17.3.11

não sei bem se isto é uma coisa simples que parece complicada ou, antes, uma coisa complicada que parece simples


Deve ser complicado ser Presidente da República. Não sei até que ponto irá a dureza da tarefa, porque nunca fui, nem conto vir a ser, tal coisa. Mas de certo seria pesado demais para as minhas pobres costas. Assim sendo, não devo ter a arrogância de pretender que faria melhor do que este ou aquele.
Contudo, não resisto a pensar que qualquer pessoa simples saberia que certas coisas um PR não faz. Por exemplo, acho que é meridianamente claro que um presidente de todos os portugueses não se deve misturar na luta partidária, não deve dizer coisas que toda a gente interpreta como apoio ou condenação genérica de certas forças políticas em presença. Penso isso, não por achar que um presidente deva ser um eunuco, que não deve, mas por me parecer que um presidente deve ver além dos diferentes interesses dos actores político-partidários e sociais - e deve usar essa visão para captar, melhor do que os demais poderes, como potenciar o que é comum. Sublinhar as linhas de convergência.
E, levando um pouco mais longe o meu atrevimento, também digo que, em certas circunstâncias, um presidente tem a obrigação de não se encolher e deve impor o que entende serem condições institucionais mínimas para o país enfrentar os seus desafios mais prementes. Por exemplo, face ao actual estado do país e ao olhares que os lobos e as ovelhas deste mundo lançam para nós neste momento, eu acharia normal que o presidente dissesse aos partidos portugueses:
meninas e meninos, está visto que um governo minoritário não tem condições para criar confiança nos mercados e nos parceiros europeus, portanto arranjem um governo maioritário. E depressinha que se faz tarde.
Poderia eu, até, pessoalmente, não gostar da solução que daí saísse; provavelmente eu preferiria outra maioria que não aquela que acabaria por se formar. Certamente que eu continuaria a achar, como já acho, que esta incapacidade portuguesa para o compromisso e para a negociação é uma tara do subdesenvolvimento da democracia portuguesa. Quer dizer, eu até poderia detestar o significado profundo de tal gesto do presidente. Mas, pelo menos, teria de pensar: tem tomates este PR. Vai directo ao nó górdio, sem conceder especial protecção nem aos seus amigos nem aos seus críticos. É capaz de atacar um bloqueio institucional sem cair nas maluqueiras dos governos de iniciativa presidencial à la Eanes do século passado. E, acabado de ser reeleito, deve ter força para obrigar a uma solução dessas, sem as tentações caudillistas que deixaram de se usar com a "normalização" da democracia.

Estou a ver a coisa simples demais? Ou complicado é ter em Belém um presidente que pensa demasiado em proteger os seus amigos políticos e no protagonismo alargado que pode alcançar se o país entrar em erupção?