5.5.12

colunas estreitas.


Henrique Monteiro reitera em mais um sábado (este sábado) o seu recorrente cinismo na coluna da última página do caderno principal do Expresso. A propósito do Pingo Doce, claro. É um daqueles textos que dá vontade de esmiuçar linha a linha, para demonstrar quase matematicamente a vacuidade da coisa (e é nessa vacuidade que se entranha o tal cinismo, pois lamber os dedos besuntados com chocolate enquanto os vampiros enterram o dente no pescoço da vítima - não é apenas lamber os dedos besuntados com chocolate, é ser cúmplice dos vampiros).
Detenho-me aqui, contudo, apenas numa passagem dessa coluna. Escreve HM, no seu ponto 4: "A esquerda e os sindicatos tiveram como primeira reação queixar-se de dumping. Algo de que deveria ser o engº Belmiro e outros proprietários de supermercados a queixar-se."(*)
Quer dizer: a concorrência é uma coisa que só interessa aos tendeiros, mais ninguém se deve preocupar com isso. Se algum lojista se sentiu prejudicado no seu negócio, que se queixe; caso contrário, que nos importa a nós isso? HM parece julgar que a protecção da concorrência é um assunto de capelinha entre oficiais do mesmo ofício. Pois, não, HM: a protecção da concorrência é para nos proteger a todos, aos que compramos, embora os interesses dos próprios concorrentes sejam instrumentais na protecção dos interesses dos clientes.
Aplicar o raciocínio de HM à política seria algo como defender que só os partidos políticos podem queixar-se se houver fraude eleitoral, porque eles é que são os interessados (os "concorrentes" nesse caso). Mas, não, a fraude eleitoral prejudica um bem que é de todos, que é o sistema de eleições livres.
Eu até acho, como já escrevi, que a questão do dumping não é a questão mais interessante nas comemorações que o Pingo Doce fez do 1º de Maio. Daí a fazer das questões de concorrência um assunto que "a esquerda e os sindicatos" deveriam colocar em segundo plano, vai um passo. Parece que HM aborrece que "a esquerda e os sindicatos" defendam mais a "liberdade capitalista" do que a própria direita e certo patronato. Sinais dos tempos.

(*) Eu não escrevo com a mesma ortografia que HM, mas isso pode ser defeito meu e não dele.