16.11.10

Uma investigação sobre a alma


Por que é que conseguem brincar com o vosso cão mas não lhe conseguem contar uma história?

Patrícia Gouveia lançou hoje o livro Artes e Jogos Digitais. Tendo já dado uma vista de olhos por algumas coisas que ela escreveu, conhecendo o seu blogue (mouseland), tendo-a entrevistado aqui para esta casa (jogos de realidade alternativa), tinha elevadas expectativas para o livro. O que a Autora disse na apresentação, mais o que disse na mesma ocasião Henrique Garcia Pereira (Professor Catedrático no Técnico e outras coisas mais), agravaram o meu estado de curiosidade e interesse.
O livro anda pelos jogos digitais. Pronto, pode parecer coisa simples. Sim, há a arte que não é digital. Há as comparações com o cinema. Há a história do meio que é mensagem, a lembrar McLuhan. Há o natural e o artificial e meterem-se os pés pelas mãos, mais o real e o virtual cujas fronteiras estão mais complicadas de policiar do que a fronteira terrestre entre o Afeganistão e o Paquistão. Tudo isso, pensado num horizonte filosófico, mas com os pés bem assentes na terra das práticas tecnológicas, já seria prato e sobremesa para uma bela refeição: e a Patrícia a dizer que se eu jogo jogos de computador nunca jogo o mesmo jogo quando vou outra vez ao jogo, isto é a pensadora a actualizar as palavras do Heráclito que tinha um problema com os rios, de tal modo que nunca se banhava no mesmo. Tudo isto já seria grande promessa. Há que ler, ainda não li.
Mas vou ler à espera de ter aqui uma investigação sobre a alma. Sim. É que se houve quem procurasse a alma no corpo, quem procurasse a alma no cérebro; se ainda há quem procure a mente com bisturi, ou alegue que não há mente por ela não se encontrar com o bisturi – quando a Patrícia Gouveia fala na simulação lúdica e na arte da jogabilidade como “narração sensorial” – alto lá, que há umas campainhas que começam a tocar por todo o lado no campo de minas dos meus interesses. Interesse pelo corpo sentido que sente, pelo corpo no mundo a fazer mundo, a ser mundo com a carne. Sentir, pois, primordial. Sim, é por aí que anda a alma, mesmo que ela não exista: nesse mundo por onde nos espalhamos por todos os meios.
Aquela pergunta lá em cima, que mete cão e narrativa, é uma maneira engenhosa de a Autora dizer que resume o primeiro capítulo. Ou que lança as questões que o primeiro capítulo abre. Pode começar por esse enigma e depois… continuar, claro. Vamos a isso.
A sério: livro para pensar. E apontado ao coração deste tempo que nos muda.