7.2.13

é para isto que servem os filósofos?


Eu habituei-me a julgar que os filósofos têm uma certa obrigação de contribuir para a cidade. Contribuir com alguma reflexão que fuja a duas doenças do pensamento sobre o que é público: contra a doença da tecnicidade (em vez do "sabemos muito bem como fazer isto ou aquilo, mas não sabemos para que serve nem isto nem aquilo", ajudar a pensar sobre o que queremos e sobre se é bom querermos isso ou não); contra a doença do "ataque à pessoa" (em vez de andarmos por aí a "matar inimigos" a crédito de guerras eventuais, preferirmos debater opções e caminhos para concretizar opções). Claro que há filósofos que, como acontece noutras profissões, estão tão entretidos com os seus problemas técnicos que nada querem dizer em público sobre o que é público. Posso não concordar, mas posso, até certo ponto, respeitar. O que já não posso respeitar é que filósofos encartados, tendo vindo a lume falar à cidade, o façam contribuindo para aqueleas doenças que antes mencionei.
Tudo isto a propósito de um filósofos, de seu nome João Cardoso Rosas, que se interessa filosoficamente por Ética e Filosofia Política - e que no entanto escreve e publica um artigo como este, ontem no Diário Económico. Um senhor filósofo, que escreve um artigo de puro ataque pessoal a um determinado político, assina e por baixo da assinatura apõe "Professor Universitário", não se envergonha de um texto de puro ódio? As suas responsabilidades intelectuais não o envergonham de um texto fantasioso, sectário, de facção - um texto que, se serve algum propósito, só pode ser o de mostrar que um intelectual é capaz de descer tão baixo como qualquer outra pessoa?
Como cidadão, preocupa-me que haja intelectuais deste calibre que se prestem a estes serviços, em nome de uma concepção de democracia que quer fazer dos partidos máquinas monolíticas, seitas onde só se pode ulular o mantra do chefe, capelinhas de obediência acéfala. Como devo comparar o conteúdo deste artigo com as declarações dos dirigentes nacionais do PS que fazem fila à porta do Rato a acusar de deslealdade quem quer que, sonham eles, tenha uma concepção não monárquica do PS? Só posso comparar deste modo: acho infinitamente mais triste que um filósofo, cujos interesses declarados são a ética e a filosofia política, empenhe a sua pena num texto desta mesquinhez. Mas isso sou eu que tenho uma concepção certamente ultrapassada acerca do papel do filósofo na cidade.