados pelo próximo primeiro-ministro de Portugal, António Costa, respondendo “presente” ao desafio que ele nos lançou para Mobilizar Portugal.

Viva o PS!

Viva Portugal!